Chefona do PSOL confessa: dinheiro de sindicato foi ilegalmente usado para financiar campanhas eleitorais e o próprio partido: os dois têm de ser cassados
O preâmbulo, com os Varões de Plutarco
É claro que, no ambiente propriamente institucional, o PSOL não tem muita importância, embora conte com três figuras públicas que não hesitariam em pedir a própria canonização — materialista, é claro! São figuras muito apreciadas por setores da imprensa como expoentes da ética, da coerência e da moral inquebrantável. Refiro-me ao deputado federal Chico Alencar (RJ), ao senador Randolfe Rodrigues (AP) e ao deputado estadual Marcelo Freixo (RJ), mais apreciado pelos socialistas do circuito Leblon-Copacabana-Ipanema do que biscoito na praia. “Biscoito”, leitores do Rio, é como a gente chama “polvilho” aqui em São Paulo… Freixo passou a ser o queridinho do Chico Buarque, do Caetano Veloso e do Wagner Moura, três profundos conhecedores do socialismo com liberdade.
O trio forma, assim, o “magister dixit” da sabedoria política. O partido, reitero, é irrelevante na esfera institucional, mas sabe, como é próprio das esquerdas, velhas ou novas, multiplicar a sua força, aparelhando sindicatos de trabalhadores, representações estudantis e movimentos populares. Parte da bagunça que se tenta eternizar no Rio é obra do PSOL.
O partido promoveu, por exemplo, a ocupação da Câmara de Vereadores para impedir o funcionamento da CPI dos Transportes.
É que o PSOL acha que quase todos, com o próprio PSOL entre as notáveis exceções, são corruptos. Em São Paulo, o partido está no comando do Sindicato dos Metroviários, volta e meia se metendo em ações de caráter puramente político, a muitas estações distantes dos interesses da categoria. Este é o preâmbulo em que apresento alguns Varões de Plutarco.
A narrativa
Muito bem! Por que essa longa introdução? Na terça passada, veio a público uma história meio enrolada. Dois ex-assessores da deputada estadual do Rio Janira Rocha foram presos, acusados de tentar extorquir R$ 1,5 milhão da parlamentar, que também presidia a Executiva Estadual do PSOL e liderava o partido na Assembleia Legislativa. Marcos Paulo Alves e Cristiano Ribeiro Valladão diziam ter gravações que comprovavam que Janira havia desviado recursos do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e Previdência Social (Sindisprevi), do qual foi diretora financeira, antes de se afastar para disputar uma vaga na Alerj, em 2010. O flagrante foi armado com a ajuda da secretária estadual de Defesa do Consumidor, Cidinha Campos. Janira, boa esquerdista, tomou as precauções na sua mímica de socialista incorruptível: já havia alertado o Ministério Púbico de que estava sendo vítima de extorsão e advertido o presidente da Alerj, Paulo Mello (PMDB).
Tudo muito bom, tudo muito bem… Ocorre que a gravação que integra o dossiê dos dois que tentaram extorquir esta expressão do “Socialismo com Liberdade” confirma que Janira, de fato, desviou dinheiro do Sindsprevi/Rio com fins eleitorais e para ajudar a criar o PSOL.
VEJAM QUE COISA ORIGINAL, NUNCA ANTES FEITA NESTE PAÍS: DINHEIRO DE SINDICATO, QUE DEVERIA ATENDER ÀS NECESSIDADES DOS ASSOCIADOS E DA BASE QUE REPRESENTA FOI USADO PARA PAGAR A CAMPANHA ELEITORAL DE POLÍTICOS DO PARTIDO E EM BENEFÍCIO DA PRÓPRIA LEGENDA.
Como vocês sabem, o PSOL, originalmente, é uma costela rebelde do PT, que se queria a autêntica esquerda. Em certo sentido, havemos de convir, nada é mais autenticamente esquerdista do que isso.
Prestem atenção a esta fala de Janira, que está na fita, que ela diz ter sido editada — as desculpas dos flagrados com a boca na botija não têm ideologia são sempre iguais:
“Nós sentamos lá nas finanças [do sindicato]. Pegamos o relatório do Conselho Fiscal e fomos atrás de todas as informações. O que foi e não foi. O que foi para a regional A, B C. Não tem nenhum companheiro de regional que tenha roubado nada, que tenha ficado com dinheiro. Tem companheiro que está levando pecha de coisas com o dinheiro. Mas ele nem ao menos chegou a ver o dinheiro. Ele assinou (que recebeu), mas o dinheiro foi usado para ações políticas que nós fizemos. Ou viajar de avião para o Acre é barato? Ou fazer eleição na Bahia é barato? Ou fundar o PSOL foi barato? Ou dar dinheiro para o movimento classista foi barato? Foi para ação política.”
Entenderam?
Ora, ora, ora… Enquanto escrevo este texto, o Jornal da Globo noticia que a Samsung lançou o smartwatch, um relógio que recebe mensagem de texto, toca música, tira fotografia, faz e recebe ligações telefônicas… Mas Janira? Ora, Janira está ali, ocupada em explicar que tomar dinheiro do sindicato para financiar campanha eleitoral e fundar o partido, afinal de contas, não é roubo. Os companheiros, como ela diz, não “roubam nada; foi tudo para ação política”.
Enquanto o Google lança os óculos inteligentes, Janira enxerga um futuro socialista, compreendem?, mas com muita liberdade! Uma lei esdrúxula, bem anterior ao smartwatch, do tempo em que os pterodáctilos cruzavam os céus, garante aos sindicatos a mamata do imposto obrigatório. Lula, então presidente, manobrou para que o primitivismo fosse mantido.
A deputada Janira, como vocês podem perceber, está até um tanto indignada com falsas acusações. Ela não só não vê mal nenhum na coisa toda como, tudo indica, considera muito natural. Mas fiquem calmos aí, que a confissão vai ficar ainda mais explícita. Janira está irritada porque membros do Conselho Fiscal do Sindicato estavam apurando se havia irregularidades. Então ela afirma:
“Se o Cristiano não intercepta o documento da Elba da Lagos (diretoria regional do Sindsprevi/Rio), eu não estava mais aqui. A minha cassação estava garantida da forma como ela respondeu. ‘Ah, eu fiz sim. Eu assinei que recebi o dinheiro, mas não vi o dinheiro. Assinei a pedido de uma assessora da deputada Janira. Esse dinheiro foi todo para a campanha da deputada Janira’. Qual é o problema? Todos sabem que foi dinheiro para minha campanha, para a campanha do Jefferson, do Pierre… O problema é ter um documento em papel timbrado de uma regional do sindicato de que o dinheiro foi para a minha campanha.”
Retomo
Não sei quem é o tal “Cristiano”, mas, dá para perceber, trata-se de alguém que parece ter dado um jeitinho para esconder a falcatrua. Sim, ela recebeu mesmo, diz de peito aberto, mas não só ela: também o Jefferson (?), o Pierre (?)… A deputada acha tudo normal, necessário, quiçá revolucionário. Ela só não quer saber de papel timbrado. Isso não!
Quando essa maravilha toda foi gravada? Segundo Janira, trata-se de uma assembleia do Sindsprevi de 2012, quando se discutia se as contas de sua gestão, entre 2007 e 2010, seriam ou não aprovadas. Como herança, esta gigante da administração do socialismo com liberdade deixou uma dívida com a Receita de R$ 8,3 milhões e empréstimos contraídos com pessoas físicas (!!!) de R$ 1,3 milhão.
Na fita, ela faz uma síntese espetacular da gestão da diretoria a que ela própria pertenceu:
“Nós fizemos merda! Contratamos uma porrada de gente para esse sindicato. O sindicato tem orçamento de R$ 1,5 milhão e temos R$ 800 mil de folha de pagamento. Pegamos dinheiro emprestado por fora das regras do mercado. Porque pegamos direto com agiota. O que temos que fazer? Tem roubo? Não tem roubo. Mas quem tá de fora não entende, não quer saber que é para ação política. Para eles, é merda, é golpe!”
Entendi. Está tudo muito claro. Janira também retinha uma parte do salários pagos a assessores, mas sempre, fica claro, para “fazer política”. Em outro trecho, este monumento moral alerta que é preciso fraudar a prestação de contas do Sindsprevi. Literalmente:
“A gente pode botar no relatório que o dinheiro foi para atividades políticas, mobilizadoras. Não pode dizer que foi para construção do PSOL. Para eleger deputado. Isso não pode, isso é crime”.
Cassar Janira e o PSOL
Janira está certíssima numa coisa: trata-se mesmo da confissão de uma penca de crimes. Ela recebeu doação ilegal, de maneira confessa e inequívoca, o que resulta, segundo a lei, em cassação de mandato. Mas não só ela. Também o registro do PSOL, se a lei for cumprida, tem de ser cassado. Eu sei que o PSOL quer o socialismo e que não reconhece os valores dessa sociedade burguesa e coisa e tal. Tudo bem! Só que está estruturado como um partido, não é?
Seus parlamentares ocupam lugar na institucionalidade, e a legenda recebe dinheiro do Fundo Partidário e dispõe de tempo na TV para os horários político e eleitoral gratuitos, o que também custa dinheiro público. Logo, é regido por leis, muito especialmente a 9.096, que trata dos partidos políticos. Assim, sou obrigado a lembrar a esses patriotas o que dispõe o Inciso IV do o Artigo 31 dessa lei:
Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:
(…)
IV – entidade de classe ou sindical.
Combine-se o que vai acima com o disposto no Inciso III do Artigo 28, e o PSOL tem de ter seu registro cassado:
Art. 28. O Tribunal Superior Eleitoral, após trânsito em julgado de decisão, determina o cancelamento do registro civil e do estatuto do partido contra o qual fique provado:
III – não ter prestado, nos termos desta Lei, as devidas contas à Justiça Eleitoral;
(…)
Mas quem age? O Parágrafo 2º do mesmo Artigo 28 define:
§ 2º O processo de cancelamento é iniciado pelo Tribunal à vista de denúncia de qualquer eleitor, de representante de partido, ou de representação do Procurador-Geral Eleitoral.
Assim, qualquer eleitor pode fazer a denúncia. Mas espero que a Procuradoria-Geral Eleitoral se encarregue de cumprir a sua tarefa. Afinal, a fala da deputada do PSOL, que veio a público, não deixa a menor dúvida.
Conhecida do blog
A deputada Janira é uma velha conhecida deste blog. Escrevi dois posts sobre esta senhora quando, em 2012, ela atuou como uma insufladora de greves na Polícia Militar. Ela foi flagrada, então, numa articulação de uma greve nacional de policiais militares.
Enquanto isso, a Samsung cria smartwatch, e o Google, os óculos inteligentes. Nós vamos lidando aqui com nossos pterodáctilos. Não pensem que o PT se financiou ou se financia de modo muito diferente. Observem que até a moralidade é a mesma: quando o roubo se dá em beneficio da causa, então não se trata de roubo, mas de luta. Na festa da CUT, o presidente da central recebeu os mensaleiros Delúbio Soares e José Dirceu e declarou que tinha muto orgulho de tê-los lá.
O PSOL é só um PT mixuruca, com complexo de superioridade moral e o apoio charmoso do Caetano, do Chico e do Capitão Nascimento. Vai, Janira! Pede pra sair!
05 de setembro de 2013