"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

DEBATE SOBRE A PREVIDÊNCIA NÃO EXISTE E ESTÁ PARECENDO UMA CONVERSA DE BÊBADO

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Charge do Mário (Arquivo Google)
O debate sobre a reforma da Previdência lembra conversa de bêbado com delegado. Não busca entendimento nem sequência lógica. Nada do que é dito pelo bêbado tem ligação com uma realidade factual e faltam ao delegado argumentos incisivos para neutralizar os delírios do interlocutor.
Há no Brasil regimes bem diferentes de aposentadoria. Para começar, o Regime Geral, para trabalhadores do setor privado (empregados e autônomos), e o Regime Próprio, para funcionários públicos civis e militares. Somem-se as regras diferenciadas de contribuição e recebimento de benefícios entre homens e mulheres, entre trabalhadores urbanos e rurais e regras especiais para professores e políticos. Lembrando Noel Rosa, “entre outras bossas, são coisas nossas”.
PÚBLICOS E PRIVADOS – Em números redondos, cerca de 55 milhões de trabalhadores do setor privado contribuem para a Previdência e 26 milhões recebem aposentadoria e benefícios. O valor médio da aposentadoria deste setor é de R$ 1.120. De outro lado, são cerca de 6 milhões os contribuintes do setor público e 3,5 milhões recebem aposentadoria e benefícios. Estes brasileiros especiais recebem, em média, R$ 7.500. São tão especiais que o valor é quase 7 vezes maior que o dos brasileiros comuns.
O bêbado defende ante o delegado os aposentados do setor público e diz que não há um déficit crescente da Previdência estrangulando as contas públicas. Mas o fato é que há uma desproporção absurda entre o total pago aos 3,5 milhões de empregados do setor público (R$ 254 bilhões, ou 4,25% do PIB) e o que é pago aos 26 milhões de aposentados do setor privado (R$ 454 bilhões, ou 7,6% do PIB). No delírio, esquece que os 26 milhões de brasileiros do setor privado geram um déficit de cerca de R$ 86 bilhões, enquanto os distintos 3,5 milhões (de canadenses ou escandinavos?) do setor público castigam a Previdência com um rombo de R$ 132 bilhões.
VALORES DÍSPARES – O que dá mais graça às nossas bossas são os valores das aposentadorias. Brasileiros do setor privado recebem de R$ 880 a R$ 5.189,82, limite superior imposto ainda que o salário na ativa tenha sido bem maior. Já os brasileiros servidores públicos, ao se aposentarem, recebem o salário integral que tinham na ativa. Entra-se aí no obscuro território de uma sociedade de castas colonial. Curiosamente, aqui o bêbado e o delegado se entendem: Para que mexer nesta história sem nexo? Para que reformar a Previdência, se o objetivo dos políticos de esquerda, direita e “meia-volta volver” (centrão?) é manter tudo como está?
Em 2016 a Previdência Social (INSS) arrecadou R$ 358 bilhões, bem abaixo do que teve de pagar em benefícios: cerca de R$ 508 bilhões. A diferença gerou um déficit de R$ 150 bilhões. A conta não fecha, obviamente, mas o bêbado insiste em que não só fecha, como teria superávit. A narrativa é de que não haveria déficit, não fosse a desoneração da folha de pagamentos e renúncias de maior impacto, como o Simples Nacional, filantrópicas, apoio à exportação rural e microempreendedor, entre outras, que foram aplaudidas pelo bêbado quando estava sóbrio. Os números mostram algo diferente: a soma das renúncias legais chega a R$ 42,8 bilhões, valor claramente aquém do déficit.
INSUSTENTÁVEL – Não se dando por vencido, aponta a Desvinculação de Receitas da União (DRU) como uma das causas do déficit e, se extinta, geraria superávit na Previdência. Mas a DRU permite que a União utilize livremente 30% da arrecadação vinculada ao orçamento da Seguridade Social (saúde e a assistência social). Não incide sobre o que o INSS arrecada com as contribuições.
A esta altura, cabe ao delegado dizer claramente ao bêbado que, se nada for feito, o déficit, que cresce aceleradamente, tornará a Previdência Social insustentável, pondo em risco a aposentadoria de milhões de brasileiros. Como, aliás, já acontece com o funcionalismo de vários Estados.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – O economista Josef Barat tocou no ponto principal – a falta de um debate sério sobre o déficit da Previdência. O que o governo quer fazer é uma reforma sem discutir nada, sem apresentar os números e analisar as variáveis e resultantes. Cerca tudo de sigilo, para proteger as categorias profissionais A e B. Mas o assunto interessa a todos os brasileiros, indistintamente. Deveria ser tratado com mais respeito aos cidadãos, que pagam os salários e as mordomias dos governantes e da elite do funcionalismo dos três Poderes, sejam civis ou militares(C.N.)


02 de novembro de 2017
Josef Barat
Estadão

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