"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

MENTIRA DE PRESIDENTE DA REPÚBLICA TAMBÉM VAI SER INVESTIGADA NA CPMI DOS METRÔS, HEIN GLEISI HOFFMANN?


A senadora petista Gleisi Hoffmann, que tanto defende a investigação dos metrôs, bem que poderia colocar o de Curitiba, capital do estado por onde se elegeu, no centro da CPMI. Afinal de contas, Dilma Rousseff anunciou hoje, pela terceira vez, a promessa da mesma obra. Promessa, porque de obra nada! A matéria é da Folha de São Paulo.
 
A presidente Dilma Rousseff visita Curitiba nesta sexta-feira (9) para anunciar, pela terceira vez consecutiva, verbas para o metrô da cidade, que ainda não saíram do papel. A petista já esteve na capital paranaense em outubro de 2011 e em outubro do ano passado pelo mesmo motivo. De lá para cá, a gestão municipal passou às mãos de um aliado, o pedetista Gustavo Fruet, o projeto foi alterado e o custo subiu.
 
Hoje, a presidente participa do lançamento do edital de licitação da obra. Das outras vezes, esteve na cidade para anunciar que o projeto seria contemplado no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), primeiro com R$ 1 bilhão, depois, com R$ 1,8 bilhão.
 
A prefeitura e os aliados da presidente defendem que este é "o maior investimento da história de Curitiba", o que justifica sua visita. O transporte público da cidade, tido como modelo e composto exclusivamente por ônibus, dá mostras de saturação. O metrô é visto como a principal forma de ampliar a capacidade de locomoção de passageiros. No total, serão investidos R$ 4,5 bilhões no projeto.

Dilma também assinará termos de compromisso para a liberação de verbas a outras três obras de mobilidade em Curitiba –também anunciadas na última visita. Serão R$ 408 milhões para a conclusão da chamada Linha Verde e para a ampliação de faixas exclusivas para ônibus. A diferença é que, agora, a verba fica disponível e a licitação dos projetos pode começar.

MENSALEIRO DO PT CONTINUA NA PAPUDA

Joaquim Barbosa decide que José Dirceu não tem direito a trabalho externo.


 
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, negou pedidos de trabalho externo formulados por José Dirceu e Rogério Tolentino, ambos condenados na Ação Penal (AP) 470. Segundo o ministro, a concessão de autorização para que qualquer preso se ausente do estabelecimento prisional para trabalho deve obedecer a requisitos legais objetivos e subjetivos, entre os quais a exigência legal, prevista no artigo 37 da Lei de Execuções Penais (LEP), de cumprimento de um sexto da pena.

Ao indeferir o pedido de Dirceu na Execução Penal (EP) 2, o ministro informou que, como ele cumpre pena de 7 anos e 11 meses de reclusão, para que tenha direito à prestação de trabalho externo é preciso que cumpra, pelo menos, 1 ano, 3 meses e 25 dias de prisão no regime semiaberto, podendo descontar os dias remidos pelo trabalho que vem executando no interior do sistema prisional, caso sejam homologados e não haja falta grave.

O ministro ressaltou que, além de não cumprir o requisito temporal, o fato de a oferta de emprego apresentada por Dirceu no requerimento para trabalho externo ser proveniente de um escritório de advocacia criminal também configura um impedimento legal. Ele destacou que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que a realização de trabalho externo por apenado em empresa privada não é adequada, pois impede um mínimo de vigilância inerente aos regimes fechado e semiaberto.

“Com efeito, se mesmo o trabalho interno, realizado dentro do estabelecimento prisional, somente pode ser gerenciado por empresa privada se houver convênio com o Estado (artigo 34, parágrafo 2º, da LEP), no caso do trabalho externo este cuidado é ainda mais importante, para garantir que o benefício efetivamente atinja os fins da execução penal”, observou.
 
(Do Site do STF)
 
09 de maio de 2014
in coroneLeaks

PESQUISA DATAFOLHA


 
A pesquisa Datafolha publicada hoje mostra que 74% dos brasileiros querem mudanças. 19% acham que Aécio está mais preparado para promovê-las, contra 15% que acha Dilma a mais indicada para isto. O que chama atenção é que Sul, Sudeste e Centro-Oeste, que representam 65% do eleitorado, apostam que Aécio é o candidato das mudanças. No Sudeste, então, que possui 43% dos eleitores, Aécio tem mais do que o dobro de confiança do eleitor. Agora é transformar preparação em votos.

AÉCIO CONTINUA UM ILUSTRE DESCONHECIDO PARA 1 ENTRE 4 ELEITORES.


 
Um dos dados mais importantes da pesquisa Datafolha publicada hoje está na tabela acima. Na margem de erro, 1 a cada 4 brasileiros não conhecem Aécio Neves. Mas apenas 1 em cada 100 brasileiros não conhece Dilma.
Em 2010, quando Dilma foi eleita, 10% não a conheciam. Mantendo-se esta média, no mínimo 15% dos brasileiros ainda conhecerão Aécio Neves. É um potencial imenso de votos que se abre para o tucano.
Um número que pode fazer Aécio liderar a eleição ainda no primeiro turno.
 
09 de maio de 2014
in coroneLeaks

ESCÂNDALO DA PETROBRAS: O "INTERESSE TODO" DA CPI


 


Primeiro, a presidente Dilma Rousseff encabeçou uma metafórica passeata em direção ao Congresso Nacional, puxando o coro "Não vai ter CPI". Não tardou, porém, a ficar claro que o presidente do Senado, Renan Calheiros, em que pese ter exacerbado a sua condição de leguleio a serviço do governo, não conseguiria impedir a minoria oposicionista da Casa de exercer o seu inquestionável direito de investigar os presumíveis malfeitos da Petrobrás, a começar do desastroso negócio da Refinaria de Pasadena.

Quando a ficha caiu no Planalto, a palavra de ordem mudou para "Vamos melar a CPI". Tornou a dar errado. A jogada faltosa de incluir no inquérito os indícios de formação de cartel em contratos do Metrô de São Paulo, em gestões tucanas, e do Distrito Federal, administrado à época pelo DEM, para reduzir tudo a uma geleia geral, recebeu o merecido cartão vermelho da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Diante disso, o lema passou a ser "Vai ter CPI só no Senado". Se tivesse começado por aí, Dilma talvez conseguiria neutralizar a iniciativa oposicionista, surgida da nota ao Estado na qual confessou que, no comando do Conselho de Administração da Petrobrás, aprovou em 2006 a compra de metade da instalação texana com base apenas em um resumo "técnica e juridicamente falho". Afinal, a maioria aliada controlaria os cargos decisivos, o ritmo e o rumo das apurações para esvaziá-las — com o País de olhos postos na Copa.

No entanto, já não bastassem os seus reflexos retardados, o governo subestimou a determinação dos adversários em transformar a investigação que seria manietada no Senado numa outra, com a mesma pauta, mas incluindo a Câmara — a CPI mista, ou CPMI. Resta a Renan, o aliado-mor de Dilma no Congresso, esmerar-se em protelar cada fase do processo. E só agora, provando que a sua incompetência não se limita à economia, o Planalto correu a emplacar a sua própria CPMI, a do cartel do Metrô paulistano.

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É um ganho tático, mas não alivia a situação da presidente. Nos 50 dias a contar do seu chamado "sincericídio", ela não conseguiu se livrar das dúvidas e suspeitas sobre a sua responsabilidade pessoal no multimilionário mico de Pasadena.
E quanto mais ela fala disso, mais parece se enredar. No jantar da terça-feira com uma dezena de jornalistas mulheres, ela afirmou não ter "temor nenhum" da CPI da Petrobrás, quando até o piso do Alvorada há de saber do seu empenho em abortá-la.
Sem querer, disse uma verdade inconveniente com a frase "O interesse todo nessa história sou eu".

É, sim. Mas isso se deve — eleições à parte — às versões contraditórias sobre o que ela sabia dos termos da malfadada aquisição da refinaria. Dito de outro modo, se é fato que Dilma lhe deu o sinal verde amparada apenas em um texto de página e meia — que omitia as duas cláusulas das quais diria que se as conhecesse teria barrado o negócio —, ela deveria ter sustado a decisão até o recebimento de informações mais substantivas.
Não o tendo feito, foi irresponsável. Dias depois de sua nota, o ex-presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, retrucou que o Conselho tinha acesso a toda a documentação a respeito.

Mais indigesto, para Dilma, foi o depoimento — na mesma linha — do ex-diretor internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró, à comissão criada na empresa para apurar o caso. Autor do resumo criticado pela presidente, ele foi demitido em março da diretoria da BR Distribuidora para a qual havia sido transferido em consequência do affair Pasadena.
Conforme revelou O Globo na quarta-feira, Cerveró disse que, de fato, o seu texto não mencionava as cláusulas porque a principal delas, a Put Option, que obrigou a estatal a ficar com a refinaria inteira, constava do parecer jurídico encaminhado ao Conselho a tempo e a hora – assim como, entre outros documentos, a íntegra do contrato com os donos da refinaria.

Pode ser, numa hipótese caridosa, que a secretaria do colegiado não tenha distribuído a papelada aos seus membros. Mas, nesse caso, volta-se ao ponto de partida: Dilma não poderia ter autorizado a fatídica votação que atolou a Petrobrás em Pasadena. Só isso já justificaria o "interesse todo nessa história".

09 de maio de 2014
Editorial do Estadão

FERRO NA PETRALHADA IMUNDA

Ministro do Supremo diz que País vive ‘apagão de gestão’ e que escândalos da Petrobrás causam constrangimento

Em São Paulo, Gilmar Mendes condena ‘dimensão e repetição’ de denúncias envolvendo a estatal petrolífera
 


O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse nesta segunda feira em São Paulo que o País vive “um apagão de gestão” e que a sucessão de escândalos na Petrobrás o constrange.
“Pela dimensão e repetição os escândalos realmente constrangem”, declarou o ministro.
“Basta saber qual é o próximo (escândalo), isso é sem dúvida muito sério”, alertou Gilmar Mendes. “Temos graves problemas aqui (na Petrobrás), são repetidos os casos de corrupção, muitos deles associados à questão política, a campanhas.”

A estatal petrolífera brasileira está no centro de uma crise sem precedentes desde que seu  ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, foi preso pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Costa é acusado de lavagem de dinheiro a partir de crimes contra a administração pública, corrupção e peculato.

“É preciso que se dê a atenção devida (aos escândalos na Petrobrás)”, prosseguiu Mendes. “Temos um aparato de repressão que vem se mostrando pelo menos ativo, senão eficaz, mas os escândalos realmente constrangem. Pela dimensão e pela repetição. Era a grande empresa brasileira. E há pouco tivemos o caso do Mensalão com referências a uma outra grande empresa brasileira, o Banco do Brasil, envolvido nesse episódio lamentável.”

Ao comentar a onda de violência que se espalha pelo País, Gilmar Mendes alertou para o que chama de “grave crise de gestão”.

“Quero dizer que nós estamos vivendo um momento de apagão de gestão. Precisamos pensar claramente: que tipo de legado estamos deixando para os nossos filhos? Quanto piorou a gestão pública no Brasil? É um quadro de anomia muito preocupante e má qualidade dos serviços prestados. As demandas que são formuladas não são atendidas minimamente. Isso é muito sério.”

Para o ministro, o quadro de “má gestão” afeta também a segurança pública. “Temos um déficit enorme no que concerne à segurança pública. Isso é notório. Basta ver o tema que está na agenda hoje, a má gestão dos presídios, todos esses problemas que se acumularam ao longo dos anos que é uma parte do tema Segurança Pública.
Tomamos medidas importantes no que diz respeito à ocupação dos morros no Rio, as UPPs, mas com grandes déficits. A União tem que participar mais ativamente do tema da segurança pública. É preciso que isso entre na própria agenda da disputa presidencial.
O cidadão perdeu a liberdade, o cidadão normal é um prisioneiro porque ele não pode sair à rua nas nossas grandes cidades.”
Para o ministro, “juntamente com a Educação e a Saúde, a Segurança Pública certamente é tema prioritário”.
  
“A gente não percebe, a não ser medidas paliativas propostas com forte caráter simbólico, a gente não percebe articulação de medidas que possam afetar de fato esse quadro de insegurança pública ao qual estamos submetidos.”

O ministro do Supremo atribui negligência aos órgãos públicos ante os ataques de vândalos em manifestações de rua. “Temos muitos conflitos que têm sido talvez negligenciados e que precisam merecer a devida atenção de todos os segmentos incumbidos de regular, de aplicar a lei, os setores investidos de poder público, de poder estatal.”

Gilmar Mendes advertiu para a forte carga tributária imposta ao contribuinte, sem contrapartida do poder público. “É notório que o País tem hoje uma cobrança, uma participação financeira por parte do cidadão que é bastante elevada, a tributação, a carga é muito elevada. E os serviços que são devolvidos são precários. Então, nós temos tributos em padrão da Suécia e serviços de alguns países africanos. É preciso que a gente perceba que nós estamos vivendo um quadro realmente de má gestão. Eu fico um pouco envergonhado quando eu vejo essa situação generalizada de má prestação dos serviços.”

09 de maio de 2014
Estadão online

NADA COMO UMA VAIA DEPOIS DE OUTRA PARA ABALAR A FÉ DOS DEVOTOS, EMUDECER O CHEFE DA SEITA E TIRAR O SONO DA GUARDIÃ DO REBANHO


Nada como uma vaia depois da outra para embaralhar a partitura da ópera dos malandros, desafinar o coro dos contentes, tirar o sono dos sacerdotes da seita, emudecer o seu único deus, escancarar a indigência mental da guardiã do rebanho, abalar a fé do mais fanático devoto, induzir convertidos de aluguel a flertar com outros altares. Nada como uma vaia depois da outra para assombrar as madrugadas de quem até outro dia dormia contando votos da vitória no primeiro turno e acordava sonhando com a proclamação da república bolivariana.

As manifestações de rua de 2013 implodiram a farsa do Brasil Maravilha, mas os alvos dos protestos não foram identificados tão claramente quanto neste outono. Os destinatários das mensagens sonoras agora têm nome, sobrenome, endereço e filiação partidária. Cresce em progressão geométrica a imensidão de brasileiros que enxergam as coisas como as coisas são. Milhões de lesados descobriram que o bando acampado no coração do poder foi longe demais até para os padrões do País do Carnaval. E exigem mudanças imediatas.

Todos constataram que o governo lulopetista recruta e acoberta corruptos. Que a roubalheira impune agora é medida em bilhões de dólares. Que os ineptos e os larápios se associaram para enterrar em estádios padrão Fifa o dinheiro que poderia abrandar pavorosas carências no universo da saúde e da educação. Que as promessas não descem dos palanques. Constataram, enfim, que lidam há 12 anos com vendedores de nuvens e camelôs de si próprios.

Alheio às alterações na paisagem, o marqueteiro João Santana imaginou, depois de consumir uma semana na releitura de pesquisas recentes, que a curva descendente da candidata à reeleição seria invertida por outro comício eletrônico transmitido em cadeia nacional. Péssima ideia: a discurseira na véspera do Dia do Trabalho só serviu para comprovar que as cartas na manga acabaram, que as mágicas de picadeiro perderam o encanto e que truques outrora infalíveis ficaram subitamente grisalhos.

Habituada a conjugar impunemente os três verbos preferidos de Lula — mentir, tapear, distorcer —, Dilma soube tarde demais que o senador Aécio Neves e o ex-governador Eduardo Campos não deixariam nenhum embuste sem revide, nenhuma invencionice sem réplica. Dispostos a provar que a oposição voltou de vez das férias, os candidatos do PSDB e do PSB à sucessão presidencial assumiram o papel de porta-vozes dos descontentes.

Dilma garantiu, por exemplo, que “a inflação continuará rigorosamente sob controle”. Ouviu que não se pode continuar o que não começou. Ao “reafirmar o compromisso do governo com o combate incessante e implacável à corrupção”, foi convidada a suspender a guerra de extermínio movida contra quem se atreve a investigar patifarias bilionárias consumadas nas catacumbas da Petrobras. E a tentativa de responsabilizar a oposição pelos estragos na imagem da estatal soou como anedota improvisada por patriotas de galinheiro.



“Os brasileiros não aceitam mais a hipocrisia”, recitou no fim do comício. Não aceitam mesmo, reiteraram as comemorações do Primeiro de Maio em São Paulo. Pela primeira vez desde a fundação do PT em 1980, figurões do Partido dos Trabalhadores foram impedidos de discursar no Dia do Trabalho.
O ministro Ricardo Berzoini e o prefeito Fernando Haddad, por exemplo, não conseguiram abrir a boca sequer no palanque da CUT, controlada desde sempre por pelegos companheiros. Lula e Dilma nem deram as caras por lá. Na tarde seguinte, obrigada a visitar a Expozebu, a presidente reencontrou em Uberaba — três vezes — as vaias das quais escapara na véspera.

Nas primeiras 72 horas de maio, João Santana aprendeu, entre outras lições sempre úteis, que o país que não é para amadores também trata sem clemência adivinhos de botequim. Confrontado com a epidemia de apupos (e com mais uma pesquisa atulhada de más notícias para o Planalto), ele certamente se lembrou da entrevista, concedida em dezembro de 2010, em meio à qual resolveu restaurar a monarquia, transformar o gabinete presidencial em sala do trono e coroar Dilma Rousseff.
“Como se trata de uma figura única, que uma nação precisa de séculos pra construir, a ausência de Lula deixa uma espécie de vazio oceânico”, ressalvou o marqueteiro do reino. Apesar disso, ou por isso mesmo, Dilma tinha tudo para transformar-se na herdeira que todo súdito pede a Deus.
“A República brasileira não produziu uma única grande figura feminina, nem mesmo conjugal”, ensinou Santana. “O espaço metafórico da cadeira da rainha só foi parcialmente ocupado pela princesa Isabel. Dilma tem tudo para ocupar esse espaço”.

Em novembro de 2012, festejou o acerto da profecia. “Foi uma metáfora que está se cumprindo simbolicamente”, cumprimentou-se o imaginoso publicitário baiano. “Grandes camadas da população têm um respeito, uma admiração e um carinho tão sutil por Dilma que chega até a ser de uma forma majestática”. Os fatos já aposentaram faz tempo o professor de história e o vidente. O marqueteiro só sobreviverá se esquecer os escombros do trono e concentrar-se nas rachaduras do palanque.
Mas vai perder seu tempo se ceder à tentação de descobrir a cura da vaia. E acabará perdendo o emprego.

09 de maio de 2014
Augusto Nunes

A QUE PONTO CHEGAMOS!

Eu, como boa parte dos leitores de jornal, nem aguento mais ler as notícias que entremeiam política com corrupção. É um sem-fim de escândalos. Algumas vezes, mesmo sem que haja indícios firmes, os nomes dos políticos aparecem enlameados. Pior, de tantos casos com provas veementes de envolvimento em "malfeitos", basta citar alguém para que o leitor se convença de imediato de sua culpabilidade. A sociedade já não tem mais dúvidas: se há fumaça, há fogo.
 
Não escrevo isso para negar responsabilidade de alguém especificamente, nem muito menos para amenizar eventuais culpas dos que se envolveram em escândalos, nem tampouco para desacreditar de antemão as denúncias. Os escândalos jorram em abundância, não dá para tapar o sol com peneira.
O da Petrobrás é o mais simbólico, dado o apreço que todos temos pelo que a companhia fez para o Brasil. Escrevo porque os escândalos que vêm aparecendo numa onda crescente são sintomas de algo mais grave: é o próprio sistema político atual que está em causa, notadamente suas práticas eleitorais e partidárias.
Nenhum governo pode funcionar na normalidade quando atado a um sistema político que permitiu a criação de mais de 30 partidos, dos quais 20 e poucos com assento no Congresso.
A criação pelo governo atual de 39 ministérios para atender às demandas dos partidos é prova disso e, ao mesmo tempo, é garantia de insucesso administrativo e da conivência com práticas de corrupção, apesar da resistência a essas práticas por alguns membros do governo.
 
Não quero atirar a primeira pedra, mesmo porque muitas já foram lançadas. Não é de hoje que as coisas funcionam dessa maneira. Mas a contaminação da vida político-administrativa foi-se agravando até chegarmos ao ponto a que chegamos.
Se, no passado, nosso sistema de governo foi chamado de "presidencialismo de coalizão", agora ele é apenas um "presidencialismo de cooptação". Eu nunca entendi a razão pela qual o governo Lula fez questão de formar uma maioria tão grande e pagou o preço do mensalão. Ou melhor, posso entendê-la: é porque o PT tem vocação de hegemonia.
 
Não vê a política como um jogo de diversidade no qual as maiorias se compõem para fins específicos, mas sem a pretensão de absorver a vida política nacional sob um comando centralizado.
Meu próprio governo precisou formar maiorias. Mas havia um objetivo político claro: precisávamos de três quintos da Câmara e do Senado para aprovar reformas constitucionais necessárias à modernização do País.
Ora, os governos que me sucederam não reformaram nada nem precisaram de tal maioria para aprovar emendas constitucionais. Deixaram-se levar pela dinâmica dos interesses partidários. Não só do partido hegemônico no governo, o PT, nem dos maiores, como o PMDB, mas de qualquer agregação de 20, 30 ou 40 parlamentares, às vezes menos, que, para participar da "base de apoio", se organizam numa sigla e pleiteiam participação no governo: um ministério, se possível; senão, uma diretoria de empresa estatal ou uma repartição pública importante. Daí serem precisos 39 ministérios para dar cabida a tantos aderentes. No México do PRI dizia-se que fora do orçamento não havia salvação…
 
A raiz desse sistema se encontra nas regras eleitorais que levam os partidos a apresentarem uma lista enorme de candidatos em cada Estado para, nelas, o eleitor escolher seu preferido, sem saber bem quem são ou que significado político-partidário têm. Logo depois nem se lembra em quem votou.
A isso se acrescenta a liberalidade de nossa Constituição, que assegura ampla liberdade para a formação de partidos. Por isso, não se podem obter melhorias nessas regras por intermédio da legislação ordinária. Algumas dessas melhorias foram aprovadas pelos parlamentares. Por exemplo, a exigência de uma proporção mínima de votos em certo número de Estados para a autorização do funcionamento dos partidos no Congresso. Ou a proibição de coligações nas eleições proporcionais, por meio das quais se elegem deputados de um partido coligado aproveitando a sobra de votos de outro partido. Ambas foram recusadas por inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal.
 
Com o número absurdo de partidos (a maior parte deles meras siglas sem programa, organização ou militância), forma-se, a cada eleição, uma colcha de retalhos no Congresso, em que mesmo os maiores partidos não têm mais do que um pedaço pequeno da representação total. Até a segunda eleição de Lula, os presidentes se elegiam apoiados numa coalizão de partidos e logo tinham de ampliá-la para ter a maioria no Congresso. De lá para cá, a coalizão eleitoral passou a assegurar maioria parlamentar. Mas, por vocação do PT à hegemonia, o sistema degenerou no que chamo de "presidencialismo de cooptação". E deu no que deu: um festival de incoerências políticas e portas abertas à cumplicidade diante da corrupção.
 
Mudar o sistema atual é uma responsabilidade coletiva. Repito o que disse, em outra oportunidade, a todos os que exerceram ou exercem a Presidência: por que não assumimos nossas responsabilidades, por mais diversa que tenha sido nossa parcela individual no processo que nos levou a tal situação, e nos propomos a fazer conjuntamente o que nossos partidos, por suas impossibilidades e por seus interesses, não querem fazer — mudar o sistema? Sei que se trata de um grito um tanto ingênuo, pedir grandeza. A visão de curto prazo encolhe o horizonte para o hoje e deixa o amanhã distante. Ainda assim, sem um pouco de quixotismo, nada muda.
 
Se, de fato, queremos sair do lodaçal que afoga a política e conservar a democracia que tanto custou ao povo conquistar, vamos esperar que uma crise maior destrua a crença em tudo e a mudança seja feita não pelo consenso democrático, mas pela vontade férrea de algum salvador da Pátria?

09 de maio de 2014
Fernando Henrique Cardoso é sociólogo e foi presidente da República.

PASADENA DESMENTE DILMA





Em dado momento da sua fala de ostensivo tom eleitoral em rede de rádio e de TV, na véspera do Dia do Trabalho, a presidente Dilma Rousseff apregoou o seu empenho no combate à corrupção. "O que pode envergonhar um país não é apurar, investigar e mostrar." (…) "É varrer tudo para baixo do tapete." Até aí tudo bem: ela precisa mesmo polir a lembrança da "faxina ética" do começo de seu mandato. O curioso é que se alongou no assunto apenas para chamar à cena a Petrobrás, que "jamais vai se confundir com atos de corrupção ou ação indevida de qualquer pessoa".

A estatal foi empurrada para o noticiário pela confissão da própria Dilma, em março último, de que, na presidência do Conselho de Administração da empresa, aprovou em 2006 a sua associação a um grupo belga na Refinaria de Pasadena com base em nada mais do que um breve parecer. Dois anos depois, viria a descobrir que o texto era "técnica e juridicamente falho". Como se tornou amplamente sabido, a petroleira acabou enterrando na destilaria US$ 1,24 bilhão, com prejuízo contabilizado de US$ 530 milhões. Em 2012, o Estado havia trazido à tona as linhas gerais da transação.

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O Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União abriram investigações sobre o caso — os primeiros focalizando eventual superfaturamento e evasão de divisas, o último voltado para possível negligência e gestão temerária na condução do negócio. Ou seja, "atos de corrupção ou ação indevida", como afirmou Dilma no seu pronunciamento. Mas Pasadena desmente as suas palavras. A presidente não só não tomou nenhuma iniciativa em sua alçada para deslindar o imbróglio e "lutar para que todos os culpados sejam punidos com rigor", como alardeou na TV sobre corrupção em geral, mas luta ainda, isso sim, contra a CPI da Petrobrás.

Só que ela está perdendo a batalha. A Justiça degolou a manobra governista de diluir o inquérito sobre Pasadena e a gastança nas obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, proposto pela oposição, misturando-os a escândalos tucanos em São Paulo. Fracassou também a tentativa petista de impedir que os deputados participem da investigação surgida no Senado, onde o Planalto tem folgada maioria para mantê-la sob controle. Sob forte pressão do presidente da Câmara, Henrique Alves — e ameaças de retaliação —, o presidente do Senado, Renan Calheiros, que vinha jogando em parceria com Dilma, concordou com a ideia de acrescentar uma CPI mista à original.

A presidente alega que o intento da oposição é armar um circo para desestabilizá-la e usar contra ela, na campanha eleitoral, os eventuais percalços da Petrobrás. Ainda que fosse verdade, ela não pode se desvencilhar pessoalmente do bilionário fiasco de Pasadena. Primeiro, porque, se tudo o que estava a seu alcance a respeito do contrato que dependia do aval do Conselho da empresa era um resumo de página e meia, ela deveria ter exigido mais informações antes de se comprometer com um investimento daquela envergadura. Em segundo lugar, como apontou a representação do Ministério Público no Tribunal de Contas, Dilma tornou a errar em detrimento da Petrobrás.

De fato, em 2008, ela vetou a compra da metade da refinaria ainda em posse dos belgas, como exigiam com base numa das cláusulas que o resumo omitira e que só então Dilma veio a conhecer. Ao desacatar o "direito líquido e certo" da associada, dizem os procuradores, ela arrastou a estatal a um litígio que terminou com a Justiça americana dando razão à recorrente, o que obrigou a petroleira a gastar em despesas legais US$ 173 milhões, que de outro modo teriam ficado nos seus cofres. Por fim, pesa contra a presidente o affair Nestor Cerveró, o autor do parecer cujas falhas ela viria a invocar. O diretor internacional foi então transferido para a BR Distribuidora. Demitido, só há pouco, seis anos depois.

Em audiência na Câmara dos Deputados, na última quarta-feira, a presidente da Petrobrás, Graça Foster, responsabilizou o Conselho — Dilma Rousseff, em última análise — pela permanência de Cerveró no grupo. Bem que o antecessor de Graça, José Sérgio Gabrielli, disse que a presidente "não pode fugir da responsabilidade dela". É disso que se trata.

09 de maio de 2014
Editorial do Estadão

ROUBALHEIRA PETRALHA

As novas evidências de corrupção e caixa dois num contrato da Petrobras com a Odebrecht

Um caso exemplar de como a política manda na estatal
 

ATROPELO A refinaria de Pasadena, no Texas. Uma auditoria diz que a Petrobras desrespeitou a regra para fazer serviços na unidade


Há cerca de dois anos, a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, convocou os principais executivos da estatal para uma reunião. Graça Foster, como é conhecida, assumira o cargo havia poucos meses, mas já queria exigir resultados. Como ocorrera com alguns dos subordinados de Dilma Rousseff, ela assimilara rapidamente o estilo da presidente: gritar primeiro e cobrar depois.

O clima naquela reunião, como em tantas outras, era tenso. Internamente, a Petrobras já vivia tempos difíceis. Gastava demais para produzir — e vender — petróleo de menos. O motor da Petrobras engasgava porque ela rodava, desde o começo do governo Lula, com gasolina de má qualidade, batizada com política excessiva. Política na escolha de quem comandaria a empresa (subiu quem fosse mais amigo do PT e do PMDB) e na escolha por gastar muito em múltiplos e simultâneos contratos caríssimos (subiram as empresas amigas dos amigos do PT e do PMDB).

Naquela reunião, Graça Foster cobrava resultados. Quem deveria ser cobrado já deixara a Petrobras. Não estavam na reunião sindicalistas do PT, como José Sérgio Gabrielli, a quem Graça Foster sucedera, e executivos suspeitos de corrupção, como Paulo Roberto Costa, sustentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por um consórcio entre PT, PMDB e PP. Dilma conseguira derrubar Paulo Roberto da Diretoria de Abastecimento logo após Graça Foster virar presidente da Petrobras, mas não conseguira evitar que o número dois de Paulo Roberto, José Carlos Cosenza, assumisse o posto do antigo chefe. Cosenza fora escolhido pelo PMDB do Senado. Abaixo de Cosenza, mantinham-se apaniguados do PMDB. Nenhum era mais poderoso que outro José, de sobrenome Pereira, à frente da gerência responsável por compras e vendas milionárias (sem licitação) de produtos derivados de petróleo. Pereira era mantido no cargo por indicação pessoal do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, do PMDB.

Pereira estava na reunião. E ouviu muito. “Se você pensa que se manterá no cargo só porque foi indicado pelo Lobão, está enganado”, disse Graça Foster, segundo relatos de quem estava lá. Pereira ficou furioso. “Se a senhora pensa que é presidente da Petrobras porque é a melhor engenheira da empresa, está enganada”, disse, segundo os mesmos relatos. “A senhora está presidente porque sua indicação política é melhor do que a minha.” Graça Foster respondeu com “impropérios”, nas palavras de quem assistiu à cena. Pereira levantou-se e deixou a sala. Numa demonstração do peso que a política tem nas decisões tomadas — e nas que deixam de ser tomadas — na Petrobras, Graça Foster não conseguiu demitir Pereira. Ele permaneceu mais dois anos no cargo. Foi demitido apenas há três semanas, no dia em que a Polícia Federal entrou, com ordem judicial, na sede da Petrobras, em busca de provas do esquema de corrupção liderado por Paulo Roberto.

Segundo documentos obtidos pela PF na casa de Paulo Roberto, a que ÉPOCA teve acesso, como a agenda dele (leia abaixo), Cosenza continuava a se encontrar periodicamente com o ex-chefe. Despachavam sobre os assuntos discutidos na cúpula da estatal. Os documentos, como e-mails e planilhas, mostram que, mesmo fora da Petrobras, Paulo Roberto continuou seu esquema na Diretoria de Abastecimento. Ajudava a fechar e a prorrogar contratos de quem pagava a ele por isso. Quem o ajudava a mover a caneta dentro da Petrobras? A PF investiga.

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Na Petrobras, como em qualquer estatal, a caneta só se move por fortes razões — normalmente, por pressão ou ordem de quem indicou aquele que pode mover a caneta. Nos casos de corrupção descobertos nos últimos meses, pesam suspeitas graves contra seis empreiteiras e outras seis multinacionais, além de políticos do PT, do PMDB e do PP.

A maioria das evidências está no inquérito aberto para investigar a “organização criminosa”, como define o Ministério Público, liderada por Paulo Roberto e pelo doleiro Alberto Youssef.
Um contrato da Petrobras em especial (leia abaixo), investigado pela PF e pelo MPF em outra frente, assusta os políticos, ainda mais na iminência da criação de uma CPI no Congresso para apurar os desvios na Petrobras. O negócio, de US$ 826 milhões, foi fechado em outubro de 2010, durante o segundo turno das eleições presidenciais, entre a Petrobras, maior empresa do Brasil, e a Odebrecht, maior empreiteira do Brasil. Para quê? Serviços de segurança, meio ambiente e saúde em unidades da Petrobras no Brasil e no exterior — um conjunto de providências que, no mundo empresarial, leva a sigla SMS.

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Em agosto do ano passado, o lobista João Augusto Henriques, responsável, no PMDB, por fazer a caneta da Diretoria Internacional da Petrobras se mexer, afirmou a ÉPOCA que montara essa operação. Disse que, para que a caneta do PT de Gabrielli se mexesse e aprovasse o contrato, foi preciso acertar uma doação equivalente a US$ 8 milhões à campanha de Dilma Rousseff.

“Odebrecht? Eu montei tudo”, disse João Augusto. “A Odebrecht tinha de ganhar. Foi até ideia minha. Pelo tamanho dela. Pelo padrão”. Ele afirmou que acertou a doação com o tesoureiro informal do PT, João Vaccari. Segundo João Augusto, tudo começou no segundo semestre de 2009. Funcionava no Senado a CPI da Petrobras. Era uma CPI fajuta, que quase nada investigou. Pelo acordo revelado por João Augusto e confirmado a ÉPOCA por mais dois envolvidos na operação, o PMDB ajudaria a enterrar a CPI, relatada pelo senador Romero Jucá. Em troca, a direção da Petrobras, então comandada por Gabrielli, assinaria embaixo do projeto Odebrecht. Houve dificuldades, mas assim foi feito.

Em janeiro de 2012, pouco antes da intervenção branca de Dilma na Petrobras e da posse de Graça Foster, auditores encontraram irregularidades graves no contrato de US$ 826 milhões. ÉPOCA obteve acesso à auditoria. Era um trabalho preliminar, mas minucioso, que nunca veio a público. Nele, os auditores são contundentes nas ressalvas à operação. Alertam que o negócio com a Odebrecht fora ruim — e dizem que o contrato deveria ser rescindido (leia documentos e detalhes acima). “A estratégia de contratação para implantação da carteira (SMS) da ANI (Área de Negócios Internacional) se mostrou prejudicial aos interesses da Petrobras”, afirmaram os auditores. “Sob tais circunstâncias, o processo licitatório deveria ter sido interrompido”, afirmou Marise Feitoza, gerente de Auditorias Especiais.

Os auditores entenderam que a contratação fora equivocada, por causa do perfil das empresas convidadas e pelo prazo reduzido para apresentação de propostas. A Petrobras convidou formalmente outras empreiteiras: quatro no Brasil e quatro no exterior. Algumas não tinham nada a ver com esse tipo de serviço. Todas declinaram. Sobrou para a Odebrecht. A auditoria preliminar apontava numerosas irregularidades no contrato. Entre elas: a diretoria executiva da Petrobras determinara que os serviços relativos às refinarias de Pasadena, nos Estados Unidos, Bahía Blanca, na Argentina, e Okinawa, no Japão, deveriam ser submetidos a autorização específica antes de ser feitos. No caso de Pasadena, isso significou um aditivo de US$ 20,3 milhões ao contrato. Os auditores não encontraram evidência de que isso tenha sido respeitado. A fiscalização concluiu que a Odebrecht usou uma artimanha comum: atribuir preços elevados a serviços que fatalmente serão feitos em maior quantidade na execução do contrato. É uma prática conhecida como “jogo de planilha”. Aumenta o lucro da empresa contratada. E dá prejuízo a quem contrata.

O relatório causou pânico na cúpula da Petrobras e fúria na Odebrecht. De acordo com técnicos da estatal, Graça Foster e sua equipe pretendiam seguir a orientação da auditoria e anular o contrato. Ao saber disso, João Augusto e o PMDB agiram. Segundo o relato de João Augusto, o presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, procurou Graça Foster para impedir a anulação do contrato. Ele mencionou, segundo João Augusto e outro lobista envolvido no negócio, as “contribuições políticas” decorrentes do contrato. Após a pressão da Odebrecht e dos lobistas envolvidos, fez-se uma nova versão da auditoria. Ela não falava em anular o contrato e usava linguagem mais leve. Era uma solução intermediária. Em janeiro de 2013, decorridos pouco mais de dois anos da contratação, a Petrobras anunciou a redução do contrato: de US$ 826 milhões, para US$ 480 milhões. Como justificativa, a direção disse que o contrato precisava “refletir o portfólio atualizado de ativos e necessidades de serviços de controladas no exterior”.

ÉPOCA localizou a auditora Marise Feitoza, que trabalhou nas duas versões da auditoria. Ela disse não se lembrar da primeira e mais pesada versão. “Em nossa rotina, a gente sempre emite os primeiros comentários e envia a quem foi auditado, para que possa fazer seus comentários sobre o que foi levantado. A partir de ajustes e acertos, às vezes alguém pode apresentar novos dados para a gente, pode ter errado em alguma análise. Todo auditor trabalha assim”, disse.

Investigações independentes da PF, do MPF e de uma cada vez mais inevitável CPI são fundamentais em casos como este e também em outros. É o caso de outro contrato fechado por Paulo Roberto, com a petroquímica Unipar, em 2008. A Petrobras se uniu à Unipar, para criar a maior empresa do setor, chamada Quattor. “A parceria entre a Petrobras e o grupo Unipar não poderia ser mais auspiciosa”, disse Paulo Roberto, ao assinar o contrato. A sociedade foi criticada dentro da Petrobras e por executivos independentes. Segundo essas críticas, a Unipar pagou muito pouco (R$ 380 milhões) para entrar na sociedade, ainda por cima tendo controle sobre ela.

No começo de 2009, a “auspiciosa” parceria rendeu propina ao esquema de Paulo Roberto e Youssef, segundo suspeita a PF. Um relatório do Conselho de Controle das Atividades Financeiras, o Coaf, obtido por ÉPOCA no inquérito da Lava Jato, revela que a Unipar depositou R$ 466 mil na conta de uma das empresas de fachada de Youssef — a mesma que recebia depósitos de propina das empreiteiras com contratos na Petrobras (leia acima). Pelo relativo baixo valor do pagamento em relação ao total do negócio, a PF suspeita que obtiveram apenas um retrato de uma relação financeira mais estável, que envolveu outros pagamentos. Agora, a PF tenta rastrear outras transações da Unipar com Youssef.

O ministro Edison Lobão afirma, por meio de sua assessoria de imprensa, que conhece o ex-gerente José Raimundo Pereira. De acordo com a nota, Pereira chegou ao cargo de gerente executivo de Marketing e Comercialização “por decisão da direção da empresa” e “contou com o apoio”.

Procurado, Pereira não retornou os recados deixados por ÉPOCA. O empresário Frank Geyer e a Unipar informaram, por intermédio da assessoria de imprensa, que não se manifestariam. A Petrobras não respondeu até o fechamento desta edição. ÉPOCA não conseguiu localizar João Vaccari e o senador Romero Jucá. No ano passado, por meio da assessoria do PT, Vaccari afirmou não ter sido responsável pela tesouraria da campanha da presidente Dilma Rousseff em 2010 e que as doações recebidas foram todas legais. Jucá negou ter conversado com João Augusto ou ter barganhado o contrato da Odebrecht pelo fim da CPI da Petrobras, em 2009.

Em nota, a Odebrecht afirma: “A Odebrecht nega veementemente a existência de qualquer irregularidade nos contratos firmados com a Petrobras, conquistados legitimamente por meio de concorrências públicas. Esclareça-se que a redução no valor do mencionado contrato para a execução de serviços em instalações da Petrobras fora do Brasil foi única e exclusivamente consequência da diminuição do escopo deste contrato. Em decorrência do plano de desinvestimentos da Petrobras no exterior, a prestação dos serviços elencados no contrato, originalmente prevista para ocorrer em nove países, foi reduzida para quatro. A Odebrecht desconhece questionamentos feitos em auditoria interna da Petrobras e as conclusões dessa mesma auditoria. A empresa está à disposição de qualquer órgão de fiscalização para fornecer informações sobre o mencionado contrato, cujas obras previstas já foram concluídas e entregues.”

Na Petrobras, as canetas sempre se movem na direção certa. Após pagar pouco para virar sócia da Petrobras, a Unipar ganhou muito para sair da sociedade. Em 2010, a Petrobras uniu os ativos dela aos de uma outra empresa para formar uma petroquímica ainda maior, a Braskem. Essa outra empresa era a Odebrecht.
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09 de maio de 2014
ÉPOCA Online
DIEGO ESCOSTEGUY E MARCELO ROCHA. COM LEANDRO LOYOLA

MACHADO DE ITARARÉ, BARÃO DE ASSIS

A vida do Bruxo do Cosme Velho, como o chamou Carlos Drummond de Andrade, não foi fácil, mas, se ele vivesse no Brasil de hoje, seria ainda pior

Quando junho vier, antes de outubro chegar, milhões de leitores serão enganados por um falso Machado de Assis.

É que serão distribuídos seiscentos mil exemplares (600.000; você não leu errado!) de uma edição falsificada de “O alienista”, uma história de loucos, isto é, de médico e louco, dos quais todos nós temos um pouco, mas não na dose a ser administrada ao distinto público nas próximas semanas.

Machado de Assis foi o maior escritor brasileiro de todos os tempos. De seu livro roubado e mutilado foi produzida essa montanha de equívocos, com o seu, o meu, o nosso dinheiro, por meio de um recurso fabuloso, a renúncia fiscal, que, entretanto, tem resultado em projetos culturais tão louváveis, bonitos e importantes! Mas que vem se prestando também a algumas falcatruas.

A vida do Bruxo do Cosme Velho, como o chamou Carlos Drummond de Andrade, não foi fácil, mas, se ele vivesse no Brasil de hoje, seria ainda pior. Poucos entendem seus livros nos circuitos escolares, e a razão é muito simples. Basta olhar nossos indicadores de educação no mundo!

Mas o motivo é outro, segundo nos esclarece Patrícia Secco, a autora da “adaptação”.

“De onde menos se espera, daí é que não sai nada”, profetizou o lendário humorista gaúcho Barão de Itararé. “Entendo por que os jovens não gostam de Machado de Assis”, disse Patrícia Secco ao jornalista Chico Felitti. “Os livros dele têm cinco ou seis palavras que não entendem por frase. As construções são muito longas. Eu simplifico isso.”

Escreve o jornalista: “Ela simplifica mesmo: Patrícia lançará em junho uma versão de ‘O alienista’, obra de Machado lançada em 1882, em que as frases estão mais diretas e palavras são trocadas por sinônimos mais comuns (um ‘sagacidade’ virou ‘esperteza’, por exemplo).” (...) “A ideia não é mudar o que ele disse, só tornar mais fácil.”

Machado era órfão de mãe (de pai é uma coisa, de mãe é outra, o abandono é ainda maior!), descendente de negros, pobre, gago, epiléptico, casou com uma solteirona portuguesa que tinha comido a merenda antes do recreio, e não tiveram filhos para não transmitir a ninguém o legado da doença. Mas deixou-nos uma obra imortal!

Mais que gênio, oxigênio de nossas letras, Machado venceu preconceitos de raça, de cor, de dinheiro, de tudo. Mas não passou pela senhora dona Patrícia Secco, em breve “coberta de ouro e prata (600.000 exemplares!)”, mas que “descubra seu rosto”, “queremos ver a sua cara”.

Augusto Meyer disse que “quase toda a obra de Machado de Assis é um pretexto para o improviso de borboleteios maliciosos, digressões e parênteses felizes”.

Araripe Júnior também foi outro que se enganou: “Filho das próprias obras, ele (Machado) não deve o que é, nem o nome que tem, senão ao trabalho e a uma contínua preocupação de cultura literária.”

Astrojildo Pereira enganou-se ainda mais: “Machado de Assis é o mais universal dos nossos escritores; (...) ele é também o mais nacional, o mais brasileiro de todos.”

O francês Roger Bastide, destacando a paisagem carioca que poucos viam em Machado, concluiu: “Escrevi estas páginas de protesto contra os críticos literários que lhe negam essa qualidade: humilde homenagem de um estrangeiro a um mestre da literatura universal.”

Paro por aqui. A senhora dona Patrícia Secco não tem o direito de fazer o que fez. A obra de Machado de Assis não é dela. É patrimônio do povo brasileiro.
 
09 de maio de 2014
Deonísio da Silva, O Globo

AMOR À VENDA

Por que recusamos a ideia de que existem fantasias sexuais que envolvem a troca de dinheiro?

"Amante a Domicílio", de John Turturro, é um filme, como se diz, "delicioso". Nos Estados Unidos, uma série de artigos celebraram a "descoberta" de que existiria um "lado bom" da prostituição.

Em várias entrevistas, Turturro (que escreve, dirige e atua junto com Woody Allen, Sharon Stone, Vanessa Paradis e Sofia Vergara, todos notáveis) levou a conversa por esse lado: "Há coisas positivas no que fazem os trabalhadores do sexo". Por exemplo, Avigal, oprimida e entristecida pela viuvez e por sua própria tradição religiosa, redescobre a "magia" do amor graças a Fioravante, o gigolô. E é transando com ele que a dra. Parker se permite enfim mandar o retrato do marido à merda.

A consagração dessa visão do filme veio com um artigo de Karley Sciortino no "Guardian". Karley Sciortino escreve sobre sexo para "Vice" e para "Vogue", além de manter um (ótimo) blog, "Slutever" (sempreputa). Sciortino recorreu a Camille Paglia para lembrar que "moralismo e ignorância" são responsáveis por nossos estereótipos sinistros da prostituição e confirmar que Turturro nos mostrou o que há de positivo nela.

No Brasil, estranha-se menos que a prostituição possa ter algum lado "bom", mesmo que seja pela ideia machista e idiota de que ela serviria para a iniciação dos garotos (que, aliás, não precisam mais disso há tempos).

Mas, nos EUA, a coisa é diferente: com a exceção de Nevada, prostituir-se e contratar os serviços de uma ou de um prostituto são condutas punidas por prisão e multa. Isso, sem falar no que acontece com quem "promove a prostituição" (o que vai desde ser cafetão até alugar um apê a quem exerça a profissão). Enfim, em 2007, Eliot Spitzer se tornou governador do Estado de Nova York por ter sido um promotor severo contra as prostitutas e, em 2008, ele perdeu o governo por ter se relacionado, justamente, com prostitutas.

De fato, imaginar que a prostituição seja proibida em Nova York é uma piada. Mas a legislação reflete pensamentos comuns. Numa pesquisa-brincadeira de 2008, em Chicago, 200 clientes aceitaram falar de por que frequentavam prostitutas: 83% declararam que eles eram viciados e 40% afirmaram que só procuravam prostitutas quando estavam bêbados. A maioria acreditava que as prostitutas exercem sua profissão porque foram abusadas na infância. Em suma, clientes e prostitutas (ou prostitutos), todos doentes!

Não vale acusar o proverbial puritanismo dos EUA. Na própria França, ainda este ano, tem chances de ser aprovada uma lei que ("para acabar com a prostituição" —hello?) vai criminalizar o cliente.

Enfim, constata-se que existe um tabu sobre o sexo pago.

Uma hipótese, para explicá-lo, é o seguinte círculo vicioso: 1) recusamos a ideia de que exista uma fantasia sexual que envolve a troca de dinheiro, 2) concluímos que, portanto, a prostituição só acontece por necessidade absoluta de quem se prostitui, 3) queremos abolir a prostituição (de fato ou mentalmente) porque não queremos que existam diferenças econômicas que possam induzir alguém a vender sua intimidade.

O problema é o pressuposto: por que recusaríamos a ideia de que existam fantasias sexuais que envolvem a troca de dinheiro? Talvez por elas serem quase sempre fantasias de dominação, e muitos que gozam sonhando com a distribuição do poder preferem não saber exatamente do que eles estão gozando.

Em outras palavras, o dinheiro organiza fantasias eróticas, mas ele é presente demais na nossa vida social (inclusive nas relações de casal, entre parentes, amigos etc.) para que a gente se permita reconhecer esse efeito de sua circulação.

Nota: não é necessariamente quem paga que gosta de dominar. Certo, há os que curtem comprar amantes ou mulheres ou maridos. Mas também há os que pedem para ser explorados e, nas salas de bate-papo, se apresentam assim: acabe com a minha vida!, quero ser chantageado!

Achamos "Amante a Domicílio" "delicioso" porque ele confirma nossa crença (esperança?) de que a troca de dinheiro nas relações seja indiferente (no filme, apaixonamentos, renúncias, generosidades e pequenezas, tudo acontece como se ninguém estivesse pagando ninguém).

Será, então, que Turturro nos propõe uma ilusão? Talvez. Mas é a mesma ilusão na qual vivemos: nas nossas relações de cada dia, sempre tentamos esquecer o "erotismo" silencioso das trocas financeiras.
 
09 de maio de 2014
Contardo Calligaris, Folha de SP

INEFICIÊNCIA APRENDIZ E LOQUAZ: 6a. ANTILEI PETISTA

Já se disse que a política requer duas habilidades. A primeira: é preciso prever o que vai acontecer amanhã, na semana que vem e no ano seguinte. A segunda: é preciso explicar depois por que as previsões não se cumpriram. Nisso, todos os países e partidos são iguais, mas o Brasil da era petista tem sido mais igual que os outros. Há um abismo angustiante entre o que o atual governo prevê e a capacidade de explicar por que as coisas não acontecem.

Entre as previsões megalômanas e os resultados pífios, há o reino das antileis petistas, cultivadas cuidadosamente pela presidente Dilma e sua equipe. A primeira delas, uma espécie de cláusula pétrea do petismo, prescreve a necessidade de utilizar o máximo de palavras para expressar um mínimo de pensamento. Querem um exemplo magnífico? Vejam o que a então candidata disse sobre e elevada carga tributária no Brasil num debate da campanha presidencial de 2010 (transcrevo como foi dito): "O Brasil sai também de um nível muito elevado de carga tributária, e, agora, eu acho que ele entra numa fase de com a reforma tributária de decréscimo. Houve muitas pessoas contrárias à reforma tributária nos últimos anos. Agora, seguramente, o crescimento do PIB e a redução dos juros permitirá um Brasil mais desenvolvido". Diga-se, a propósito, que essa "reforma tributária de decréscimo", seja lá o que for isso, conviveu com a elevação da carga de tributos durante o governo Dilma ao nível mais alto da história.

A segunda antilei viola o princípio de que a menor distância entre dois pontos é uma linha reta; para eles, é uma curva torta. Este passou a ser o critério dominante das ações de governo: sempre pelo caminho mais longo, incerto e penoso. A terceira antilei supõe que o sol e os planetas giram em torno da Terra, ou seja, a presidente e seu partido coordenam e comandam o universo da política, da economia e das instituições, de modo que as conspirações da mídia e da oposição para enfraquecê-los podem provocar algum Big Bang que vá explodir o País, ou algum buraco negro que o devore. Outra antilei, a quarta, prescreve a transformação contínua de facilidades em dificuldades. Nada que seja fácil de fazer deve ser feito. Por exemplo, cria-se um programa chamado "Ciência sem Fronteiras" para enviar bolsistas ao exterior, mas se deixa de lado o requisito prévio de que os estudantes devam dominar o idioma do país que os recebe. Eles chegam ao Canadá, não falam inglês e têm de ser repatriados ou de fazer curso de línguas em Toronto, com o dinheiro dos contribuintes brasileiros. Geram-se atritos e desperdícios, além de desmoralizar a ideia de proporcionar aos nossos jovens novos conhecimentos que os beneficiem e ao nosso país.

Há uma quinta antilei - essa, reconheço, do agrado especial de Dilma (se ela não existisse, a mandatária certamente a editaria como medida provisória): cada ministro deve saber menos do que a presidente sobre a sua área de responsabilidade. As ideias e a forma de execução dos projetos ficam por conta da chefe do Executivo, que exibe, entre seus principais atributos, precisamente a falta de conhecimento dos assuntos de governo e a baixa capacidade de gestão.

Finalmente, ao menos por ora, há uma sexta antilei, que é muito forte: chega-se ao governo não para administrar, mas para aprender, como se fosse um curso supletivo ou de graduação. Isso vale para toda a nação petista, nos três níveis da Federação - União, Estados e municípios. O exemplo mais recente e vistoso, sem dúvida, ocorre na cidade de São Paulo, cuja administração se dedica ao papo-cabeça e aos experimentos macrolaboratoriais, em que as cobaias são os paulistanos sofredores. É o caso, por exemplo, da devolução dos hotéis da Cracolândia aos traficantes de droga a fim de que recebam seus clientes e dos subsídios dados aos dependentes químicos para que paguem preços mais altos pelo crack.

Na esfera federal, é antológica uma confissão da ministra do Planejamento, Miriam Belchior, feita numa boa, em 2011, sobre a dificuldade que estava encontrando na elaboração do Plano Plurianual (2012-2015): "Não é possível monitorar e muito menos ser efetivo com 360 programas. No PAC, todo mundo está reaprendendo a fazer obras de infraestrutura - nós, do setor público, e também o setor privado". Isso depois de oito anos de governo do PT e já sob a presidência de Dilma, anteriormente consagrada como genitora do PAC pelo então presidente Lula!

Outra preciosa declaração, em setembro do ano passado, da então ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, mostrou que, no 11.º ano de governo, o PT ainda não sabia o que fazer com as concessões de estradas: chegou a dizer que a concessão da BR-101, na Bahia, iria ficar por último "a fim de termos uma avaliação melhor". E continuou: "Se chegarmos à conclusão de que é impossível fazer concessão, vamos migrar para obra pública". Como escrevi na ocasião, "quantos anos já transcorreram e quantos ainda teremos pela frente até essa terapia infraestrutural de grupo chegar ao fim?".

Nesse emaranhado de antileis, vigilantemente aplicadas, pode-se vislumbrar a chama que tem derretido o prestígio de Dilma junto da população. Até porque as pessoas vão se dando conta, cada vez mais, da antilei n.º 1, que maximiza o palavrório e minimiza o pensamento, dificultando a explicação, já não diria convincente, mas, ao menos inteligível, da frustração das previsões originais e das que são refeitas a cada mês.

A mais reluzente das explicações carece de qualquer lógica: atribui-se à dobradinha entre imprensa e oposição a culpa pelas lambanças na Petrobrás, pela perda de mais da metade do patrimônio da empresa e pelo endividamento que bate o recorde mundial. Tudo isso faria parte de uma diabólica estratégia daquela dobradinha para privatizar a gigante do petróleo. De acordo com esse delírio, quanto mais desmoralizada ela estivesse, mais fácil seria sua privatização! Tenho a certeza de que tal disparate, em lugar de convencer, ofende as pessoas e aquece a chama do derretimento político não só da presidente, mas de um estilo de governo.
 
09 de maio de 2014
José Serra, O Estado de S.Paulo

MISÉRIA DA DIPLOMACIA

Estado se converte numa ferramenta de realização dos desígnios dos ocupantes eventuais do governo

‘Respeito instruções, respeito leis, mas não respeito caprichos nem ordens manifestadamente ilegais.” A declaração, concedida ao jornal “A Tribuna”, de Vitória (4/5), deveria constar no alto de um manual de conduta dos funcionários públicos. É do diplomata Eduardo Saboia e tem endereço certo. Saboia chefiava a embaixada brasileira em La Paz até a sexta-feira, 23 de agosto de 2013, quando decidiu que um limite ético fora ultrapassado e orquestrou a fuga do ex-senador boliviano Roger Pinto Molina para o Brasil. Hoje, o diplomata sofre a covarde punição tácita do ostracismo: a comissão de sindicância aberta no Itamaraty, com prazo previsto de 30 dias, segue sem uma resolução depois de oito meses.

O cineasta Dado Galvão prepara um importante documentário sobre a saga de Molina e Saboia. Será uma história incompleta, pois uma longa série de detalhes sórdidos permanece soterrada pela lápide do sigilo que recobre tanto as comunicações entre a embaixada e Brasília quanto os autos do processo administrativo contra Saboia. Mas o que agora se sabe já é de enrubescer cafetões.

Depois de receber asilo diplomático do governo brasileiro, Molina permaneceu confinado na embaixada em La Paz durante 15 meses. Enquanto o governo boliviano negava a concessão de salvo-conduto para que deixasse o país, ele não teve direito a banho de sol ou a visitas íntimas. A infâmia atingiu um ápice em março de 2013, quando emissários de Brasília reuniram-se, em Cochabamba, com representantes do governo boliviano para articular a entrega do asilado aos cuidados da Venezuela. A “solução final” só não se concretizou devido à crise desencadeada nas semanas finais da agonia de Hugo Chávez. No lugar dela, adotou-se a política da protelação infinita, que buscava quebrar a resistência de Molina, compelindo-o a render-se às autoridades bolivianas.

Cochabamba é um marco no declínio moral da diplomacia brasileira. A embaixada em La Paz ficou à margem das negociações. O embaixador Marcel Biato, que solicitava uma solução legal e decente para o impasse, foi sumariamente afastado do cargo. (De lá para cá, circulando sem funções pelos corredores do Itamaraty, Biato experimenta um prolongado ostracismo.) Molina, por sua vez, teve o direito a visitas restringido a seu advogado e sua filha. Uma ordem direta de Brasília proibiu a transferência do asilado para a residência diplomática, conservando-o num cubículo da chancelaria. Naqueles dias, vergonhosamente, o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, chegou a flertar com a ideia de confisco do celular e do laptop do asilado.

Convicções, crenças, valores? Nada disso. Dilma Rousseff conduziu todo o episódio premida pelo temor — ou melhor, por dois temores conflitantes. No início, por sugestão de Patriota, concedeu o asilo diplomático temendo a crítica doméstica — e, pelo mesmo motivo, não o revogou na hora da reunião de Cochabamba. Depois, a cada passo, temendo desagradar a Evo Morales, violou os direitos legais de Molina, entregou à Bolívia o escalpo do embaixador Biato e converteu Saboia em carcereiro do asilado. As concessões só estimularam o governo boliviano a endurecer sua posição. A prorrogação abusiva da prisão dos 12 torcedores corintianos em Oruro foi uma represália direta da Bolívia contra o Brasil. O patente desinteresse de Brasília pela sorte dos cidadãos brasileiros encarcerados representou uma nova — e abjeta — tentativa de apaziguamento.

Saboia assumiu o comando da embaixada após o afastamento de Biato, e tentou, inutilmente, acelerar a valsa farsesca das negociações conduzidas por uma comissão Brasil/Bolívia formada à margem da representação diplomática em La Paz. Cinco meses depois, rompeu o impasse, aceitando os riscos de transferir Molina para o Brasil. Em tempos normais, o diplomata que fez valer a prerrogativa brasileira de concessão de asilo seria recepcionado de braços abertos pelo governo brasileiro. Mas, em “tempos de Dilma”, o mundo está virado do avesso. Antes que os familiares de Saboia pudessem deixar a Bolívia, o governo transmitiu à imprensa o nome do responsável pela fuga do asilado. Na sequência, reservou-se a Saboia um lugar permanente na cadeira dos réus.

Tempos de Dilma, uma era de “ordens ilegais” e “caprichos”. A presidente expressou, em público e pela imprensa, sua condenação prévia de Saboia antes da abertura da investigação oficial. Pela primeira vez na História (e isso abrange a ditadura militar!), uma comissão de sindicância do Itamaraty não é presidida por um diplomata, mas por um assessor da Controladoria-Geral da União que opera como interventor direto da Presidência da República. “É evidente que existe uma pressão política”, denuncia Saboia. “Há uma sindicância que não está, pelo visto, apurando os fatos que levaram uma pessoa a ficar confinada 15 meses; está voltada para me punir.” Em março, emanou da comissão um termo provisório de indiciação que omite os argumentos da defesa e cristaliza as mais insólitas acusações — inclusive a de que Saboia violou os “usos e costumes” (!!!) da Bolívia.

A mesquinha perseguição a Biato e Saboia não é um caso isolado, mas a ponta saliente de uma profunda deterioração institucional: pouco a pouco, o Estado se converte numa ferramenta de realização dos desígnios dos ocupantes eventuais do governo. Não é mais segredo para ninguém que o governo ignora solenemente as violações de direitos humanos em Cuba e na Venezuela. Menos divulgado, porém, é o fato de que a política externa do lulopetismo tem perigosas repercussões internas: no Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), um órgão presidido pelo Ministério da Justiça, as solicitações de refúgio político de dezenas de bolivianos dormem no limbo.

“Não respeito caprichos nem ordens manifestadamente ilegais.” No Brasil de Dilma, quem diz isso é réu. A presidente exige obediência cega. Vergonha.
 
09 de maio de 2014
Demétrio Magnoli, O Globo

VINTE MIL ÉGUAS SOBRE MARINA

Historieta sobre como Lula convenceu Marina a ficar no governo é tão boa que parece piada

A maneta e o maneta se casaram, ela ficou grávida e o filho nasceu. Qual o nome do filme? “Ninguém segura esse bebê.” Odete e Célia, duas galinhas, comeram milho e explodiram. Como chama o filme? “Dois milhos e bum! Odete e Célia no espaço.” Marina passeava pelo seringal acreano, vieram vinte mil éguas e a atropelaram. Qual é o filme? “Vinte mil éguas sobre Marina.”

Não bastassem o linchamento no Guarujá, a alta da inflação, os estádios que não ficam prontos, a madrasta que matou o menino, a gatunagem em Pasadena, o sertanejo-universitário, o racionamento que vem aí, a volta da vaca louca, a anexação da Crimeia, o assassinato do dançarino, o doleiro com jatinho, as propagandas com Felipão e o Porta dos Fundos, esse papa que não para de assustar nenês, gente que conversa alto no cinema, o aparelhamento do COI, a dorzinha nas costas, o implante de Renan e a peruca de Paulo Skaf, os marmanjos de bermuda nos aeroportos, o tiozinho que insiste em perguntar “tá ligado?”, a ameaça de Sarney de voltar à presidência do Senado, o preço exorbitante da maconha uruguaia, as frases longas nas colunas e a anestesiante indignação que tudo isso provoca, o Brasil anda carente de boas piadas. No máximo se escutam trocadalhos do carilho. Para bom entendedor meia palavra bos. Isso o governo não vê. Imagina na Copa.

Por essas e por outras, muitas outras, surgiu o movimento Volta, Lula. Na segunda-feira passada, a jornalista Mônica Bergamo, uma abelhuda em tempo integral, contou como se deu a saída de Marina Silva do governo. A história, espalhada pelo próprio presidente (a repórter entrevistou três ex-ministros e um auxiliar direto dele), é tão boa que parece uma piada.

Estava Lula no gabinete, apoquentado por uma dessas chuvas de abacaxis que costumam cair sobre o Planalto, quando um estafeta veio dizer que Marina queria lhe falar com urgência. O presidente mal se lembrava da ministra do Meio Ambiente, uma das raras que não causava problemas. No entanto, ela lhe disse que sairia do governo. Lula quase caiu da cadeira. Tentou demovê-la por todos os meios. Não queria de jeito nenhum que a estrela verde sumisse da Esplanada. Marina remanchou, explicou, contra-argumentou. Lula negaceou, não se rendia. Até que a rainha deu o xeque-mate: “Presidente, eu conversei com Deus. E é o momento de eu sair”.

Frente à irretorquível palavra divina, Lula pediu um tempo, até que arrumasse um novo ministro. Mas voltou à rotina de catástrofes intratáveis e deixou o assunto de lado. Marina, não. Pediu outro encontro. Queria formalizar a saída do governo. O presidente cofiou a barba e matutou. Recebeu Marina e lhe disse que Deus também havia lhe falado, num sonho. “Ele me disse que ainda não está na hora de você sair do meu governo”, contou Lula à ministra. “Você ainda tem muito o que fazer na nossa equipe.”

Foi a vez de Marina quase cair da cadeira, desconcertada. Numa das versões contadas pelo presidente, a ministra teria sido acompanhada nas duas audiências por um pastor. Quando Deus apareceu na conversa pela segunda vez, o santo homem disse: “Então empatou”. Com o empate, Marina titubeou e, vai que Deus tenha mesmo falado a Lula, continuou no governo. Só veio a deixá-lo meses depois.

Mais chato que quem conta piadas sem parar é quem as analisa. Mas como nada menos que 15 músculos são acionados no desfecho de uma boa anedota, sem contar os envolvidos na inversão da respiração, note-se que Marina se irritou quando foi entrevistada sobre a historieta. E que Lula mandou dizer que não queria falar do assunto. Por que o desconforto?

A zanga de Marina não é para menos: ela se sai mal na piada. Aparece simultaneamente como ingênua e pretensiosa, uma crente com quem o Criador de Todas as Coisas — inclusive do vírus da dengue — se entretém num tête-à-tête. (Freud, que colecionava piadas e escreveu um livro sobre elas, nele usou o infame trocadilho tête-à-bête). Marina deve ter o superego do tamanho do Amazonas, capaz de recalcar qualquer energia marota que fermente num igarapé do id. Não se brinca com religião. Quem tem canal direto com o Pai sabe disso.

Já a quietude de Lula foi safa. Além de malandro, ele sai da historieta como um pai benigno. Gosta da ministra e precisa dela no governo. É um pragmático astuto que, para mantê-la no cargo, desce ao seu nível, fala a sua linguagem, apela ao outro Pai. Ela ficou no ministério e o seu narcisismo foi recompensado. E é novamente recompensado toda vez que conta o caso e os outros gargalham. Como não existe riso sem cumplicidade (cócegas em si mesmo não funcionam), Lula precisa de uma plateia para provar a si mesmo o quanto está acima dos outros. Daí o seu carisma. Conta outra, Lula!
 
09 de maio de 2014
Mario Sergio Conti, O Globo

"DLMÊS"CASTIÇO

Bom sinal que a presidente Dilma Rousseff tenha resolvido dedicar parte de seu tempo a conversar com a imprensa. Já fez dois encontros "temáticos" (com jornalistas da área de esportes e com profissionais mulheres), consta que pretenda fazer outros no esforço de estabelecer uma convivência mais civilizada em terreno tratado, quando interessa, como inimigo.

Muito melhor o diálogo do qual se beneficiam todos, governantes e governados. No caso da presidente, o convívio com réplicas e tréplicas - não sendo só uma fase decorrente da necessidade de angariar simpatia devido ao momento um tanto desfavorável - sem a barreira da subordinação pode ajudá-la a exercitar o uso do idioma, combinando sentidos e significados.

Nos pronunciamentos, principalmente nos improvisados, não raro a desconexão entre o pensamento e a linguagem desfavorece a compreensão do que de fato quis dizer a presidente. O jantar que reuniu um grupo de jornalistas na noite de terça-feira foi um exemplo de como a chefe da Nação ora pronuncia palavras que significam o oposto de suas ações, ora diz coisas que se contradizem e não formam um sentido lógico.

Ao defender sua política econômica, considerou "ridículas" as análises que apontam cenário de crise para 2015, ano em que, segundo ela, o "Brasil vai bombar". O que seria isso? Crescer espetacularmente? Atrair investimentos? Avançar na infraestrutura? Melhorar de maneira significativa a eficácia dos serviços públicos? Ou vão estourar bombas (no sentido figurado) de todos os lados? Não se sabe, porque a presidente não explica.

Reconhece, no entanto, o óbvio, que "não está tudo bem" com os preços. Não precisava dizer. Todo mundo vê. O que não se percebe com a mesma facilidade é como se combina essa situação adversa em relação aos preços com a assertiva da presidente sobre o absoluto controle sobre a inflação. Depende do que ela considera controle e se o fato de a inflação se instalar no teto da meta e o governo dizer que anda tudo bem pode transmitir segurança a alguém.

Dilma Rousseff tampouco atribui o mau humor que toma conta do ambiente ao aumento dos preços. Monta sua própria equação: para ela, a insatisfação decorre da "comparação entre a taxa de crescimento de bens e a taxa de crescimento de serviços".

Vamos tentar traduzir. As pessoas se afligem quando se dão conta de que compraram geladeira, carro, televisão, móveis novos, mas não conseguem ter segurança, saúde e educação públicas em grau minimamente decentes, é isso? Parece que sim e aí a presidente tira o corpo fora. "Os serviços dependem de investimentos que não foram feitos no passado."

Qual passado, se o partido de Dilma Rousseff está no poder há 12 anos incentivando o consumo e inerte quanto a mudanças estruturais?

A presidente da República assegurou que não haverá aumento de impostos. É de se perguntar, então, de onde o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tirou a afirmação feita nesta semana de que o governo pode elevar tributos sobre bens de consumo para compensar o aumento de despesas e ajudar no cumprimento da meta fiscal.

Nesse passeio pela versão presidencial dos fatos, chegamos à CPI da Petrobrás. Muito convicta, Dilma garantiu que não tem "temor algum" da comissão de inquérito. Pelo seguinte motivo: "Não devo nada e o governo é de absoluta transparência".

Duas inverdades. A presidente ainda deve explicações sobre a aprovação da compra da refinaria de Pasadena com base em relatório parcial, sem a requisição da documentação completa e o governo não é transparente quando no oficial diz que não teme e no paralelo faz manobras para postergar a investigação.

Nesse particular, atendendo ao apelo "ir para cima" contra a CPI, feito pelo ex-presidente Lula, a quem Dilma tem reiteradamente renovado votos de lealdade.
 
09 de maio de 2014
Dora Kramer, O Estado de S.Paulo