"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

A PERSPECTIVA SINGULAR DO PAPA AO PROPOR UMA ECOLOGIA INTEGRAL



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O papa Francisco operou uma grande virada no discurso ecológico ao passar da ecologia ambiental para a ecologia integral, que inclui a ecologia político-social, a mental, a cultural, a educacional, a ética e a espiritual.
Há o risco de que essa visão integral seja assimilada dentro do costumeiro discurso ambiental, não se dando conta de que todas as coisas, saberes e instâncias são interligadas. Ora, é essa cosmologia que leva o papa a dizer: “Nunca maltratamos e ofendemos nossa casa comum como nos últimos dois séculos”.
Como superar essa rota perigosa? O papa responde: “Com uma mudança de rumo” e ainda mais com a disposição de “delinear grandes percursos de diálogo que nos ajudem a sair desta espiral de autodestruição na qual estamos afundando”. Se nada fizermos, podemos ir ao encontro do pior. Mas o papa confia na capacidade criativa dos seres humanos.
Para enfrentar os múltiplos aspectos críticos de nossa situação, o papa propõe a ecologia integral. O pressuposto teórico deriva da nova cosmologia, da física quântica, da nova biologia, do novo paradigma contemporâneo que implica a teoria da complexidade e do caos. Nessa visão o repetia um dos fundadores da física quântica, Werner Heisenberg: “Tudo tem a ver com tudo em todos os pontos e em todos os momentos; tudo é relação, e nada existe fora da relação”.
TUDO EM RELAÇÃO
Seguramente, a mais bela e poética das formulações é encontrada no número 92 da encíclica, no qual enfatiza: “Tudo está em relação, e todos nós estamos unidos como irmãos e irmãs (…) com todas as criaturas que se unem conosco”.
Essa visão existe já há quase um século, mas nunca conseguiu se impor na política e na condução dos problemas sociais e humanos. Todos permanecemos ainda reféns do velho paradigma que isola os problemas e para cada um procura uma solução específica, sem se dar conta de que essa solução pode ser maléfica para outro problema.
A encíclica poderá servir de instrumento educativo para apropriarmo-nos dessa visão inclusiva e integral. Por exemplo, como assevera a encíclica: “Quando falamos de ambiente, nos referimos a uma particular relação entre a natureza e a sociedade; isso nos impede de considerar a natureza como algo separado de nós. Somos incluídos nela, somos parte dela”.
E continua, dando exemplos convincentes: “Toda análise dos problemas ambientais é inseparável da análise dos contextos humanos, familiares, trabalhistas, urbanos e da relação de cada pessoa consigo mesma, que cria um determinado modo de relações com os outros e com o ambiente”. Se tudo é relação, então a própria saúde humana depende da saúde da Terra e dos ecossistemas. Todas as instâncias se entrelaçam para o bem ou para o mal. Essa é a textura da realidade, não opaca e rasa, mas complexa e altamente relacionada com tudo.
Se pensássemos nossos problemas nacionais nesse jogo de inter-retrorrelação, não teríamos tantas contradições entre os ministérios e as ações governamentais. O papa nos sugere caminhos certeiros que nos podem tirar da ansiedade em que nos encontramos face ao nosso futuro comum.
Teilhard de Chardin tinha razão quando, nos anos 30 do século passado, escrevia: “A era das nações já passou. A tarefa diante de nós agora, senão pereceremos, é construir a Terra”. Cuidando da Terra com terno e fraterno afeto no espírito de são Francisco de Assis e de Francisco de Roma, podemos seguir “caminhando e cantando”, como conclui a encíclica, cheios de esperança. Ainda teremos futuro e iremos irradiar.

29 de junho de 2015
Leonardo Boff
O Tempo

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