Se o governo Dilma estava esvaziado, desnorteado e sem rumo, agora conseguiu piorar com a nomeação do ex-presidente Lula para o ministério. A ideia não foi um tiro no pé, foi direto na cabeça. Serviria para tirar o juiz Sérgio Moro do caminho de Lula, mas nem isso conseguiu ainda. Agonizante, a gestão Dilma ainda não morreu, mas entrou em coma, o tiro apressou o impeachment e o fim parece inevitável com a debandada de partidos que antes já vinham dando precário apoio ao governo. Lula é hábil negociador, conseguirá reconquistar apoios de partidos e empresários, virar de vez a página da crise política e pôr o Brasil nos trilhos do crescimento. Delirar é recurso dos desesperados. E, como tudo dá errado, o PT apela para o delírio.
Lula é hábil articulador quando tem um arsenal de ofertas para agradar ao interlocutor. Foi o que ele fez todo o tempo em seus oito anos de governo. O político quer verba, cargo (de preferência em estatal) ou um favorzinho para livrá-lo de enrascadas; o empresário gosta de benefícios fiscais, dinheiro barato de bancos públicos e gordos contratos financeiros com o governo – as empreiteiras até se organizaram em cartel para ratear contratos na Petrobrás. Com farto arsenal em seu poder, Lula multiplicou o troca-troca – triste marca de sua gestão. A prática resultou no mensalão, no petrolão e numa conta bilionária subtraída dos brasileiros.
Hoje o hábil articulador negocia de mãos vazias. Até seu indiscutível encanto pessoal murchou, suas piadas perderam a graça. Não tem o que oferecer e a moeda de troca que faria sucesso agora – livrar políticos enfiados até o pescoço na Operação Lava Jato – ele não tem a mínima chance de passar: a Polícia Federal rechaça e o inábil e arrogante falador acaba de comprar briga feia com o Poder Judiciário ao chamá-lo de “covarde”. Há muito, investidores e empresários não acreditam, nada esperam do governo e fazem campanha aberta e entusiasmada pelo seu fim, pregando a renúncia ou o impeachment da submissa Dilma Rousseff.
Aquele Lula de inegável prestígio popular sumiu com as manifestações de rua que o repudiam e pedem sua prisão. No lugar de beijos e abraços carinhosos, ele agora se esconde, vive encurralado, não aparece em público. Pena, porque seu carisma de líder popular lhe daria poder para fazer o que precisa ser feito: construir as reformas, dar ao País uma nova estrutura política, tributária, administrativa, previdenciária e trabalhista para atrair investimentos e conduzir o País ao crescimento e progresso econômico. Mas a ambição de perpetuar o PT no poder o levou para o lado oposto.
Há décadas as reformas estão na agenda. Hoje a mais urgente para as contas públicas é a previdenciária, mas a tributária é a que mais tem poder de dinamizar a economia e fazer justiça social. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) acaba de concluir estudo em que revela que os brasileiros têm a maior carga tributária do continente: pagam 33,4% do PIB em impostos, o dobro da média de 22 países da América Latina e do Caribe. Ou seja, todo mês você, caro leitor, e todos nós, brasileiros, transferimos em média 33,4% de nossa renda ao governo. Se seu salário é de R$ 5 mil, R$ 1.670 ficam com o governo, e com R$ 3.330 você se vira para pagar aluguel, educação das crianças, roupa, calçado, remédios, alimentação da família, etc. E mais: a estrutura de impostos é extremamente injusta, pois o País tributa menos a renda e o lucro e cobra mais da seguridade social. Enquanto aqui a renda e o lucro geram só 20,7% da arrecadação, nos demais países representam 27,8% do total, e a proporção chega a 33,8% nos países ricos da OCDE. Proporcionalmente à sua renda, aqui os pobres pagam mais impostos que os ricos.
E como os governos devolvem essa carga ao contribuinte? Com escândalos de corrupção, serviços públicos precários, gestão paralisada, como agora, o custo de sustentar 32 ministérios e igual número de partidos políticos. Enquanto isso o País afunda em recessão, desemprego e 700 mil pessoas perderam seus planos de saúde.
22 de março de 2016
Suely Caldas, O Estado de S. Paulo