07 de abril de 2015
Assessor especial da Presidência da República desde o governo Lula e fundador do PT, Marco Aurélio Garcia afirma que, no lugar do tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, já teria deixado o cargo. Chamado de professor pelos colegas de partido, ele lamenta que o PT não tenha construído uma narrativa em defesa de seu legado. Na sua opinião, a sigla vive um cerco e cometeu erros estratégicos após o escândalo da Petrobras, deflagrado pela Operação Lava Jato. “Não consigo entender como deixamos que se jogue em cima de nós o episódio da Petrobras”, afirma nesta entrevista.
JOÃO VACCARI
Acho que ele deve se afastar porque é bom para ele e bom para o PT. É uma decisão pessoal. Se fosse eu, já teria pedido licença. Naquele episódio da TAM [em 2007, quando foi filmado fazendo um gesto com as mãos em que parecia comemorar uma reportagem sobre um acidente aéreo], que acho bastante menos grave do ponto de vista de apuração, a primeira coisa que fiz foi entregar o cargo [de assessor ao ex-presidente Lula]. A licença facilitaria a vida dele e do PT. Se dissesse que ele não cria problema, estaria mentindo. Mas se [Vaccari] fosse o grande problema que o PT está enfrentando, que maravilha.
DIFICULDADES
O fracasso da presidente Dilma é um fracasso de todos nós. De Lula, meu, do PT e de uma parcela importante da sociedade. Voltaria a velha elite. Muito ruim. Estamos vivendo uma situação muito particular. Há uma interdependência [entre a deterioração da imagem do governo e a do PT] muito forte. Temos que sair juntos dessa situação. Estamos numa situação econômica difícil. Não trágica. Mas que pode ter implicações do ponto de vista de desemprego e renda, que temos que reverter no momento atual. E temos um problema político que, não resolvido, alimenta a crise econômica.
ÉTICA E CORRUPÇÃO
Uma coisa é dizer que pessoas no PT se envolveram em malfeitos. Outra é tentar qualificar o PT como uma organização criminosa. Não estou de acordo. Não me considero criminoso. Não tenho nada a ver com isso. Essa é uma das razões pelas quais temos que tomar medidas concretas, como a recusa do financiamento empresarial. Temos que chamar todos os partidos a fazer a mesma coisa. Aí vamos ver quem é quem. Não é possível que o PT, com 1,5 milhão de filiados, não seja capaz de se financiar. Pago R$ 1 mil por mês ao partido.
HOSTILIDADE
No domingo, uma pessoa passou de carro e me insultou. Num restaurante um senhor idoso veio fazer críticas. Mas este foi muito educado, tive a oportunidade de conversar com ele por dez minutos. Fico chateado. É uma consequência de um conservadorismo muito agressivo de um setor. Nunca insultei ninguém. Nunca me vali de uma situação que pudesse ser favorável para fazer igual ao que está acontecendo.
CORRUPÇÃO
Não consigo entender como deixamos que se jogue em cima de nós o episódio da Petrobras. Outros episódios tão graves não têm a mesma incidência ou não recaem sobre aquelas pessoas que têm a autoria. O que é toda a questão do Metrô de São Paulo? O tema da corrupção é fácil de ser difundido, sobretudo quando a economia não está bem.
Não há transigência com a corrupção. Mas ela é apropriada politicamente por setores de oposição e tem um trânsito fácil na classe média. É o pega-ladrão. Em 1954 o Brasil vivia uma dificuldade econômica mas estava passando por um momento de mudanças importantes.
O tema da corrupção pegou de uma forma violentíssima. O mar de lama surge naquela época. Depois o Aécio restabeleceu. Fiquei me perguntando o que o doutor Tancredo estaria pensando.
FRENTE AMPLA
A frente ampla [a proposta de se apresentar na eleição por meio de uma coalizão de partidos, ONGs e sindicatos] não seria um biombo por trás do qual o PT se ocultaria. O PT tem suficiente peso, mesmo a despeito dos problemas, para mostrar sua cara. Não é meia dúzia de pessoas que expressam de forma brutal seu antipetismo que vai intimidar o PT. A frente se impõe pensando no que se fez em outubro [de 2014], quando setores amplos se mobilizaram de uma forma muito intensa quando viram o risco de perdermos a eleição e reversão de programas. Houve uma sintonia muito grande entre esse movimento e a candidata [Dilma].
REGULAÇÃO DA MÍDIA
Deveríamos fazer uma regulação de natureza econômica. Fico estarrecido quando se procura apresentar isso como um processo de censura. Propostas estão sendo implementadas nos EUA, no Reino Unido. Agora, acho extraordinário que um partido que obteve dezenas de milhões de votos não tenha sido capaz de instrumentalizar um meio de comunicação consistente. Criar. Não digo comprar, embora existam alguns à venda. Mas podia ter jornal, revista, seu canal de TV, rádio. É preocupante. Porque queremos uma sociedade plural
07 de abril de 2015
Catia Seabra
Folha