Charge do Sponholz (sponholz.arq.br)
Em depoimento ao juiz Sergio Moro, o herdeiro do grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, afirmou que o pagamento a políticos em caixa dois era recorrente na empreiteira. Em uma de suas planilhas, as doações eleitorais oficiais eram identificadas como ‘bônus’. “Três quartos do custo estimado das campanhas era caixa dois. Então, o pessoal precisava de caixa dois”, disse o executivo, em audiência realizada na segunda (10) e tornada pública nesta quarta (12).
No depoimento, o herdeiro voltou a afirmar que o ex-presidente Lula era tratado internamente como ‘Amigo’, e diz que a empresa disponibilizou a ele um saldo de R$ 40 milhões de propina, ao final do seu mandato. “A gente entendia que o Lula ainda ia ter influência no PT. O Lula nunca me pediu diretamente isso; eu combinava com o [ex-ministro Antonio] Palocci”, afirmou.
EM DINHEIRO VIVO – O executivo diz não saber o destino de todo o dinheiro, mas sabe que alguns valores foram sacados em espécie, por exemplo, a pedido de Palocci, e descontados do saldo “Amigo”.
“Quando ele pedia isso, eu sabia que estava se referindo a Lula”, declarou o empreiteiro.
Parte do saldo também serviu para a compra de um terreno que seria doado ao Instituto Lula, num plano que acabou sendo abortado. A Odebrecht, depois, vendeu o terreno e “creditou” o valor no saldo “Amigo” novamente, segundo contou Marcelo.
DEPARTAMENTO DE PROPINAS – O atual delator da Lava Jato admitiu que a Odebrecht estruturou um departamento de propinas no início da década de 1990, simultaneamente ao escândalo dos anões do orçamento, em 1993, e à internacionalização da companhia. A ideia era acabar com o “descontrole total” da contabilidade e continuar atendendo às demandas dos políticos.
Com isso, passou a pagar propinas no exterior —chamadas pelo empreiteiro de “pagamento não contabilizado”. Os presidentes de cada unidade de negócios tinham autonomia para fazer seus pagamentos.
Parte deles era feita em offshores. Outra parte, paga em dinheiro em espécie, por meio de doleiros que recebiam os valores da Odebrecht no exterior e se encarregavam de convertê-los para reais.
ABRIR PORTAS – “Essa questão de eu ser o grande doador, no fundo, é também [para] abrir portas”, afirmou.
Segundo o delator, qualquer pedido que ele fizesse a um político no Brasil, mesmo que de um pleito legítimo, gerava uma “expectativa de retorno financeiro”. “Infelizmente, em toda relação empresarial com um político, por mais que o empresário peça pleitos legítimos, no fundo, tudo gera uma expectativa de retorno”, afirmou.
No depoimento, Marcelo também confirmou que o apelido “Italiano” era uma referência ao ex-ministro Antonio Palocci, tido como seu principal interlocutor no governo do PT.
BOBO DA CORTE – Ele voltou a afirmar que se sentia “o bobo da corte” do governo, ao assumir projetos caros por pressão do governo federal, como os estádios da Copa.
“É um absurdo. O governo cria os problemas para a gente, e depois, quando a gente entope nossa agenda para solucionar, eles criam a expectativa de que a gente vai doar”, afirmou. “A gente fica lá mendigando para o governo resolver os problemas que me criou.”
O executivo também contou um episódio em que o ex-ministro Guido Mantega teria dito, em meio à negociação de um programa de refinanciamento, que tinha a expectativa de que a Odebrecht doasse R$ 50 milhões à campanha da ex-presidente Dilma Rousseff em 2010.
PÓS-ITÁLIA – Esse valor está incluído nos créditos da planilha “Programa Especial Italiano”. Mantega, nessa tabela, é referido como o “Pós-Itália”.
“Ele não chegou para mim e falou para mim: ‘Olha, só vou fazer isso por causa disso’. Mas a gente estava discutindo um assunto, ele botou [o número] no papel e disse que tinha a expectativa”, afirmou Odebrecht.
Os vídeos do interrogatório, ocorrido no início da semana, foram divulgados nesta quarta (12), após o levantamento do sigilo da delação da Odebrecht pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
OUTRO LADO – Em nota, o Instituto Lula informou que o ex-presidente nunca pediu valor indevido à Odebrecht nem “a qualquer outra pessoa”. “Lula não tem nenhuma relação com qualquer planilha na qual outros possam se referir a ele como ‘Amigo'”, diz.
O advogado de Palocci, José Roberto Batochio, que também defende Lula e Mantega, vem afirmando que o ex-ministro é inocente e que jamais intercedeu em favor da Odebrecht, mas cumpria seu papel. O apelido “Italiano”, segundo ele, não se refere a Palocci, mas “é um apelido em busca de um personagem”.
Mantega tem negado irregularidades.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – No caso do crédito de R$ 40 milhões, aberto no nome do “amigo” Lula, ficou claro que não se tratava de pagamento por serviços prestados, mas de adiantamento por serviços futuros. (C.N.)
12 de abril de 2017
Estelita Hass CarazzaiFolha