Não cabe mais na condução da Política a confusão generalizada entre o interesse público e o privado.
A Política (aqui com maiúscula) não é arte ou atividade endógena, ou seja, não se forma a partir da própria atividade da classe política (aqui com minúscula). A Política se forma pela reflexão, ocorrência ou repercussão do fato social que afeta determinada sociedade e que por esta é transformada. Já a política, formada endogenamente pela própria atividade dos políticos, resulta na estreiteza de meios, razões e objetivos. Pelos lados do Brasil há quem acredite que o factoide, o debate estreito e a “habilidade” em lidar com a classe política possa nos tirar do buraco e da lama em que estamos engalfinhados. Não é possível.
A crise vigente tem natureza profunda e complexa. A sua solução requererá mudanças muito reais e estruturais nos modos da sociedade brasileira, sobretudo nas suas camadas superiores. Não cabe mais na condução da Política a confusão generalizada entre o interesse público e o privado.
É dessa relação mal estabelecida que nasce a corrupção, o nepotismo, o favorecimento e a má utilização dos bens públicos, cujas repercussões são macroeconômicas e macrosociais. Daqui não podemos sair com soluções meramente ideológicas sugerindo que mudanças na direção da direita ou da esquerda sejam necessárias para acabar com os malfeitos. A verdade é que o PT fundamentou aquilo que era, até então, razoável teoria: há algo de mais podre no Reino do Brasil. A visão, em verdade antropológica, de que o brasileiro não separa bem as coisas da republica e da vida privada de pessoas e empresas, está acima das ideologias.Lula da Silva e Collor de Mello fizeram o mesmo, em graus e cores diversas, com o mesmo autoritarismo (na sua essência, mesmo que de formas diversas). Os valores sociais e culturais brasileiros estão corrompidos pela visão de um Estado à postos para ser assaltado e utilizado para fins privados. Ao final, não há a percepção de que há uma conta a ser paga pela sociedade ao longo de certo tempo, o qual pode ser curto, mas pode ser também longo.
Mesmo que muitos acreditem na premissa de que a confusão entre o público e o privado é maior que o que se demonstra nos atuais processos judiciais de Curitiba, contra sicrano e beltrano, a verdade é que a sociedade brasileira continua a buscar saídas limitadas para o país.
Sem mudanças estruturais, fará pouca diferença quem será o próximo Presidente da República. A começar pelo próprio sistema eleitoral e a legislação partidária. Esses dois pilares da política brasileira (com minúsculas) são a representação do patrimonialismo que muitos reconhecem, mas para o qual não encontram e apresentam soluções.
Se o próximo chefe de Governo e de Estado permanecer fincado às bases movediças do sistema eleitoral brasileiro, seja quem ele ou ela for, terá de sucumbir aos mesmos males de outros no passado recente e longínquo.
O país permanecerá em crise, mesmo que eventualmente assim não aparente por certo tempo. O caso de Lula da Silva é emblemático: seu governo era elogiado por quase todos os lados e via-se nele o estadista que ele nunca foi. Agora, verifica-se que era tudo farsa e prosa, sustentado por commodities em alta.
O país real finalmente venceu e acabou por mostrar as entranhas no circuito Curitiba -Rio de Janeiro - Brasília.
O que as pesquisas eleitorais nos mostram é o jogo de nomes políticos, produtores de factoides. Aqui e acolá, discute-se o que seria de Jair Bolsonaro, Lula, Marina, Ciro, Alckmin, Dória e outros na cadeira de primeiro mandatário do país. Vale avisar: o resultado desse jogo se tornará a cada dia mais aleatório se a sociedade, sobretudo as elites, não acordarem para o fato de que não há nada de substantivo sendo gerado dentro das veias sociais e que mude o caminho de irracionalidade e desilusão em relação ao país.
Não nos surpreenderíamos se de repente tenhamos dois candidatos fracos do ponto de vista partidário (e.g. Marina e Bolsonaro) na reta final da campanha eleitoral do ano que vem. Isso significa que essa aleatoriedade é resultado direto da falta de propostas de mudanças estruturais, seja nas bases jurídico-eleitorais (partidos e sistema), bem como, nos caminhos de transformação do país, na economia e na sociedade.
Na economia será necessário que finalmente possamos passar da fase “busca da estabilidade” (inflacionária e fiscal) para a fase “desenvolvimento integral (social e econômico)”. Na sociedade é preciso educá-la para a percepção de que o Estado não pode tudo e que o público pertence a todos e não pode ser “privatizado” para ninguém sob a supervisão de um Judiciário menos boquirroto e mais atuante.
Alguém pode se levantar contra a visão aqui disposta em poucas palavras e argumentar que o que aqui prego é idealista, pouco pragmático e, até mesmo, onírico. Vejamos.
De Lula da Silva até Jair Bolsonaro (este de forma restrita na mídia, mesmo que popular entre muitos), passando por Alckmin, Ciro, Dória, Marina e, até mesmo, Luciano Huck, todos começam a se colocar perante a sociedade.
Dado que a sociedade está tão perdida quanto as próprias elites sociais e políticas, o jogo de palavras pode ser lido de diferentes formas, inclusive com a aceitação daquilo que é irracional. Na França, país desenvolvido e educado, Marine Le Pen, candidata da extrema direita, dobrou de votos desde a última eleição presidencial (de 19% para 38% do eleitorado total).
Quem pode realmente apostar que no Brasil, país recheado de ignorantes, inclusive nas elites, a extrema direita não pode levar um populista como Bolsonaro à vitória?
Quem pode apostar com razoável certeza de que Lula da Silva não leva o trono da República? (Aqui a aposta é que o Judiciário acerta o candidato no peito e na cabeça). A vulnerabilidade dos outros candidatos, senão vem de denúncias de malfeitos, virá de suas próprias fragilidades pessoais e políticas, sobre um sistema político já provadamente falido.
Ora, ora, se alguém acredita que estão em curso mudanças estruturais para o país, que nos mostrem as saídas viáveis estão sendo construídas pelos, até agora, candidatos e, principalmente, pela própria sociedade.
O que vislumbro no momento é um imenso vazio político pronto para ser preenchido por qualquer candidato.
O resultado pode ser bom ou ruim, mas o risco é elevadíssimo de que o país permaneça fora dos trilhos à espera de soluções para “questões idealistas” que mudem de fato o país.
21 de maio de 2017
Frencisco Petros
A crise vigente tem natureza profunda e complexa. A sua solução requererá mudanças muito reais e estruturais nos modos da sociedade brasileira, sobretudo nas suas camadas superiores. Não cabe mais na condução da Política a confusão generalizada entre o interesse público e o privado.
É dessa relação mal estabelecida que nasce a corrupção, o nepotismo, o favorecimento e a má utilização dos bens públicos, cujas repercussões são macroeconômicas e macrosociais. Daqui não podemos sair com soluções meramente ideológicas sugerindo que mudanças na direção da direita ou da esquerda sejam necessárias para acabar com os malfeitos. A verdade é que o PT fundamentou aquilo que era, até então, razoável teoria: há algo de mais podre no Reino do Brasil. A visão, em verdade antropológica, de que o brasileiro não separa bem as coisas da republica e da vida privada de pessoas e empresas, está acima das ideologias.Lula da Silva e Collor de Mello fizeram o mesmo, em graus e cores diversas, com o mesmo autoritarismo (na sua essência, mesmo que de formas diversas). Os valores sociais e culturais brasileiros estão corrompidos pela visão de um Estado à postos para ser assaltado e utilizado para fins privados. Ao final, não há a percepção de que há uma conta a ser paga pela sociedade ao longo de certo tempo, o qual pode ser curto, mas pode ser também longo.
Mesmo que muitos acreditem na premissa de que a confusão entre o público e o privado é maior que o que se demonstra nos atuais processos judiciais de Curitiba, contra sicrano e beltrano, a verdade é que a sociedade brasileira continua a buscar saídas limitadas para o país.
Sem mudanças estruturais, fará pouca diferença quem será o próximo Presidente da República. A começar pelo próprio sistema eleitoral e a legislação partidária. Esses dois pilares da política brasileira (com minúsculas) são a representação do patrimonialismo que muitos reconhecem, mas para o qual não encontram e apresentam soluções.
Se o próximo chefe de Governo e de Estado permanecer fincado às bases movediças do sistema eleitoral brasileiro, seja quem ele ou ela for, terá de sucumbir aos mesmos males de outros no passado recente e longínquo.
O país permanecerá em crise, mesmo que eventualmente assim não aparente por certo tempo. O caso de Lula da Silva é emblemático: seu governo era elogiado por quase todos os lados e via-se nele o estadista que ele nunca foi. Agora, verifica-se que era tudo farsa e prosa, sustentado por commodities em alta.
O país real finalmente venceu e acabou por mostrar as entranhas no circuito Curitiba -Rio de Janeiro - Brasília.
O que as pesquisas eleitorais nos mostram é o jogo de nomes políticos, produtores de factoides. Aqui e acolá, discute-se o que seria de Jair Bolsonaro, Lula, Marina, Ciro, Alckmin, Dória e outros na cadeira de primeiro mandatário do país. Vale avisar: o resultado desse jogo se tornará a cada dia mais aleatório se a sociedade, sobretudo as elites, não acordarem para o fato de que não há nada de substantivo sendo gerado dentro das veias sociais e que mude o caminho de irracionalidade e desilusão em relação ao país.
Não nos surpreenderíamos se de repente tenhamos dois candidatos fracos do ponto de vista partidário (e.g. Marina e Bolsonaro) na reta final da campanha eleitoral do ano que vem. Isso significa que essa aleatoriedade é resultado direto da falta de propostas de mudanças estruturais, seja nas bases jurídico-eleitorais (partidos e sistema), bem como, nos caminhos de transformação do país, na economia e na sociedade.
Na economia será necessário que finalmente possamos passar da fase “busca da estabilidade” (inflacionária e fiscal) para a fase “desenvolvimento integral (social e econômico)”. Na sociedade é preciso educá-la para a percepção de que o Estado não pode tudo e que o público pertence a todos e não pode ser “privatizado” para ninguém sob a supervisão de um Judiciário menos boquirroto e mais atuante.
Alguém pode se levantar contra a visão aqui disposta em poucas palavras e argumentar que o que aqui prego é idealista, pouco pragmático e, até mesmo, onírico. Vejamos.
De Lula da Silva até Jair Bolsonaro (este de forma restrita na mídia, mesmo que popular entre muitos), passando por Alckmin, Ciro, Dória, Marina e, até mesmo, Luciano Huck, todos começam a se colocar perante a sociedade.
Dado que a sociedade está tão perdida quanto as próprias elites sociais e políticas, o jogo de palavras pode ser lido de diferentes formas, inclusive com a aceitação daquilo que é irracional. Na França, país desenvolvido e educado, Marine Le Pen, candidata da extrema direita, dobrou de votos desde a última eleição presidencial (de 19% para 38% do eleitorado total).
Quem pode realmente apostar que no Brasil, país recheado de ignorantes, inclusive nas elites, a extrema direita não pode levar um populista como Bolsonaro à vitória?
Quem pode apostar com razoável certeza de que Lula da Silva não leva o trono da República? (Aqui a aposta é que o Judiciário acerta o candidato no peito e na cabeça). A vulnerabilidade dos outros candidatos, senão vem de denúncias de malfeitos, virá de suas próprias fragilidades pessoais e políticas, sobre um sistema político já provadamente falido.
Ora, ora, se alguém acredita que estão em curso mudanças estruturais para o país, que nos mostrem as saídas viáveis estão sendo construídas pelos, até agora, candidatos e, principalmente, pela própria sociedade.
O que vislumbro no momento é um imenso vazio político pronto para ser preenchido por qualquer candidato.
O resultado pode ser bom ou ruim, mas o risco é elevadíssimo de que o país permaneça fora dos trilhos à espera de soluções para “questões idealistas” que mudem de fato o país.
21 de maio de 2017
Frencisco Petros