Outra vez? Essa foi a reação de um amigo quando eu disse que pretendia, em maio passado, voltar à Rússia, pois estivera no país do presidente Putin no ano passado. Desta vez fui para assistir à chamada Parada da Vitória, que ocorre todo dia 9 de maio, em comemoração à vitória do Exército Vermelho contra os nazistas. Aliás, se Hitler não ganhou a guerra, isso se deveu aos russos que liquidaram e detiveram o avanço das tropas do exército alemão já em território russo. Soube que morreram por volta de oito milhões de russos.
O Dia da Vitória é comemorado com desfiles militares e povo nas ruas levando flores, numa grande festa, como se a guerra tivesse terminado ontem. Para mim foi uma experiência fascinante ver as pessoas bradarem o nacionalismo histórico, muitas delas com os olhos cheios de lágrimas, pois quase todos perderam parentes nesse conflito. Já de volta ao Brasil após 20 dias de Rússia, encontro um clima estranho no nosso país, sinto certa quietude, um silêncio incomum (afinal, estamos em época de Copa do Mundo), uma espécie de desânimo, alguns protestos, inconformismo com os gastos públicos, muito embora a imprensa tente, desesperadamente e de todas as formas, estimular uma alegria que vem aos pingos. Parece que pouco surte efeito, longe do contágio alegre das Copas de outrora.
Interessante que, por falar em Copa, ainda em Moscou, estive na casa de amigos russos, onde, por costume, a cozinha ou a “copa” são o lugar onde se celebram as grandes discussões políticas, familiares e diárias, muitas vezes simultaneamente ao preparo do jantar e sempre aos goles de vodca. Foi exatamente durante um desses jantares que pensei – talvez por influência da vodca e não da imprensa – sobre o Brasil nesta Copa, que não é russa nem de aspecto culinário, mas que provavelmente poderá nos levar a uma grande festa como a de comemoração ao Dia da Vitória russa, como também poderá nos conduzir a uma grande depressão, pois as obras foram objeto de muitas discussões sobre o esbanjamento do dinheiro público de forma irresponsável. Teremos assim uma bebedeira de tristeza ao depararmos com uma derrota brasileira e nos darmos conta da imensidão do que é perder dinheiro irresponsável e nos atordoar de humilhação perante nós mesmos ao calor da indignação.
O Brasil é um país pobre, a grande massa trabalhadora pouco tempo tem para discutir, ler jornal, ouvir críticas sobre o governo, a percepção é apenas o dinheiro que sobra no bolso, mas saberá celebrar uma vitória anestésica esportiva. Já uma derrota será perigosa do ponto de vista social, pois a conta dos gastos e dos atos pródigos arrebatará no bolso eleitoral e servirá de combustível oposicionista, em que os articuladores dessa oposição destilarão seu furor nesse momento de perda da Copa do Mundo.
É o Brasil, da corrupção, do pouco sentido da cidadania, que irá esbravejar se o script traçado por Lula não der certo. Poderemos assim voltar à moda russa e nos embebedar de vodca por não termos momentos históricos a celebrar, mas momentos históricos a lamentar, como a Copa de 1950. Ou como a parte do país sem cultura que se expande em estádios imensos onde o silêncio do destino com certeza se arrependerá, em meio a tanto que deveríamos ter feito com o erário público – em vez disso, sobrará somente a lembrança de um mero jogo político eleitoral. Portanto, vamos sentar na Copa ou na sala, ligar a televisão, e nos controlar para não beber para esquecer.... e, sim, torcer para não sofrer....
30 de maio de 2014
Fernando Rizzolo é Advogado, Jornalista, Mestre em Direito Constitucional, ex articulista colaborador da Agência Estado
Fernando Rizzolo é Advogado, Jornalista, Mestre em Direito Constitucional, ex articulista colaborador da Agência Estado
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