Através do artigo de Antônio Goulart, Literatura Enganosa?, publicado na Zero Hora de 08/02, fiquei sabendo de uma opinião que o escritor norte-americano Ben Greenman tem alardeado: a de que a literatura de ficção não deveria se basear em fatos reais, sob pena de estar enganando o leitor. Segundo ele, ficção é uma prosa que trata sobre eventos e pessoas imaginárias, e fim de papo. Greenman resolveu processar escritores e editoras que não cumprem essa definição básica.
Só pode ser brincadeira. Em tudo – e em todos – há uma porcentagem de invenção. Inventamos não só o nosso amor, mas inclusive a nossa dor. Somos seres perplexos tentando encontrar nosso lugar no universo e procurando viver de um jeito civilizado e sensato, o que exige alguma elaboração intelectual. Usar apenas o instinto nos conduziria à selvageria. Temos que nos narrar – para os outros e para nós mesmos – a fim de sermos compreendidos. Quando eu conto algo que aconteceu comigo para uma amiga, estou criando uma história, é a minha versão daquele fato, é a maneira que encontrei de expressar o que vivi. Tivesse acontecido a mesmíssima coisa com outra pessoa, seria contada de forma e intensidade diferentes.
Somos todos escritores, só que uns escrevem e outros não, já dizia José Saramago.
Assim como pessoas reais podem experimentar emoções fantasiosas, o inverso se dá na literatura: tudo o que parece inventado flerta com a verdade. É ingenuidade acreditar que um personagem de romance possa ser totalmente fictício, sem considerar a bagagem psicológica de quem o criou, sem levar em conta a pulsão interna que estimulou o escritor a dedicar-se dias, meses ou até anos àquele projeto. Ele não está escrevendo sobre ele mesmo em sentido literal, seus personagens não são autobiográficos por definição, mas é claro que quem escreve se revela de alguma forma, velada ou nem tanto.
“Madame Bovary sou eu”, dizia Flaubert. Então não era ficção? Ora.
Em defesa de Ben Greenman, reconheço que os livros andam bastante umbilicais, reflexo de um mundo voltado para o próprio ego. Nenhum crime nisso. Dramas intimistas possuem o mesmo valor artístico das aventuras de suspense, das sagas épicas, das ficções científicas, independentemente de serem inspirados por algo que aconteceu. O leitor não deve se preocupar com essa ligação, e sim entregar-se ao livro sem dar a mínima para o escritor.
O que interessa é se o livro é bom ou ruim. O conteúdo fala por si. O escritor é apenas um ser obscuro que dá entrevistas para divulgar seu ofício, mas sua vida privada não importa nada. O que importa é o resultado de suas fantasias, sejam elas totalmente inventadas ou inventadas mais ou menos ou descaradamente inspiradas no que ele pensa que foi real.
Só pode ser brincadeira. Em tudo – e em todos – há uma porcentagem de invenção. Inventamos não só o nosso amor, mas inclusive a nossa dor. Somos seres perplexos tentando encontrar nosso lugar no universo e procurando viver de um jeito civilizado e sensato, o que exige alguma elaboração intelectual. Usar apenas o instinto nos conduziria à selvageria. Temos que nos narrar – para os outros e para nós mesmos – a fim de sermos compreendidos. Quando eu conto algo que aconteceu comigo para uma amiga, estou criando uma história, é a minha versão daquele fato, é a maneira que encontrei de expressar o que vivi. Tivesse acontecido a mesmíssima coisa com outra pessoa, seria contada de forma e intensidade diferentes.
Somos todos escritores, só que uns escrevem e outros não, já dizia José Saramago.
Assim como pessoas reais podem experimentar emoções fantasiosas, o inverso se dá na literatura: tudo o que parece inventado flerta com a verdade. É ingenuidade acreditar que um personagem de romance possa ser totalmente fictício, sem considerar a bagagem psicológica de quem o criou, sem levar em conta a pulsão interna que estimulou o escritor a dedicar-se dias, meses ou até anos àquele projeto. Ele não está escrevendo sobre ele mesmo em sentido literal, seus personagens não são autobiográficos por definição, mas é claro que quem escreve se revela de alguma forma, velada ou nem tanto.
“Madame Bovary sou eu”, dizia Flaubert. Então não era ficção? Ora.
Em defesa de Ben Greenman, reconheço que os livros andam bastante umbilicais, reflexo de um mundo voltado para o próprio ego. Nenhum crime nisso. Dramas intimistas possuem o mesmo valor artístico das aventuras de suspense, das sagas épicas, das ficções científicas, independentemente de serem inspirados por algo que aconteceu. O leitor não deve se preocupar com essa ligação, e sim entregar-se ao livro sem dar a mínima para o escritor.
O que interessa é se o livro é bom ou ruim. O conteúdo fala por si. O escritor é apenas um ser obscuro que dá entrevistas para divulgar seu ofício, mas sua vida privada não importa nada. O que importa é o resultado de suas fantasias, sejam elas totalmente inventadas ou inventadas mais ou menos ou descaradamente inspiradas no que ele pensa que foi real.