Militares e setores ortodoxos do chavismo começam a mostrar descontentamento com medidas ‘liberalizantes’ que o presidente é obrigado a tomar diante da crise
Após a demissão do ministro do Planejamento, Jorge Giordani, as divergências dentro do chavismo a partir da morte de seu criador, esperadas mas encobertas pelo presidente Nicolás Maduro, começaram a se tornar públicas. Mestre ideológico de Chávez, Giordani ocupou postos estratégicos em seu governo e foi o artífice do controle cambial e das políticas estatizantes. O veterano político caiu atirando em Maduro, a quem acusou, em carta aberta, de não exercer liderança, de gerar uma sensação de “vazio de poder” e de ceder às pressões do setor privado.
Maduro respondeu duramente a Giordani e a outros chavistas que o apoiaram, com destaque para o ex-ministro da Educação Héctor Navarro, afastado da direção do partido do governo (PSUV). Os críticos reagem às tentativas de Maduro de flexibilizar a economia venezuelana, em meio a uma inflação anual de 60%, escassez de produtos básicos e queda significativa do consumo de alimentos (a inflação dos alimentos chegou a 76% em um ano, até maio). Para o secretário-geral da Ação Democrática (AD, na oposição), Henry Ramos Allup, “as divergências podem crescer caso Maduro tome medidas que divirjam do modelo original de Chávez”, como o férreo controle de câmbio vigente desde 2003. Ineficaz, diga-se, diante da crise cambial.
Segundo o jornal “Miami Herald”, começam a surgir críticas de militares, antes próximos a Chávez, em relação à política econômica, com alguns pedindo a renúncia de Maduro. O caudilho tinha controle absoluto sobre o chavismo, tanto civil como militar, e suas decisões, em política econômica e social, não eram contestadas. Mas Maduro, um ex-motorista de ônibus e sindicalista, não tem o mesmo poder.
Os problemas aumentam numa nação à deriva. Na semana passada, um enorme apagão afetou grande parte do país, complicando o transporte de milhões de pessoas, cortando as comunicações e interrompendo um discurso de Maduro em cadeia nacional de TV. Por falta de recursos para investir em infraestrutura, pela administração caótica e populista da economia, embora seja um país rico em petróleo, a Venezuela tem sofrido há anos frequentes apagões. Uma conjuntura climática desfavorável e, segundo críticas, a falta de planejamento, têm causado falta de água em Caracas, metrópole de 6 milhões de habitantes, do tamanho do Rio.
É o dilema de Maduro: aprofundar ainda mais a política chavista, para acalmar os militares e os setores mais duros do movimento; ou iniciar reformas para estimular a produção, abrir a economia e atrair investidores nacionais e estrangeiros? Sem a liderança e o carisma de Chávez, Maduro tende a ser engolido pela crise, e o futuro se torna imprevisível.
Muitos não querem esperar para ver. Segundo estudo da Universidade Católica Andrés Bello, entre 2000 e 2010, cerca de meio milhão de venezuelanos emigraram.
06 de julho de 2014
Editorial O Globo
Após a demissão do ministro do Planejamento, Jorge Giordani, as divergências dentro do chavismo a partir da morte de seu criador, esperadas mas encobertas pelo presidente Nicolás Maduro, começaram a se tornar públicas. Mestre ideológico de Chávez, Giordani ocupou postos estratégicos em seu governo e foi o artífice do controle cambial e das políticas estatizantes. O veterano político caiu atirando em Maduro, a quem acusou, em carta aberta, de não exercer liderança, de gerar uma sensação de “vazio de poder” e de ceder às pressões do setor privado.
Maduro respondeu duramente a Giordani e a outros chavistas que o apoiaram, com destaque para o ex-ministro da Educação Héctor Navarro, afastado da direção do partido do governo (PSUV). Os críticos reagem às tentativas de Maduro de flexibilizar a economia venezuelana, em meio a uma inflação anual de 60%, escassez de produtos básicos e queda significativa do consumo de alimentos (a inflação dos alimentos chegou a 76% em um ano, até maio). Para o secretário-geral da Ação Democrática (AD, na oposição), Henry Ramos Allup, “as divergências podem crescer caso Maduro tome medidas que divirjam do modelo original de Chávez”, como o férreo controle de câmbio vigente desde 2003. Ineficaz, diga-se, diante da crise cambial.
Segundo o jornal “Miami Herald”, começam a surgir críticas de militares, antes próximos a Chávez, em relação à política econômica, com alguns pedindo a renúncia de Maduro. O caudilho tinha controle absoluto sobre o chavismo, tanto civil como militar, e suas decisões, em política econômica e social, não eram contestadas. Mas Maduro, um ex-motorista de ônibus e sindicalista, não tem o mesmo poder.
Os problemas aumentam numa nação à deriva. Na semana passada, um enorme apagão afetou grande parte do país, complicando o transporte de milhões de pessoas, cortando as comunicações e interrompendo um discurso de Maduro em cadeia nacional de TV. Por falta de recursos para investir em infraestrutura, pela administração caótica e populista da economia, embora seja um país rico em petróleo, a Venezuela tem sofrido há anos frequentes apagões. Uma conjuntura climática desfavorável e, segundo críticas, a falta de planejamento, têm causado falta de água em Caracas, metrópole de 6 milhões de habitantes, do tamanho do Rio.
É o dilema de Maduro: aprofundar ainda mais a política chavista, para acalmar os militares e os setores mais duros do movimento; ou iniciar reformas para estimular a produção, abrir a economia e atrair investidores nacionais e estrangeiros? Sem a liderança e o carisma de Chávez, Maduro tende a ser engolido pela crise, e o futuro se torna imprevisível.
Muitos não querem esperar para ver. Segundo estudo da Universidade Católica Andrés Bello, entre 2000 e 2010, cerca de meio milhão de venezuelanos emigraram.
06 de julho de 2014
Editorial O Globo
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