A Lei anticorrupção brasileira - que dá efetividade interna aos Tratados firmados pelo Brasil no plano da OCDE, da Nações Unidas e da OEA -comemorou no dia 29 de janeiro, uma ano de vigência, ou melhor, da virgingência.
Tem, assim, a nossa lamentável República além da Viúva, assaltada diariamente, uma donzela, que foi prometida para a comunidade internacional como o nosso compromisso de integração com a luta mundial contra a corrupção.
Ocorre que a Presidente da República, em seu discurso oficial de Diplomação no TSE, em 19 de dezembro, negou a vigência do Estado de Direito, declarando que não irá aplicar a Lei anticorrupção às empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, sob o pretexto de manutenção do nível de emprego (?).
Reafirmou essa vontade prevaricadora expressamente na primeira reunião ministerial, de 27 de janeiro corrente.
Além de cometer explicitamente crime de responsabilidade ao assim agir contra a aplicação de Lei Federal, (art. 85, VII da Constituição), a Presidente demonstra mais uma vez o desastre que é o seu governo, agora acrescentado pela total ignorância dos efeitos benéficos da aplicação da Lei Anticorrupção no caso da Petrobras e das empreiteiras e fornecedoras nacionais e multinacionais que, em concurso criminoso, levaram à destruição de valor da estatal e agora, gradativamente, delas próprias.
Tivesse a Presidência da República e a Controladoria Geral da União o mínimo discernimento sobre a aplicação extraterritorial das leis anticorrupção existentes no planeta não teriam negado a aplicação da nossa Lei à respeito.
Ocorre que ao não processar a Petrobras – agente ativo de todo o esquema de corrupção que envolve no mínimo 80 bilhões de dólares – e as demais 23 empresas envolvidas, está o nosso governo (?) entregando todas elas à jurisdição dos demais países signatários, notadamente à drástica aplicação da Foreign Corrupt Practices Act americano que, por sinal,já iniciou as investigações através do Departamento de Justiça sobre a nossa antiga Jóia da Coroa.
O caso é o seguinte: o Brasil ao firmar os acordos internacionais se comprometeu a processar administrativamente todas as empresas – pessoas jurídicas – nacionais e multinacionais- envolvidas em corrupção pública. A propósito, quatro multinacionais integram os cartéis do seleto Clube.
Ao instaurar o processo administrativo conforme a Lei Anticorrupção o Governo brasileiro estará colaborando com a apuração das condutas das multinacionais infratores nos países onde tem suas sedes e nos outros países onde também corrompem.
Mas o mais importante é que a aplicação imediata da Lei Anticorrupção atende ao fundamental princípio das leis internacionais de que não pode uma empresa corrupta brasileira ser punida duas vezes pelos mesmos fatos, ou seja: não pode ser condenada no Brasil e, ao mesmo tempo, em outros países pelos atos de corrupção aqui praticados, desde que tenham sido objeto do devido processo penal-administrativo estabelecido na Lei Anticorrupção.
Por isso a Presidente da República, ao negar a aplicação de nossa Lei, sob pretexto de salvar empregos (?) está abrindo as portas para que as leis e as sanções dos outros países se abatam pesadamente sobre elas.
Nega-se o governo brasileiro a proteger a Petrobras e as queridas e amadas empreiteiras da sanha, sobretudo, do Governo norte-americano que através do seu Departamento de Justiça, SEC, etc., vai atrair para sua jurisdição todas aquelas, mesmo que não tenham corruptamente operado nos Estado Únicos.
As multas que serão aplicadas à Petrobras deverão chegar provavelmente a 50 bilhões de dólares, tais as implicações da nossa estatal com o governo, os credores e os investidores daquele país.
Quem vai embolsar as multas pela corrupção da Petrobras e de suas comparsas será o governo norte-americano, não o brasileiro. Encheremos mais ainda os cofres já repletos daquele grande país, face à nossa incapacidade de entender o que se passa no mundo. Somos um país absolutamente isolado da comunidade internacional até em matéria de corrupção.
Assim, a Presidente da República, ao invés de mandar autuar administrativamente todas as implicadas e assim, fazer com cada uma delas um acordo de leniência, transforma as ditas cujas em mortas-vivas, em fantasmas desacreditados, sujeitas a todas as sanções jurídicas e de mercado de internacionais.
A reputação de uma empresa é um ativo imaterial inestimável. Sem credibilidade elas afundam.
Com esse quadro, a Petrobras, as empreiteiras e os fornecedoras do esquema estão sangrando.
Esse processo de sangramento vai continuar, a ponto de serem destruídos milhares de empregos e o próprio valor dessas companhias, que vão acabar sendo inabilitadas pelo Banco Mundial e pelos países subscritores dos tratados.
Isto por quê? Porque não foram devidamente processadas aqui e, por isso, firmados os acordos de leniência que permitirão à Petrobras e às suas comparsas de purgarem as suas faltas no plano nacional e internacional, mediante o pagamento de pesadas multas e da submissão ao regime de conformidade (compliance) sob a vigilância direta e permanente das auditorias independentes.
Resultado. A “vontade” da Presidente se impõe à lei, mal sabendo ela que esta cometendo, com isso, crime de responsabilidade.
As empresas implicadas já estão sangrando e vão sangrar muito mais. Por outro lado, o próspero mercado internacional da aquisição de empresas corruptas, liderado pelos norte-americanos já cogitam de comprar ativos das empreiteiras brasileiras.
Será que um dia as empresas vão se convencer que a corrupção tornou-se um péssimo negócio no mundo juridicamente globalizado?
A Lei Anticorrupção Aqui e Agora
"Extraordinário é o momento histórico que estamos vivendo com o implacável desenrolar da Operação Lava Jato, que tem exibido a fratura exposta da corrupção no seio do poder público em concurso com empreiteiras e fornecedoras, por meio da mãe de todas as virtudes - a Petrobrás. Essas medidas muito se assemelham às da Operação Mãos Limpas, realizada na Itália nos anos 90 do século passado, que dizimou, mediante o instrumento da delação premiada, núcleos seculares da máfia incrustados no governo, no Legislativo e no Judiciário, a ponto do seu primeiro-ministro, muito prestigiado na Europa, Giulio Andreotti - até ele - ter-se envolvido por décadas com a Cosa Nostra.
Entre nós, essa torrente de "malfeitos" que somam, mediante superfaturamento, dezenas de bilhões de reais provocam manobras diversionistas do governo, das empreiteiras implicadas e da própria Petrobrás, tentando, todas elas, evitar a aplicação da Lei Anticorrupção, que entrou em vigor em fins de janeiro deste ano.
A propósito, as empreiteiras estão dizendo que a Lei Anticorrupção não está em vigor, por faltar a sua regulamentação. Trata-se de uma falácia, pois o seu artigo 31 determina:
"Esta Lei entrara em vigor 180 (cento e oitenta) dias após a data de sua publicação" - que se deu em 1.º de agosto de 2013. Portanto, está vigendo desde 1.º de fevereiro do corrente ano de 2014.
A regulamentação restringe-se a um simples parágrafo do artigo 7.º, que trata de critérios a serem estabelecidos pela Controladoria-Geral da União (CGU) que poderão ser adotadas pelas empresas que quiserem instituir o regime de compliance, que não é obrigatório e apenas serve para, eventualmente, atenuar as penas advindas do processo penal-administrativo.
Outro argumento é que a Lei Anticorrupção não seria aplicável à Petrobrás e às empreiteiras envolvidas, pois a sua vigência é posterior aos fatos levantados na Operação Lava Jato.
Nada mais enganoso. Os contratos firmados com a estatal estão em plena vigência e execução e são eles o instrumento utilizado para a prática do delito de corrupção, ao longo do tempo, na medida em que não foram, em nenhum momento, cancelados ou mesmo suspensos, apesar das recomendações veementes do Tribunal de Contas da União (TCU).
Da parte do governo temos declaração do vice-presidente da República, do presidente do Tribunal de Contas e do líder parlamentar do PT, que em seminário recente, afirmaram não poderem a Petrobrás, as empreiteiras e as fornecedoras ser processadas pela Lei Anticorrupção porque se não o País para (sic).
Tais declarações desses ilustres próceres ensejam desde logo crime de responsabilidade, pois incitam a prevaricação dos agentes públicos encarregados de instaurar os processos administrativos contra as empresas superfaturadoras e a estatal, sob a alegação que são elas grandes demais para ser imputadas. Pasmem!
Não obstante tais "recomendações", devem, imediatamente, a CGU e o TCU requisitar cópia integral dos autos ao juízo federal do Paraná - como já o fez e obteve a própria Petrobrás - para, logo em seguida, se instaurarem os processos penal-administrativos contra as pessoas jurídicas implicadas.
Nesses processos administrativos, as empreiteiras e as fornecedoras vão se apresentar como vítimas... de si mesmas. Isso porque o monstruoso produto dos superfaturamentos resultantes dos contratos e aditivos fraudados são por elas embolsados, restando para os parlamentares, partidos, membros do Executivo, diretores da estatal e intermediários uma parte desse mega-assalto aos cofres públicos, via estatal.
Anote-se que as propinas pagas aos múltiplos beneficiários do crime saíram diretamente dos cofres das empreiteiras e das fornecedoras.
Cabe à CGU, na pessoa de seu ministro-chefe, instaurar os processos administrativos contra as empreiteiras e as fornecedoras, que, de acordo com a Lei Anticorrupção, respondem autonomamente pelos delitos corruptivos, independentemente das pessoas físicas envolvidas na operação criminosa.
São elas que usufruem a quase totalidade desse mesmo superfaturamento e pagam, de seu caixa, as propinas. E o crime de corrupção caracteriza-se pelos contratos fraudados em pleno vigor e execução, estando, por isso, plenamente abrangidos pela Lei Anticorrupção.
Quanto à Petrobrás, compete a abertura do processo penal-administrativo ao TCU, por sua Secretaria de Controle Externo de Estatais (SCEE), à qual cabem as representações necessárias à imputação dos delitos de corrupção praticados pelas empresas controladas pelo governo.
São, portanto, esses dois órgãos da administração federal que deverão, agora, processar as empresas corruptoras e a Petrobrás. Esta última é que fez e faz a triangulação do sistema de corrupção: superfatura os contratos, paga esse superfaturamento às empreiteiras e fornecedoras e estas repassam uma parte do produto do butim aos políticos, aos partidos, aos intermediários e aos diretores da outrora respeitável estatal.
Se a CGU e a SCEE do Tribunal de Contas fizerem corpo mole e não ingressarem - como sugerem o vice-presidente, o presidente do próprio TCU e o líder do PT - com as ações penal-administrativas contra a Petrobrás e as pessoas jurídicas empreiteiras e fornecedoras, serão processados criminal, administrativa e civilmente na pessoa de seus titulares - o ministro-chefe da CGU e o presidente do TCU, conforme estabelece a própria Lei Anticorrupção.
Nessa hipótese de prevaricação instigada, caberá - sempre conforme a Lei Anticorrupção - ao Ministério Público, por delegação legal, assumir o processo penal-administrativo contra a estatal e a grande "famiglia", simpaticamente chamada de "clube" por seus "capi-regimes".
06 de fevereiro de 2015