Em abril de 1962 foi inaugurada a Exposição Soviética no pavilhão de S. Cristóvão, no Rio de Janeiro.
Por ocasião do Dia do Trabalho, um grande comício foi promovido pelo PCB na Cinelândia, no Rio, ocasião em que falaram Prestes e diversos dirigentes sindicais. O Ministro do Trabalho, Franco Montoro, vaiado ao chegar, teve que se retirar. Populares agitavam bandeiras vermelhas e portavam cartazes e faixas distribuídas pelo partido, bradando, sem cessar, vivas ao PCB e exigindo reformas.
No dia 10 de maio, Prestes dirigiu-se ao povo, conclamando-o à luta em favor do voto dos analfabetos, soldados e marinheiros, bem como pedindo o registro eleitoral do PCB. Atacou as Forças Armadas, acusando-as de “assassinar camponeses no Nordeste” e recomendou a substituição do “atual governo” por um governo socialista. Em 15 de maio, falando aos trabalhadores, em Santos, João Goulart pregou as reformas “dentro ou fora dos moldes constitucionais”.
Em 23 de maio em palestra proferida no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, da Faculdade Nacional de Direito, Brizola criticou violentamente “a ocupação do país pelo capital estrangeiro”.
Em 16 de junho, o Gabinete de Ministros, chefiado por Tancredo Neves, anunciou que iria “tomar medidas” para “normalizar o abastecimento de açúcar, carne, arroz, leite e pão”, que têm faltado nos grandes centros urbanos.
Entrementes, o Centro de Cultura Popular da UNE e do MEC passou a desenvolver, em todo o país, uma campanha de doutrinação marxista com as suas famosas cartilhas, utilizando o Método Paulo Freire de alfabetização política.
Brizola lançou a palavra de ordem “Reforma ou Revolução” e as Ligas Camponesas o slogan “Reforma Agrária na Lei ou na Marra”.
O presidente Jango concedeu uma entrevista ao Pravda e dirigiu-se, por carta, a Nikita Kruschev.
As organizações sindicais entraram em estado de alerta reivindicando um governo nacionalista, e João Goulart, pressionado, disse que iria apresentar ao Congresso o nome de Santiago Dantas para substituir Tancredo Neves como Primeiro-Ministro. A UNE decretou greve pela mudança do Gabinete de Ministros, a CGT anunciou uma greve geral e o PUA (Pacto de Unidade e Ação) exigiu reformas radicais. As greves alastraram-se por todo o país e a tensão política atingiu o ápice. Santiago Dantas, um aliado dos comunistas, declarou na TV que iria lutar para “libertar o Brasil”.
No entanto, o Congresso aprovou o nome de Auro de Moura Andrade – que não chegou a ser nomeado por Jango - para o cargo de Primeiro-Ministro, o que foi o bastante para o acirramento da greve, comandada pelo Comando Geral de Greve. Brizola incitou o povo a reagir. Os estudantes ocuparam o Ministério da Educação. Populares invadiram e saquearam estabelecimentos comerciais no Rio de Janeiro.
Prestes aproveitou o cenário de contestação e apresentou ao Superior Tribunal Eleitoral o pedido de registro do PCB.
O presidente Jango, sob intensa pressão sindical, apresentou ao Congresso o nome do político gaúcho Brochado da Rocha para o cargo de Primeiro-Ministro, e Prestes emitiu um artigo condenando a conciliação do governo e determinando o prosseguimento da agitação em todo o país. Brochado da Rocha exigiu do Congresso “poderes específicos” para governar.
Em 14 de julho, diversos Almirantes foram exonerados de seus cargos por protestarem contra a nomeação do Almirante Pedro Paulo de Araújo Suzano para o Ministério da Marinha.
Em agosto de 1962, a Frente de Libertação Nacional promoveu um Congresso em São Paulo, e a UNE, em conjunto com o PCB, realizou um Congresso em Quitandinha com a presença de Brizola, e em São Paulo foi realizado o IV Encontro Sindical sob o controle do PCB.
Aproveitando o ascenso avassalador da esquerda, o PCB aprovou uma Resolução Política falando sobre divisões no seio das Forças Armadas e conclamando o povo a lutar e derrotar as forças imperialistas e reacionárias. Essa Resolução definiu os seguintes objetivos a alcançar: repulsa ao FMI; limitação da remessa de lucros ao exterior; nacionalização das concessionárias dos serviços públicos; reforma agrária radical; revogação da Lei de Segurança Nacional; legalidade para o PCB; reforma da Lei Eleitoral; direito de voto aos analfabetos, soldados e marinheiros; mudança da política externa; expurgo nas Forças Armadas; plebiscito para extinção do parlamentarismo.
Nesse ambiente, o comandante do então III Exército, general Jair Dantas Ribeiro declarou-se impotente para garantir a ordem “se o Congresso não aprovar o plebiscito”.
Em 1 de setembro, o gabinete do Primeiro-Ministro Brochado da Rocha renunciou e nova greve geral foi decretada pelo CGT. Brizola e Brochado da Rocha acusaram o Congresso Nacional de corrupção e Mauro Borges, governador de Goiás, declarou que “a espoliação é a causa da crise”.
Em 3 de setembro, o governador Brizola ocupou uma cadeia de rádio e afirmou que se dependesse dele, “o Congresso estaria fechado desde 15 de agosto”. Em 6 de setembro, em um comício no Rio de Janeiro, Brizola ameaçou Carlos Lacerda, governador da Guanabara, de “deposição”.
Em 10 de setembro, o Primeiro-Ministro Brochado da Rocha renunciou e somente em 14 de setembro foi formado um novo Gabinete, chefiado pelo Primeiro-Ministro Hermes Lima, considerado um Gabinete-tampão destinado apenas a preparar o plebiscito. A campanha pelo plebiscito permitiu a atuação pública do PCB. Nesse mesmo dia, Brizola chamou o general Nelson de Mello (Ministro da Guerra de Jango de julho a setembro de 1962) de “golpista”.
Em 20 de setembro o PCB publicou a relação de seus candidatos para as eleições parlamentares e de governadores de 3 de outubro. Realizado o pleito, diversos comunistas foram eleitos e em Pernambuco foi eleito Miguel Arraes. O problema da posse dos sargentos eleitos, negado pela Justiça Eleitoral, foi motivo de grande agitação.
Em 2 de dezembro, em plena crise de abastecimento, o Exército começou a distribuir arroz em diversos locais do Rio de Janeiro.
Em 6 de dezembro foi apreendido um carregamento de armas para grupos de guerrilha, em Goiás. Destinavam-se ao Movimento Revolucionário Tiradentes, fundado por Francisco Julião.
Em 1963 a agitação no país aumentou e se propagou às Forças Armadas. Em 15 de janeiro o general Osvino Ferreira Alves, um aliado dos comunistas, foi oficialmente homenageado peloCGT, e em São Paulo, cerca de 6 mil soldados, cabos e sargentos realizaram uma passeata reivindicando a posse dos sargentos eleitos em 3 de outubro.
O CGT, dominado pelo PCB e cada vez mais audacioso, divulgou um Manifesto responsabilizando o governo pela carestia e assinalando que os ministros não inspiravam confiança.
Em março, em um momento cheio de tensões, o PCB decidiu realizar um Congresso Continental de Solidariedade a Cuba no então Estado da Guanabara. Proibido pelo governador Carlos Lacerda, o Congresso foi realizado em Niterói, na sede do Sindicato dos Operários Navais. Nesse Congresso, Prestes discursou dizendo que o Brasil disputava com outros países sul-americanos a glória de ser o segundo país do continente a instaurar o socialismo. Disse também que o PCB já estava na legalidade de fato, restando apenas formalizá-la.
Em 28 de fevereiro de 1963, em entrevista ao jornal “Revolución”, de Havana, Francico Julião disse que “se Cuba for atacada, haverá guerra civil no Brasil”.
Em 27 de março, em palestra na Escola Superior de Guerra, o Ministro Hermes Lima (ex-Primeiro Ministro e então Ministro do STF) negou que houvesse infiltração comunista no governo.
Em abril, o sargento Garcia Filho, um dos eleitos em 3 de outubro e não empossado, acusou o Ministro da Guerra, general Amaury Kruel de “conspiração”, e o PCB, através do jornal “Novos Rumos”, porta-voz do partido, exigiu a demissão de Kruel e publicou uma nova Resolução Política conclamando as esquerdas a “derrotar os gorilas” e a política de conciliação. Miguel Arraes atacou o programa Aliança para o Progresso e Oscar Niemeyer recebia, em Moscou, o Prêmio Lênin de Paz.
Com a presença do Ministro do Trabalho e do governador Miguel Arraes, o CGT, em uma reunião de líderes sindicais, foi autorizado a decretar greve geral quando julgasse conveniente. Nessa reunião, o CGT exigiu do presidente da República a organização de um novo ministério que incluísse pessoas identificadas com as esquerdas. Cedendo às pressões, Jango reformou seu ministério.
Em 8 de abril, o general Osvino Ferreira Alves, no aniversário do I Batalhão de Guardas, na GB, disse que João Goulart “é Vargas redivivo”.
Em 19 de abril, em palestra na Faculdade Nacional de Direito, no Rio, o Ministro do Trabalho disse que “os estudantes devem ser mais rebeldes”.
Em 3 de maio, o governador Carlos Lacerda, da GB, disse que vai percorrer o país, em pregação democrática, “para substituir o desespero pela esperança”.
Em 6 de maio, em discurso pronunciado em Natal/RN, Leonel Brizola disse que “é preciso botar mais lenha na fogueira” e pressionar o Congresso. Concitou os soldados a pegarem em armas, se preciso, e atacou o comandante do Exército na área, general Muricy.
Em 24 de maio, em almoço no Forte de Copacabana, o general Osvino Ferreira Alves disse que “é preciso expulsar do Brasil os que vivem do capital estrangeiro”.
Em 18 de junho, dois mil homens, armados, sob a direção do falso padre Aníbal Mendes, invadem sete fazendas em Capivari, no Rio de Janeiro.
Em julho de 1963, em nova Resolução Política, o PCB deu apoio à criação da Frente de Mobilização Popular, através da qual o partido passou a controlar todas as forças esquerdistas do país. Assim terminava a Resolução: “O momento exige que os comunistas empreendam com energia e entusiasmo todas as suas forças, estreitem sua ligação com as massas trabalhadoras das cidades e do campo e intensifiquem sua atividade no sentido de ampliar e fortalecer a Frente Única. Através das lutas, nosso povo consolidará as vitórias já alcançadas e marchará para novas e decisivas vitórias”.
A seguir Prestes participou de um comício, em Recife, ao lado de Miguel Arraes e Pelópidas da Silveira, prefeito da cidade, e assinalou que o PCB “estava no governo, mas ainda não detinha o Poder”.
Em 3 de julho, dois mil oficiais, reunidos na sede do Clube Militar, no Rio, fizeram uma violenta manifestação contra o governo. Em conseqüência, sete oficiais que usaram da palavra na reunião, foram presos. Essa punição gerou uma segunda reunião de protesto, realizada em 8 de julho. Nesse mesmo dia, o governo proibiu o governador Carlos Lacerda de falar no Rádio e na TV.
Em 15 de agosto, em Belém/PA, o marechal Augusto Magessi, presidente do Clube Militar, afirmou que “militares verdadeiramente patriotas não precisam proclamaram-se nacionalistas”.
Em 23 de agosto, véspera do aniversário do suicídio de Vargas, o Comando Geral dos Trabalhadores promoveu uma grande concentração na Cinelândia, no Rio. Com a presença de Jango, o comício foi um espetáculo explícito de comunismo. Jango iniciou seu discurso falando da necessidade de “reformas”, todavia, a massa, aos gritos, exigiu dele uma definição. O presidente, então, foi forçado a mudar o tom e citou o CGT como “a entidade máxima dos trabalhadores brasileiros”, considerou válida a pressão das massas e prometeu realizar as reformas em curto prazo.
Em decorrência de uma greve no Porto de Santos, em todo o país marítimos, metalúrgicos, bancários e outras categorias, paralisaram suas atividades. O PCB convocou o povo “para aluta” e Arraes e Brizola – este pelos microfones da Rádio Mayrink Veiga, no Rio, escoltado por uma segurança composta por fuzileiros navais - realizavam audaciosos pronunciamentos.
Em 1 de setembro, um decreto suspendeu as atividades do IBAD-Instituto Brasileiro de Ação Democrática, uma entidade anticomunista.
Em 12 de setembro, sargentos da Marinha e Aeronáutica declararam-se em rebelião, em Brasília – ocupando diversos ministérios, a Companhia Telefônica e o aeroporto – por discordarem da decisão do Supremo Tribunal Federal negando a elegibilidade dos sargentos - rebelião logo dominada pelo Exército. Apenas Hermes Lima, então ministro do STF, votou a favor. Estranhamente, nesse dia 12 de setembro, o presidente estava fora de Brasília. Os comunistas, tendo à frente o deputado federal Neiva Moreira, fiel aliado de Brizola, apoiaram a insurreição e passaram a exigir imediata anistia para os revoltosos.
Em 3 de outubro, o governo enviou ao Congresso um pedido de Estado de Sítio e intervenção nos governos do Rio de Janeiro e São Paulo, mas foi obrigado a retirá-lo por imposição dos comunistas. O PCB emitiu seguidos Manifestos, conclamando o povo à luta. Um desses Manifestos dizia o seguinte: “O povo exige a libertação imediata dos graduados e praças das Forças Armadas presos em conseqüência do protesto de Brasília, a abolição das medidas discriminatórias adotadas contra os sargentos e a revogação do Decreto nº 9070, que ameaça o direito de greve”.
Logo a seguir, o PCB deu início a uma intensa campanha em favor da moratória, pela encampação das refinarias particulares e pela anistia aos sargentos presos em Brasília, anunciando que havia uma única solução para a crise permanente do governo Jango: a constituição de um novo governo baseado nas “forças progressistas”. A implantação do comunismo estava à vista e o estopim estava colocado. Bastaria apenas uma fagulha para detonar a carga explosiva. E essa fagulha não demoraria a surgir.
Em 7 de outubro, o deputado federal Nina Ribeiro denunciou uma tentativa de seqüestro e eliminação do governador Carlos Lacerda, que seria executada por pára-quedistas. O comandante da Divisão Aeroterrestre negou o fato e disse que a tropa saiu “para adestramento e, por coincidência, estava em local próximo do governador, que inaugurava obras”. O gabinete do Ministro da Guerra disse que “ignora a operação”. Na Câmara Federal foi instalada uma CPI para apurar o complô contra o governador Lacerda. Em 18 de outubro, um relatório do I Exército assinalou que “houve movimentação irregular da tropa” no caso da tentativa de seqüestro do governador.
Em 18 de novembro, o general Alfredo Pinheiro, conhecido pela alcunha de “Faz Tudo”, foi exonerado do comando da Divisão Aeroterrestre. A seguir, em 21 de novembro, o coronel Boaventura Cavalcanti, do Grupo de Obuses da Divisão Aeroterrestre, foi transferido para a guarnição de Curitiba por negar-se a prender o governador Carlos Lacerda, segundo declarou em entrevista. No dia seguinte, o coronel Boaventura escreveu carta-aberta ao Ministro da Guerra reclamando que “foi destituído por ter sido fiel à Lei e à Ordem”. Em 27 de novembro, João Goulart, em entrevista no Palácio Laranjeiras, desmentiu o atentado à integridade física do governador Lacerda.
(continua)
05 de novembro de 2014 Carlos I. S. Azambuja é Historiador.