Praticamente chegamos ao final deste ano. Os dias se passaram e a questão fiscal, até hoje, não tem uma solução concreta, o que torna o nosso destino insustentável, privando-nos do equilíbrio macroeconômico, em função da falta de um consenso político de como solucionar o problema, no curto e no longo prazo. Tudo fruto de uma total escassez de sensibilidade e empenho deste desgoverno de, até mesmo, aprovar a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimento Financeiro), considerada, nas circunstâncias atuais,como bastante contributiva para o ajuste das contas de 2016.
Lamentavelmente, diante deste cenário humilhante em que nos encontramos, parece que nós brasileiros teremos que ser obrigados a aceitar o aumento da carga tributária ou, se não, poderemos ser engolidos por um exuberante cataclismo fiscal. Não me parece existir uma alternativa menos prejudicial do que a CPMF, embora ela jamais consiga eliminar a origem desse grave problema.
A meu ver, caso ela venha a ser aprovada, deverá ser exclusivamente direcionada para atender a União, limitada a um curto período, sem hipótese de prorrogação, somente o tempo necessário para que venha a atingir seu objetivo precípuo e, apenas complementando meu pensamento com uma sugestão da FEBRABAN (Federação Brasileira dos Bancos), apresentando alíquotas declinantes ano a ano.
O que realmente precisamos para sua adoção é ter, unicamente, a clareza das medidas e dos resultados para que a sociedade, mais uma vez, possa abraçar com ampla esperança a sua indesejável volta. Hoje faltam esses atributos por conta da invencível crise institucional pela qual estamos totalmente dominados. Indiscutivelmente, o maior dos obstáculos! O que assusta é que o jogo político não nos leva a lugar nenhum e, no entanto, é preciso focar o estado da economia.
Do ponto de vista da situação geral da economia, a melhor opção política a ser adotada não se dará através do impeachment ou até mesmo sem ele. A melhor escolha, qualquer que seja ela, parece estar numa solução rápida, consistente e estrategicamente direcionada ao âmago do problema, direcionada à recomposição imediata de forças que sustentem as decisões que tiverem de ser adotadas. Um processo prolongado continuará deixando tudo na contextual inércia, aprofundando a violenta deterioração nas contas públicas.
Entretanto, não vemos disposição do Congresso para aprovar o aumento de impostos. Autoridades desse desgoverno ainda avisam que, nessas condições, estarão obrigadas a baixar decreto que aumente a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), um tributo federal de caráter regulatório, cobrado sobre os combustíveis, que ganharia funções meramente arrecadatórias, mas que necessita de um ambiente econômico favorável para ser aplicada, pois provoca distorções inflacionárias altamente previsíveis. Se isso se confirmar, os preços dos combustíveis poderão atingir a estratosfera e a “nobre” inflação galopará com isso, com triunfal impacto na alta das cotações do dólar.
Se raciocinarmos no curto prazo, vai ser muito difícil este desgoverno achar um caminho sem elevar com determinação a carga tributária, pois a situação encontra-se periclitante, demonstrada nos relatórios analíticos, segundo os quais será dificílimo equacionar um ruidoso rombo de R$ 65 bilhões, que poderá se estender a R$ 90 bilhões, somente com cortes de despesas nos próximos doze meses.
Por isso, admito como brasileiro, para evitar uma convulsão social, ser fatal a ressurreição da CPMF, apoiada em um vigoroso aumento nas receitas extraordinárias, além dos indispensáveis cortes profundos nas indecentes despesas, principalmente, nos cargos comissionados, que ainda se encontram inabaláveis, na expectativa de serem utilizados como “moeda de troca” a fim de evitar um glorioso impeachment, cultuado pelas sibilantes oposições.
Acontece que, na situação do longo prazo, para impedir que a CPMF seja definitiva, é fundamental se promover, o quanto antes, as obrigatórias reformas estruturais que venham a reduzir drasticamente ou eliminar a condicional subordinação às receitas. Por isso, torna-se inevitável limitar a indexação do dispêndio público, fixar a idade mínima de aposentadoria para 65 anos, cancelar o regime especial para professores e ampliar o tempo de contribuição para as mulheres, dentre outros.
Também no longo prazo, Previdência (INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social), educação e saúde sinalizam um crescimento da despesa de pelo menos seis pontos do PIB (Produto Interno Bruto) até 2030. Controlar a elevação da despesa pública representa, essencialmente, alterar as regras que estabelecem a dinâmica da despesa. Não há opção que não seja uma profunda reforma nas vinculações e regras de crescimento do gasto público, para que um maior crescimento da economia não se transforme, consequentemente, num incremento mais acelerado da despesa.
Na realidade, não se conseguiu progredir quase nada na agenda de curto e, que dirá, na de longo prazo. Caso não venhamos a promover imediatos avanços consistentes no curto prazo até o próximo exercício, deverá acontecer necessariamente mais uma perda no grau de investimento, possivelmente, até antes disso.
Comenta-se que o país pode levar cerca de sete anos para readquirir o grau de investimento. A experiência de outras nações demonstra que o tempo pode ser bem mais acessível, quando se consegue adotar medidas como corte de gastos e reformas estruturais. A Coreia do Sul levou dois anos para recuperar o grau de investimento perdido, no final dos anos 1990, com um pacote que incluiu aumento de juros e de impostos e cortes de gastos públicos.
Na mesma época, outro exemplo é a Colômbia, que levou também dois anos, com a abertura da economia e contenção de violência que causava instabilidade. A Irlanda, mais recentemente, levou três anos, com corte de despesas, elevação de impostos e reformas. A Grécia, que teve a nota cortada em 2010 e a Venezuela, em 1980, não conseguiram até hoje recuperar o rating perdido.
O fator tempo será outro grande adversário nosso, por isso temos que ter velocidade, para não convivermos com os juros mais elevados e uma taxa de câmbio que poderá colocar-se em R$4,50/US$ ou R$ 6,00/US$. Fica difícil avaliar o que será um País em regime de “dominância fiscal” (teoria econômica), quando a dívida está em plena dissonância com os resultados primários previstos nos anos futuros, descontados para o presente.
Segundo alguns economistas, em condição de “dominância fiscal”, a inflação teria que aumentar consideravelmente, o suficiente para consumir o valor da dívida do setor público e torná-la plenamente conciliável com a capacidade do governo em pagar seus compromissos, através de superávits primários inferiores.
Mas a grande questão é que, de acordo com analistas, aproximadamente 57% das despesas do governo central são reajustadas pelo índice do salário mínimo e, consequentemente, pela inflação. Porém, considerando os gastos que são indexados à receita nominal, os quais deverão correr paralelamente à inflação em condições normais, a parcela de despesa pública do governo central terá que, de certa forma, ser corrigida também por ela, que tranquilamente poderá chegar a 75%. Impraticável!
Está muito difícil enxergar uma opção sólida para o curto prazo que não seja o retorno da CPMF, para alcançarmos, mesmo que seja um inexpressivo resultado primário em 2016. Não resta dúvida que a carga tributária brasileira (37% do PIB – Produto Interno Bruto) já se encontra em um plano insuportável, sendo a maior entre os países emergentes, porém em função da nossa imediata situação, não há uma escolha menos dolorosa.
Sem dúvida, a CPMF é um imposto nocivo que onera a produção, penaliza todos, ricos e pobres indiscriminadamente, até os sonegadores, possibilitando que sejam identificados, mas é menos inflacionária que a CIDE. De um jeito ou de outro, os pagadores de impostos sempre acabam assumindo a conta quando falta dinheiro para cobrir as inconsequentes estripulias oficiais.
Se por acaso for dado um tratamento radical na vertente da despesa, visando 2016,será necessário apresentar uma total desvinculação dela com a receita, salário mínimo desindexado e a idade mínima de 65 anos para aposentadoria, etc. Provavelmente, isto não acontecerá. Talvez sejam aspectos bem mais difíceis do que aprovar a CPMF e uma reforma previdenciária não é uma ação que se realiza para ser iniciada daqui a doze meses. Estabelecendo-se o limite mínimo de idade para aposentadoria, como exemplo, ele geralmente será seguido por uma norma de transição.
Possivelmente, poderemos ficar ancorados em um impasse sem obter um “acordão” político na aprovação da CPMF, em função do receio justificável de alguns com relação ao ex-presidente, que propaga suas proposições populistas, sociologicamente decadentes e fisiologicamente absurdas, pressupondo a derrubada dos juros e a expansão demasiada do crédito e das despesas públicas, numa fase de penúria por que passa o Tesouro Nacional, defendendo ardorosamente a permanência na distribuição das generosidades; é possível que ele venha naturalmente a coagir Dilma a assumi-las para saciar as suas extravagâncias ideológicas.
Evidentemente ela já não tem mais controle do governo há muito tempo. O baixíssimo índice de popularidade da presidente, a pressão da oposição e de muitos de seus “aliados” pelo impeachment e a crise aguda na economia retiraram dela sua capacidade de governar. É o seu “criador” quem está agora por trás, liderando onipresentemente as mudanças no desgoverno.
Resumindo:a presidente encontra-se literalmente solitária e ignorada pelo povo brasileiro, não apresenta capacidade de recuperação e até mesmo de um roteiro de fuga. Milagres estão fora de alcance. Truques, também.
Já estamos no limiar do imprevisível e nenhum artifício - banda cambial, vendas de reservas, etc. serão capazes de nos salvar de uma crise incontrolável, proporcionando a turbinada no dólar, ausência, ou até mesmo, insignificante crescimento da economia com uma inflação potente e progressiva.
A única certeza, dentre inúmeras incertezas que temos, é de que a situação econômica dessa forma só tende a se agravar ainda mais, pois somente esta irresponsável mandatária consegue perceber uma luz no final do túnel e, sem nenhum brilho que transmita um pouco de esperança e necessariamente confiança ao segmento empresarial, que jamais irá investir nessas condições. Continuaremos sendo sugados pela implacável recessão, com uma arrecadação incerta, sem propiciar um esforço fiscal compensatório.
O eixo determinante para mim é quanto o Brasil precisa piorar para que se possa ter um mínimo de conformidade relacionado às pró-reformas. Será que teremos que ter uma inflação de 1,5% ao mês, desemprego acima de 10% e taxa de cambio beirando R$ 6,00/US$?
Parece exagero ou até mesmo loucura, porém o fato é que atualmente estamos em pleno “voo cego”, atravessando uma incrível “zona de turbulência”, com premência de um vasto e robusto ajuste fiscal, mas com um desgoverno cuja base política ainda não demonstra a consciência total da necessidade de buscar a estabilidade nas contas públicas, e enfrentar com seriedade e independência a situação pela qual estamos passando.
Pelo visto, nosso sofrimento está apenas começando.
26 de outubro de 2015
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).