Reportagem de Marta Beck, Cristiane Jungblut e Fernanda Kracovics, O Globo de 27 de fevereiro, revela que a presidente Dilma Rousseff vai editar um decreto ampliando em 65,5 bilhões de reais os cortes nos gastos do Tesouro até o mês de abril, no sentido tanto, é claro, de reduzir as despesas públicas, quanto para assegurar o enigmático superávit primário, que não passa de um sofisma para os desembolsos e receitas do Executivo. Inclusive, na mesma sexta-feira, O Estado de São Paulo publicou matéria acentuando que o superávit primário registrado em janeiro (10,4 bilhões de reais) foi o menor dos últimos seis anos. Mas afinal de contas, o que é superávit primário?
Trata-se do confronto entre a receita e a despesa, afastando-se o pagamento que o governo faz à rede bancária, dos juros de 12,25% ao ano, para rolar a dívida interna do país. Assim, feitas as contas reais, o superávit primário transforma-se em déficit secundário. Basta comparar o endividamento nacional, de acordo com o levantamento do companheiro Flávio José Bortolotto, neste site, de 2,2 trilhões de reais, sobre o qual recaem os juros, com o desempenho da arrecadação.
Do total da dívida, apenas 8% refere-se a compromissos em dólar, portanto com taxas menores, porém com riscos de câmbio maiores. Mas para simplificar, vamos apenas levar em conta o número redondo de 2 trilhões de reais. Ora, 12,25% em cima de 2 trilhões representam a obrigação de um desembolso anual em torno de 250 bilhões de reais. Então aonde vai parar o superávit primário? Em lugar algum.
Por que os governos não falam diretamente no déficit das despesas incluindo os juros? Afinal, eles existem e, para citar Einstein, o que existe aparece. Partir para o sofisma do superávit primário é tentar ocultar a verdade da opinião pública. É de fato, um esforço para iludir a população brasileira. Superávit primário é algo que só existe no papel.
NÃO ACREDITEM
Há a versão de que os cortes projetados para direitos sociais, como a redução de 50% na pensão por morte legada pelos segurados aos seus herdeiros legais, referem-se a um movimento para reduzir a dívida interna líquida do Brasil.
Não acreditem. Para diminuir o estoque acumulado do endividamento (2,2 trilhões de reais), seria indispensável pagar os juros de 250 bilhões (reais) e, em seguida abater-se alguma fração do total da dívida. Caso contrário, não se está diminuindo dívida alguma.
Essa conta é fácil de fazer. Qualquer um pode realizá-la. É só comparar com as dívidas ou com os crediários que têm pela frente. Não acreditem, por exemplo, que existam ofertas de crédito sem incidência de juros. Não é possível. Os juros já vêm embutidos nos preços das prestações. Para decifrar o enigma (falso enigma) do superávit primário, é suficiente cotejar os juros, de um lado, com o estoque da dívida de outro.
Um lance simples de cálculo, mas que os PHDS tornam nebulosos, tentando passar a ideia de que a ocorrência do tal superávit primário significa um resultado positivo, um avanço nas contas públicas.
O mesmo que cada um fizesse o cálculo de suas despesas mensais excluindo, por exemplo, as despesas com alimentação. Surgiria um superávit hipotético, um falso estímulo para aplicações na poupança mensal. Nada disso. Superávit é superávit, incluindo-se todos os fatores. O mesmo raciocínio aplica-se para desvendar o déficit real. É isso aí.
03 de março de 2015
Pedro do Coutto
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