Depois de um curto período de trégua, a inflação retomou o fôlego e está disseminada pela economia. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 67,7% de todos os produtos e serviços pesquisados pelo órgão apontaram aumentos em outubro. Foi a maior taxa de difusão desde março, quando 69% dos itens apontaram alta.
Diante disso, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrou o mês passado com alta de 0,57%, quase o dobro do 0,35% de setembro. Não à toa, 53,7% dos entrevistados pela pesquisa CNT/MDA, divulgada ontem, disseram estar muito preocupados com a força da inflação e temem seu descontrole.
Apesar desses números, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, classificou o IPCA de outubro como um “bom resultado”, pois veio abaixo das expectativas do mercado — a média das estimativas apontava para elevação de 0,60%. “Foi um IPCA normal para esta época do ano, quando começa a ter aumento (no preço) de alimentos e produtos que estão na entressafra, como carnes”, afirmou Mantega.
O governo comemorou com mais ênfase, porém, o fato de a inflação acumulada em 12 meses ter caído pelo quarto mês consecutivo, de 5,86% para 5,84%.
No entender da equipe econômica, ainda é possível que a carestia neste ano fique abaixo da registrada no ano passado, de 5,84%.
Conforme a coordenadora de Índices de Preços do IBGE, Eulina Nunes dos Santos, os alimentos voltaram a pesar na mesa dos brasileiros. No geral, esses produtos saíram de uma alta de 0,14% em setembro para 1,03% no mês passado, respondendo, com as bebidas, por 44% de toda a inflação de outubro.
O grande vilão foi o tomate, com alta de 18,65%. O fruto havia se tornado o símbolo da inflação do governo Dilma Rousseff, mas, nos últimos meses, com a produção maior, os preços haviam cedido.
Também as carnes e as massas engoliram parte do orçamento das famílias impactadas pelo dólar. Com a estiagem, o gado e os frangos são alimentados com ração de milho e soja, cujos preços são dolarizados. As massas e os pães levam trigo em sua composição. Quase a metade do cereal consumida no país é importada.
Espanto geral
Na avaliação do economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal, com a disseminação dos reajustes pela economia, o represamento dos preços administrados (gasolina e passagens de ônibus, por exemplo), que subiram apenas 1% nos últimos 12 meses, e a resistência dos serviços, o Banco Central terá muito trabalho para derrubar o IPCA e levá-lo ao centro da meta, de 4,5%, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
A maior parte dos analistas acredita que a taxa básica de juros (Selic) subirá mais 0,5 ponto percentual no fim deste mês, de 9,50% para 10%. Mas começa a ganhar corpo a aposta de uma ação mais agressiva da autoridade monetária, com elevação de 0,75 ponto.
Pelas contas de Leal, mesmo que os alimentos sejam excluídos do índice de difusão calculado pelo IBGE, mais de 60% dos produtos e serviços tiveram reajustes em outubro. Ou seja, a carestia está espalhada e resistente, como já ressaltou o diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton.
A zona de conforto do BC, em relação a esse indicador, é de um patamar ligeiramente acima de 50%. Por causa da disseminação dos aumentos e de elevações de preços já programadas, como a do fumo, a Consultoria LCA acredita que o IPCA de novembro será de ao menos 0,7%.
A aposentada Maria da Penha Loureiro, 66 anos, disse estar estarrecida com os atuais nível de inflação. “Infelizmente, a alta de preços não se restringe aos alimentos. Tudo está caro demais. Gasto, mensalmente, cerca de R$ 1,2 mil em compras no supermercado. Cada vez compro menos”, afirmou. A servidora pública Ana Cristina Cavalcante, 53, também não escondeu o seu espanto, sobretudo diante da nova alta do tomate.
“Por semana, estava comprando um saco com até 15 tomates. Agora, levo apenas três ou quatro para a casa”, ressaltou. Para o comerciante Roberto Santos, 50, está inviável abastecer a família de 10 pessoas com carne. “Um mês atrás, gastava R$ 300 e comíamos carne três vezes na semana. Agora, desembolso R$ 500 e, mesmo assim, há semanas que só temos carne dois dias. E não adianta substituir o boi pelo frango. Tudo subiu”, emendou.
Vestuário
Para a economista Adriana Molinari, da Consultoria Tendências, os consumidores devem preparar o bolso, pois não haverá trégua no custo de vida tão cedo. “Não podemos esquecer que haverá aumento na gasolina”, disse. A expectativa é de alta de 7% nas refinarias e de 4,3% nas bombas.
“Isso dá um impacto de 0,17 ponto percentual no IPCA”, estimou. Segundo o diretor de
Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, os brasileiros sentirão, nos próximos meses, o repasse da alta do dólar para os preços. Ontem, a moeda norte-americana superou os R$ 2,30. “Esperamos que o IPCA de novembro acelere para 0,68%, encerrando o ano com inflação acumulada de 5,90%”, afirmou.
Além dos alimentos e das bebidas, os consumidores sentiram a disparada dos preços de itens de vestuário, com reajuste médio de 1,13% em outubro. Que o diga a aposentada Rachel Ungierowicz, 65. Há duas semanas, ela comprou uma blusa por R$ 180, valor que, dois meses antes, bancava duas peças e ainda sobrava. Na tentativa de gastar o menos possível, a vendedora Tainara Ferreira, 19, recorre às feiras “Em vez de comprar uma blusa de R$ 80 em um shopping, pago R$ 25 nas bancas”, afirmou.
» Acima do teto
Em três da 11 capitais pesquisadas pelo IBGE, a inflação acumulada em 12 meses está acima do teto de 6,50% definido pelo Conselho Monetário Nacional: Recife, com 6,81%; Fortaleza, com 6,64%; e Belém, com 6,54%. Isso, no entender dos especialistas, só confirma a força da carestia que atormenta os consumidores. Em Brasília, a alta do IPCA está em 5,90%, acima da média nacional de 5,84%.
Correio Braziliense
10 de novembro de 2013