"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

O BRASIL NA ARMADILHA

Doze horas depois de anunciar a nova decisão sobre os juros, mantidos em 11%, apesar da inflação elevada e resistente, o Banco Central (BC) publicou o complemento da história: a produção continua estagnada e o País, na melhor hipótese, está pouco acima de uma recessão. Confirmou-se, mais uma vez, a armadilha apontada por vários analistas - uma combinação de fortes pressões inflacionárias com grave enfraquecimento da economia. A manutenção da taxa básica de juros, a Selic, foi sacramentada, sem surpresa, na quarta-feira à noite. Na quinta de manhã foi divulgado o índice mensal de atividade econômica (IBC-Br) produzido pela instituição e considerado uma prévia do Produto Interno Bruto (PIB). Em maio, o indicador ficou 0,18% abaixo do nível de abril e apenas 0,38% acima do apurado um ano antes, na série livre de efeitos sazonais. No trimestre encerrado em maio o resultado foi 0,33% mais alto que o dos três meses até abril.

Mesmo sem conhecer esses dados - uma hipótese improvável - os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC dispunham de informação suficiente, acumulada no último mês e meio, para saber do estado precário da economia. A produção industrial caiu 0,6% de abril para maio e ficou 3,2% abaixo do nível de um ano antes. De janeiro a maio o setor produziu 1,6% menos que no mesmo período de 2013. O emprego industrial continuou em queda. Caiu 0,7% de abril para maio, ficou 2,6% abaixo do registrado um ano antes e recuou 1,7% em 12 meses. O número de horas pagas diminuiu, mas, apesar disso, a folha de pagamento, descontada a inflação, ainda custou 14% mais que em abril de 2013 - mais um sinal do desajuste, apontado várias vezes pelo BC, no mercado de trabalho.

O mau desempenho da indústria já se reflete no setor de serviços. A receita nominal do setor, em maio, foi 6,696 maior que a do mês correspondente do ano passado. Descontada a inflação, restou um crescimento muito próximo de zero. As únicas boas notícias do setor produtivo são as da agropecuária, com perspectiva de mais uma safra recorde de grãos e oleaginosas. No setor externo, só o agronegócio, com superávit comercial de US$ 40,78 bilhões no primeiro semestre e de US$ 8243 bilhões em 12 meses, tem evitado um desastre completo.

A evolução do IBC-Br nos 12 meses terminados em maio - 1,95% -ainda é melhor que o crescimento previsto para o PIB entre janeiro e dezembro deste ano, de 1,6% nas con- tas do BC e de 1,05% nas do mercado. Todas as medidas de estímulo anunciadas nos últimos quatro ou cinco anos fracassaram. Foram insuficientes para reforçar o potencial de produção e de crescimento da indústria e, de modo geral, da economia brasileira. Os poucos segmentos dinâmicos e competitivos, como a agropecuária e a indústria aeronáutica, mantiveram seus padrões e continuaram avançando, apesar da baixa qualidade geral da política econômica e da ineficiência geral da economia. O último pacote anunciado pelo Executivo dificilmente produzirá resultados melhores, porque, com poucas mudanças, é uma reedição de medidas já fracassadas.

Quanto à inflação, nem os dirigentes e técnicos do BC parecem levar muito a sério o recuo das taxas nos últimos dois meses. Oficialmente, eles ainda esperam efeitos dos nove aumentos de juros entre abril do ano passado e abril deste ano. Evitam novos aumentos e provavelmente continuarão evitando até o fim do ano, ou, no mínimo, até a apuração das eleições.

Mas continuam descartando a hipótese de redução significativa da inflação anual até o fim de 2015. Mantêm, oficialmente, a perspectiva de uma convergência gradual para o centro da meta (4,5%), mas sem fixar com clareza um prazo, mesmo aproximado. Se houver novidade quanto a isso na ata da reunião do Copom, com divulgação prevista para a próxima quinta-feira, será uma surpresa.

A melhora dos indicadores de crescimento econômico e de inflação depende, em grande parte, do Executivo. Mas a presidente Dilma Rousseff teria de buscar a austeridade orçamentária e de mudar amplamente a estratégia de crescimento - hipóteses quase inimagináveis.

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23 de julho de 2014
Editorial O Estadão

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