"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 10 de novembro de 2013

ROGER AGNELLI DIZ QUE O GOVERNO NÃO SABE FALAR COM OS EMPRESÁRIOS

Para ex-presidente da Vale, dificuldade de comunicação é um dos focos de tensão entre Brasília e setor privado


O empresário Roger Agnelli, ex-presidente da Vale, diz que o governo não sabe se comunicar com o empresariado e com os grandes investidores. Esse seria um dos focos da tensão entre Brasília e o setor privado, que vem aumentando nos últimos tempos.
 
"Houve muitas mudanças, e isso freia o investimento. Os empresários precisam de regras muito claras para tomar decisões", disse Agnelli.
 
Ele acha que o país não está tão ruim quanto dizem os críticos, nem tão bem quanto o governo anuncia. Entende que o Planalto tenta melhorar o canal de comunicação com o mercado, mas ainda falta clareza. "Quer privatizar ou não? Quer iniciativa privada forte ou não?"
 
Aos 54 anos, um dos executivos mais admirados de sua geração, Agnelli deixou a Vale em 2011 por pressão do governo, que é acionista indireto da companhia.
 
Depois de 11 anos no comando da maior mineradora de ferro do mundo, no ano passado se lançou como empresário e criou a AGN, uma empresa com negócios nas áreas de mineração, bioenergia e logística.
 
A seguir, os principais trechos da entrevista à Folha.
 
Folha - O sr. está construindo uma empresa de commodities em meio a uma crise mundial e num país que perdeu o charme aos olhos do investidor estrangeiro. Não é um momento ruim para se lançar como empresário?
Roger Agnelli - É um projeto de longo prazo. Estou investindo num momento de baixa para começar a produzir quando a economia estiver bombando. É uma aposta. Tem hora que é preciso ter coragem.
 
Quando a economia vai bombar?
Acho que o ano que vem será melhor do que os últimos três. A Ásia vai crescer forte, puxada por China e Japão, os EUA vão melhorar e a Europa deixa de piorar. Isso vai puxar a economia mundial e o Brasil cresce junto.
A discussão é como se dará esse crescimento. Baseado no consumo, como até agora? Na minha opinião, precisa ser com inflação sob controle, disciplina fiscal e investimento em infraestrutura. Tirar o atraso na infraestrutura é prioritário para que o crescimento seja duradouro.
 
Por que o governo está com dificuldade para atrair os empresários para as concessões de infraestrutura?
Houve mudanças importantes de regulação em diversas áreas, como transporte, energia e portos. Tudo ao mesmo tempo. Algumas mudanças ficaram confusas e o governo está aperfeiçoando. Isso freia um pouco o investimento.
 
Os empresários precisam de regras muito claras para tomar suas decisões. Querem saber aonde se quer chegar e qual a linha mestra do governo. Quer privatizar ou não? Quer iniciativa privada forte ou não?
Mas o que parece haver hoje é um abismo entre governo e empresários. O setor privado reclama que o governo quer controlar o lucro, muda as regras do jogo o tempo todo e se mete em tudo...
O Brasil não está tão ruim quanto dizem os críticos, mas também não está tão bem quanto o governo afirma. Acho que o governo tem dificuldade para se comunicar com os empresários e os grandes investidores. Ele se sai muito melhor com a sociedade civil, tanto que seu nível de aceitação tem sido elevado. A comunicação com o mundo empresarial carece de mais clareza.
O governo está tentando melhorar o canal de comunicação com o mercado, mas ainda há muita bateção de cabeça, com ações e informações contraditórias.
 
Dentro do governo existe a percepção de que há má vontade da parte dos empresários...
É uma visão equivocada. A vontade do empresário é ter um ambiente econômico melhor, estabilidade, transporte para sua mercadoria, ele quer investir onde tenha maior retorno e também que as condições sociais melhorem. Quanto melhor o ambiente, melhor para os negócios.
 
Parte dos seus projetos vai depender do dinheiro de investidores para sair do papel. Como atrair capital de risco num momento conturbado com este?
Se tiver um bom projeto, competitivo, o dinheiro vem.
 
Até que ponto a derrocada das empresas de Eike Batista prejudica a imagem do país lá fora?
Eike era um empresário querido pelo governo e pelo mercado e seu sucesso foi vendido no mundo inteiro como o sucesso do Brasil. Quando vem um tombo desse tamanho, deixa uma dúvida: será que o Brasil é tudo isso mesmo ou não?
Mas a derrocada do Eike é um ponto fora da curva. Pode afetar a imagem do país no curto prazo, mas o investidor é profissional e vai entender que é um ponto fora da curva.
 
O sr. ficou aborrecido com a presidente Dilma por ela ter pressionado por sua saída na Vale?
Não. Hoje estou muito feliz. Trabalho com as pessoas de que gosto, estou muito mais presente com a família.
 
Mas o sr. não queria ter deixado a Vale...
Chega um momento em que você quer ou é forçado a mudar. Fiquei 11 anos na Vale e foi ótimo. Mas minha qualidade de vida hoje é muito melhor.
 
Por que o governo quis que o sr. deixasse a empresa?
Foi decisão de acionista [o governo é acionista indireto da mineradora]. Decisão de acionista a gente não discute. Se ele acha que é o momento de trocar, troca. Já virei a página.
 
No ano passado o sr. criou uma empresa para atuar em mineração, bioenergia e logística. Quando ela começa a operar?
Os projetos de mineração, onde temos a sociedade com o BTG Pactual, estão mais adiantados. No começo do ano que vem vamos iniciar a implantação de uma mina de cobre no Chile.
Em maio, começamos a produzir fosfato no Pará. Também estamos pesquisando potássio em Sergipe. As minas de cobre e fosfato começam pequenas, com potencial para crescer. A de potássio tem porte médio, com potencial de 500 mil toneladas/ano. O Brasil importa quase tudo. A única mina do país, da Vale, produz cerca de 700 mil toneladas/ano. Também estamos avaliando oportunidades de investimento em potássio, fosfato e minério de ferro na África.
 
Seus projetos estão muito focados na África, um lugar politicamente instável. Algumas mineradoras estão saindo de lá, e a própria Vale suspendeu um grande projeto implantado pelo sr. Isso não o preocupa?
Enxergo diferente. Vejo todo mundo indo para lá. Indústria de consumo, montadoras, empresas da Europa e da Ásia estão investindo pesado lá. Tem gente que enxerga risco político na Argentina e na Venezuela.
Tem gente que olha para esses países e enxerga oportunidades. A África é um continente novo, institucionalmente falando. Tem países que já estão na quinta eleição democrática, tem outros que estão na primeira. A África passa por um processo acelerado de urbanização, como o Brasil dos anos 1960. É a hora de estar lá.

10 de novembro de 2013
 DAVID FRIEDLANDER - FOLHA DE SÃO PAULO

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