A trajetória deste projeto é típica do que acontece quando a “mão visível” do Estado atua sem se preocupar com o mercado, apenas movida a interesses políticos e ideológicos
Admita-se que o destino da Oi poderia ter sido outro caso a empresa não viesse a se ligar, de alguma forma, ao grupo português Espírito Santo, hoje atolado em grave crise financeira, capaz de fazer oscilar o mercado europeu. Mas também é preciso reconhecer que o grupo telefônico carrega uma história intrincada, em que se misturam aventureirismo, sonhos estatistas e megalomania nacionalista. Gestado no leilão de privatizações do sistema Telebrás, no segundo governo FH, em 1998, o grupo, batizado de Tele Norte Leste, foi um dos que mais precisaram de apoio direto e indireto do Estado para se viabilizar. Depois renomeada de Telemar, a empresa, após um certo tempo, se estabilizou numa composição acionária com os grupos privados de Carlos Jereissati (La Fonte) e Andrade Gutierrez. Do lado estatal, foi mobilizado o BNDES, sempre presente nesses negócios. Não poderia ter mesmo vida fácil uma empresa que tentaria absorver um rosário de telefônicas de suprema ineficiência, entre as quais se destacava a Telerj.
Na gestão Lula, com o desembarque de estatistas em Brasília e o fortalecimento do braço sindical petista, a CUT, nos bilionários fundos de pensão de empresas públicas, fortaleceu-se o sonho de uma nova “Telebrás”. Desta vez, materializada numa “supertele” em que capitais privados, estatais e paraestatais constituiriam poderosa empresa para fazer frente às teles estrangeiras. O projeto de que resultou a Oi, o nome atual da reformada Telemar, tem origem nas mesmas cabeças que desenvolveram a ideia da criação dos “campeões nacionais” em berçários sustentados pelo contribuinte no BNDES.
Alterada a regulação para permitir à Telemar absorver a Brasil Telecom, a privatizada Tele Centro Sul, a “supertele” ganhou musculatura. Até para se expandir pela América do Sul e África, pensava-se.
Não foi assim. Tornou-se necessário atrair a Portugal Telecom para a Oi. Da Portugal Telecom é sócio o grupo Espírito Santo, velho conhecido dos petistas. Na prática, vendeu-se um pedaço importante da originariamente Telemar à Portugal Telecom, tanto que o principal executivo das duas empresas passou a ser o mesmo. O desfecho seria a fusão das companhias. A esta altura já estava finalizado o sonho nacionalista da supertele.
E veio a assombrosa operação em que a Portugal Telecom, sem os sócios brasileiros e o BNDES serem informados, comprou €847 milhões (R$ 2,5 bilhões) em títulos podres da Rio Forte, empresa quebrada do grupo Espírito Santo. Ou seja, deram dinheiro para o grupo. O final da história ainda é imprevisível, mas a PT terá de registrar pesadas perdas patrimoniais, com reflexos na Oi. E, por decorrência, a empresa que resulta da soma da ex-supertele com os portugueses, a CorpCo, será menor, e nasce bem mais endividada.
A trajetória do projeto da supertele é típica do que acontece quando a “mão visível” do Estado atua sem se preocupar com o mercado, apenas movida a interesses políticos e ideológicos.
23 de julho de 2014
Editorial O Globo
Admita-se que o destino da Oi poderia ter sido outro caso a empresa não viesse a se ligar, de alguma forma, ao grupo português Espírito Santo, hoje atolado em grave crise financeira, capaz de fazer oscilar o mercado europeu. Mas também é preciso reconhecer que o grupo telefônico carrega uma história intrincada, em que se misturam aventureirismo, sonhos estatistas e megalomania nacionalista. Gestado no leilão de privatizações do sistema Telebrás, no segundo governo FH, em 1998, o grupo, batizado de Tele Norte Leste, foi um dos que mais precisaram de apoio direto e indireto do Estado para se viabilizar. Depois renomeada de Telemar, a empresa, após um certo tempo, se estabilizou numa composição acionária com os grupos privados de Carlos Jereissati (La Fonte) e Andrade Gutierrez. Do lado estatal, foi mobilizado o BNDES, sempre presente nesses negócios. Não poderia ter mesmo vida fácil uma empresa que tentaria absorver um rosário de telefônicas de suprema ineficiência, entre as quais se destacava a Telerj.
Na gestão Lula, com o desembarque de estatistas em Brasília e o fortalecimento do braço sindical petista, a CUT, nos bilionários fundos de pensão de empresas públicas, fortaleceu-se o sonho de uma nova “Telebrás”. Desta vez, materializada numa “supertele” em que capitais privados, estatais e paraestatais constituiriam poderosa empresa para fazer frente às teles estrangeiras. O projeto de que resultou a Oi, o nome atual da reformada Telemar, tem origem nas mesmas cabeças que desenvolveram a ideia da criação dos “campeões nacionais” em berçários sustentados pelo contribuinte no BNDES.
Alterada a regulação para permitir à Telemar absorver a Brasil Telecom, a privatizada Tele Centro Sul, a “supertele” ganhou musculatura. Até para se expandir pela América do Sul e África, pensava-se.
Não foi assim. Tornou-se necessário atrair a Portugal Telecom para a Oi. Da Portugal Telecom é sócio o grupo Espírito Santo, velho conhecido dos petistas. Na prática, vendeu-se um pedaço importante da originariamente Telemar à Portugal Telecom, tanto que o principal executivo das duas empresas passou a ser o mesmo. O desfecho seria a fusão das companhias. A esta altura já estava finalizado o sonho nacionalista da supertele.
E veio a assombrosa operação em que a Portugal Telecom, sem os sócios brasileiros e o BNDES serem informados, comprou €847 milhões (R$ 2,5 bilhões) em títulos podres da Rio Forte, empresa quebrada do grupo Espírito Santo. Ou seja, deram dinheiro para o grupo. O final da história ainda é imprevisível, mas a PT terá de registrar pesadas perdas patrimoniais, com reflexos na Oi. E, por decorrência, a empresa que resulta da soma da ex-supertele com os portugueses, a CorpCo, será menor, e nasce bem mais endividada.
A trajetória do projeto da supertele é típica do que acontece quando a “mão visível” do Estado atua sem se preocupar com o mercado, apenas movida a interesses políticos e ideológicos.
23 de julho de 2014
Editorial O Globo
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