A maior economia do planeta virou mais uma página da sua história econômica e retorna à sua normalidade, após uma gigantesca bolha criada no crédito e habitação (subprime) entre 2000 e 2007,deixando mais uma lição para a comunidade financeira internacional de como sair de uma das piores crises ocasionada pelos exageros do capitalismo.
Segundo o reconhecido economista inglês John Maynard Keynes,“o capitalismo é capaz de criar grandes crises, mas ele mesmo sabe corrigir os seus erros”.Foi justamente o que ocorreu nos EUA a partir de 2009/10.
Entre as economias maduras, a norte-americana foi a que ganhou mais fôlego nos últimos meses, apresentando um desenvolvimento gradual e transparente no ambiente doméstico, ancorada na confiança do consumidor, dentro dos padrões normais das economias de mercado e buscando atingir a meta do crescimento “auto-sustentável”, bem mais rápido do que todas as outras economias avançadas juntas.
O mercado de trabalho tem melhorado continuamente, as organizações empresariais e as famílias vêm se desvencilhando das dívidas pesadas contraídas e os preços em queda do petróleo impulsionam os gastos dos consumidores.
No último trimestre de 2014, o consumo americano aumentou a uma taxa anual de 4,3% ao ano e os estoques de produtos nas empresas cresceram para atender à demanda progressiva no mercado interno. Para uma economia de consumo, já existe uma sinalização importante, com os gastos das famílias situando-se em torno de 70% do PIB (Produto Interno Bruto) do país, reconquistando a posição perdida desde o surgimento da crise em 2008.
No decorrer da sua recuperação,a economia acelerou a criação de mais de 240 mil empregos ao mês nos últimos doze meses, com a taxa de desemprego em 5,6%, abaixo da meta do FED (Banco Central americano) de 6%; isso revela uma tendência de enfraquecimento do índice,numa busca do pleno emprego e aproximando-se dos níveis da pré-crise econômica, há sete anos.
Embora exista este contexto mais otimista, a “prudência” predomina na conduta dos agentes econômicos conservadores, sobretudo no segmento empresarial. Ainda patina o investimento privado e o crescimento estagnado dos salários situa–se aquém da sua posição histórica, dentro dos padrões de um crescimento do PIB ao redor de 3% ao ano. No terceiro trimestre de 2014, este indicador atingiu 5% e 2,6% no último trimestre, abaixo do previsto, ainda na dependência de uma revisão que poderá vir acima deste patamar, possivelmente sem interferir nos fundamentos saudáveis, segundo os analistas.
Da mesma forma acontece com o ritmo do comportamento inflacionário.
Desprezando-se os efeitos causados pela queda no preço do petróleo, a inflação ao consumidor está girando apenas a uma taxa anualizada próxima a 1,3% ao ano.
Atualmente, a economia americana recebeu outro forte incitamento na sua revitalização, também motivado pelo mergulho profundo dos preços dos derivados de petróleo. Dentro de uma sociedade de consumo, que privilegia ao máximo o automóvel como transporte individual, este efeito declinante apresenta o mesmo êxito expansionista de uma redução de impostos, fortalecendo a renda que poderá ser direcionada para o consumo.
A inflação baixa aliada à inexistência dos aumentos salariais ainda favorece o FED a manter os juros em níveis baixíssimos e negativos (zero e 0,25% ao ano desde dezembro de 2008), o que estimula a recuperação da economia e encoraja o capitalismo americano. É interessante ressaltar que os juros praticados nos Treasuries (títulos emitidos pelo Tesouro americano), com o prazo final de dez anos, estão sendo negociados a uma taxa de 1,75%, igualmente bem abaixo dos seus valores históricos.
Outros pontos importantes merecem destaque quando se observa o restante do universo. As taxas de crescimento das importações americanas têm sido bem superiores às das exportações, tornando esta particularidade uma excepcional alavanca para beneficiar outras economias. Segundo analistas, esse excedente identificado no consumo,preliminarmente poderá representar algo em torno de 1% do PIB para o último trimestre de 2014, bastante expressivo quando comparado à grandeza da economia norte americana.
No início de fevereiro, o Departamento de Comércio dos EUA divulgou os números finais relativos a dezembro passado, envolvendo a diferença entre as exportações e importações, que inicialmente se apresentou superior ao cogitado. Em função disso, os analistas estão revisando para baixo o crescimento do último trimestre para 2% do PIB.
Beira 20% a valorização do dólar, quando relacionado a uma cesta de moedas, incluindo nela o nosso Real, após o FED ter iniciado, em julho passado, um leve movimento de aperto nas condições monetárias. A correlação entre a alta do consumo dos americanos com a queda nos preços dos produtos importados, incentivada pelo fortalecimento desta moeda, significa um robusto impulso nas economias europeia, chinesa, japonesa e emergente como a nossa.
Efeito dominó
O ambiente generoso que prevalece nos EUA irá se modificar quando o FED começar uma nova e longa etapa na normalização dos juros. Os analistas açodados estimam que a mudança aconteça a partir do meado deste ano, enquanto outros, só os enxergam mais elevados possivelmente no decorrer de 2016. Em alguns momentos, estas especulações têm proporcionado instabilidade nos mercados financeiros.
Recentemente, no último encontro do FOMC (Comitê Federal de Mercado Aberto) promovido pelo FED, transpareceu que a possibilidade da elevação dos juros para junho próximo diminuiu consideravelmente. Continuam as discussões entre os membros sobre qual o momento certo para ascendê-los.
Existe um consenso entre os integrantes de que a decisão de quando haverá a elevação dos juros passará por uma grande avaliação baseada em indicadores econômicos, mas encontrar o momento ideal tem levado os analistas a reflexões em função das complexidades aparentes. Já identificaram e particularizaram os “prós” e “contra” de postergar ou apressar o aperto monetário, mas a escala de tempo ainda não está consolidada. Sem dúvida, o panorama econômico diante de algumas variáveis é desafiador.
Janet Yellen (presidente do FED) divulgou na imprensa internacional há dias atrás, que os mercados serão informados com antecedência quando a autoridade decidir sobre o tema.
A probabilidade é de que quando as taxas voltarem a subir, o capital hoje aplicado em economias emergentes como o Brasil migre para os Estados Unidos, ocasionando a valorização do dólar nesses locais.
Quanto à oxigenação da economia americana,como é de praxe, tende a causar um significativo impacto nos países em desenvolvimento. Afinal, existe aquela máxima que diz que quando a “América espirra, o mundo pega um resfriado”,pela sua influência sistêmica nos destinos da economia mundial.
Entre os analistas,um pensamento está se alinhando, de que está praticamente sepultada a crise iniciada em 2008, a qual deixou a economia global beirando o abismo de uma profunda depressão. Segundo o presidente democrata Obama, “A sombra da crise passou”.
Mas existe uma “sutileza” interessante que não se pode deixar de cogitar, pois ainda existem muitas incertezas geopolíticas em andamento que podem ultrapassar seus limites e impactar negativamente na economia norte-americana. É bem mais provável que o inesperado venha do ambiente externo do que produzido dentro das fronteiras americanas.
Enquanto isso, potências econômicas como a União Europeia com seus problemas estruturais, China e Japão continuam emitindo sinais de desaceleração em suas economias. Diante disso, percebe-se que após iniciada a crise, a saúde econômica internacional ainda prossegue debilitada, com baixo potencial de crescimento e piora nos indicadores sociais.
Isso tudo faz uma diferença considerável no ambiente macroeconômico mundial, pois os EUA tornam-se um forte concorrente na captação dos investimentos internacionais, agravando as possibilidades de fluxos de investimentos para as nações emergentes, principalmente aquelas que, a exemplo do Brasil, perdem gradativamente a força da atratividade pela falta de oportunidades reais e efetivas.
Tio Sam deixa, mais uma vez, outra mensagem aos socialistas de plantão: ainda não foi dessa vez que a profecia marxista de que o capitalismo entraria em colapso ocorreu. Quem sabe, na próxima, somente para encantá-los?
03 de março de 2015
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).