A sorte abandonou o governador Luiz Fernando de Souza, o Pezão, quando ele comentou a prisão dos três menores acusados de terem matado o médico Jaime Gold enquanto pedalava na lagoa Rodrigo de Freitas. O doutor disse o seguinte: "Nenhum dos três é inocente. Todos possuem anotações criminais, e o importante é que a polícia está prendendo."
Parecia uma simples constatação, mas embutia uma empulhação. Um dos três menores, precisamente aquele que a polícia capturara em apenas 72 horas numa operação aparentemente exemplar, seria inocente do crime de que o acusaram. Seis testemunhas estão dispostas a depor mostrando que ele estava em outro lugar na hora do crime.
Se isso fosse pouco, outro menor, confesso, apresentara-se à polícia inocentando-o.
O adolescente tem mais de uma dezena de anotações criminais, nenhuma delas por lesões corporais.
É negro, favelado e infrator. Portanto, seria capaz de tudo. Pezão transformou uma solução -a detenção, mais tarde, de pelo menos um criminoso confesso- num problema: a tentativa de justificar uma acusação contra um inocente.
Como disse o próprio governador "pode ter havido engano, erros acontecem". Foi aí que a sorte lhe faltou. No mesmo dia o Superior Tribunal de Justiça autorizara a quebra do seu sigilo telefônico para que se investigue a procedência de denúncia do "amigo Paulinho", que o colocou na frigideira dos 40 políticos envolvidos na Operação Lava Jato.
Segundo o ex-diretor da Petrobras, na campanha eleitoral de 2010, quando "Pezão" elegeu-se vice-governador na chapa de Sérgio Cabral, cinco empreiteiras teriam despejado R$ 30 milhões no caixa dois dos candidatos. O governador, como o menor, repele a acusação.
Na métrica que Pezão usou em relação ao jovem preso, "pode ter havido engano, erros acontecem". Se a polícia do Rio já tivesse reconhecido o erro, tudo bem, mas isso ainda não havia sido feito. Resta outro ponto: o menor "tem anotações criminais".
Pezão também. Em 2013 foi condenado a pagar uma multa de R$ 14 mil por improbidade administrativa na compra de uma ambulância quando era prefeito de Piraí. Decisão de primeira instância; só pode ser considerada definitiva depois que o recurso do réu for apreciado.
Muita gente acredita que um menor infrator é capaz de tudo. Também há muita gente que, sem esperar pelo devido processo judicial, já condenou os 40 políticos que entraram na lista do procurador-geral Rodrigo Janot.
Quando se viu arrolado na investigação, o próprio Pezão, com bons motivos, queixou-se dessa conduta irracional: "Fui julgado e condenado".
Ajuste
Gente que entende de números começou a temer que a contração do PIB neste ano chegue a 2%. Seria a pior marca desde a contração de 4,4% de 1990.
Isso sem qualquer garantia de que 2016 venha a ser muito melhor.
Pedaladas
Se a doutora Dilma for pedalar na orla da lagoa Rodrigo de Freitas com sua bicicleta importada da grife Specialized (R$ 2.350), no mínimo ficará sem o brinquedo.
A doutora defende a proteção à industria brasileira, mas pedala bicicleta americana e durante a campanha eleitoral foi fotografada calçando sapatos Louis Vuitton.
Marca histórica
A greve dos professores de escolas públicas de São Paulo conseguiu duas marcas históricas. Superou o recorde de duração, batendo os 81 dias (os alunos que se danem) e teve professor apanhando.
Pela primeira vez, não foi a polícia quem bateu. Podem ter sido seguranças do carro de som ou grevistas.
Boa notícia
Se a Justiça americana propuser um bom acordo a José Maria Marin, é provável que ele faça negócio.
Bosta fresca
O Ministério Público continua com um problema: Paulo Roberto Costa diz que encaminhou a Alberto Youssef dois pleitos, de Antonio Palocci e Edison Lobão, pedindo dinheiro para as campanhas de Dilma Rousseff e Roseana Sarney. Youssef diz que nunca tratou desse assunto e ofereceu-se para uma acareação.
Tanto o "amigo Paulinho" como Youssef perdem os benefícios da colaboração com a Viúva se tiverem mentido em seus depoimentos.
Os procuradores ainda não anunciaram que farão a acareação. O que foi chamado de "bosta seca" virará bosta fresca.
Os "erros" na farsa do caso de Amarildo
O governador Pezão defende a redução da maioridade penal. Pode ter razão, mas poucas coisas seriam piores do que a imposição da menoridade intelectual aos cidadãos brasileiros.
No caso do menor da Lagoa, a polícia do Rio culpou-o e declarou o caso "encerrado". Deverá reabri-lo, porque "erros acontecem".
A menoridade intelectual dos adultos fica estabelecida quando o que pareceu uma investigação exemplar pode não ter passado de um fiasco, ou mas mais que isso.
Nesses casos, a teoria segundo a qual "erros acontecem" torna-se um biombo atrás do qual há um padrão que alimenta a insegurança pública.
Há dois anos, quando o pedreiro Amarildo desapareceu na Rocinha, coisas estranhas aconteceram.
Estavam cegas as câmeras que poderiam ter registrado a entrada e a saída do cidadão do contêiner da Unidade de Polícia Pacificadora para onde foi levado por PMs. (A repórter Vera Araújo mostrou que, entre os dias 23 e 25 de maio passado, seis câmeras tiveram seus lacres rompidos em três batalhões da PM. Em Olaria, foi destruído o disco que conserva as imagens. Como os sapos de Guimarães Rosa, as câmeras não enguiçam por boniteza, mas por precisão.)
Quando o sumiço de Amarildo se tornou uma questão nacional, surgiu a história, vinda de um policial, segundo a qual ele teria sido morto por traficantes e jogado num caminhão de lixo. Era mentira, mas, se colasse, o caso estaria encerrado.
Depois apareceram testemunhas informando que um traficante ("Catatau") matara o pedreiro. Não era só mentira, era obstrução da Justiça. O comandante da UPP da Rocinha, major Edson Santos, subornara as testemunhas com R$ 1.350. Depois de ter contado a história do suborno, uma dessas testemunhas, de nome Lucia Helena, desapareceu, como Amarildo.
A empulhação durou meses e foi desfeita com a ajuda de policiais militares que colaboraram com as investigações.
Quinze PMs respondem a processo pelo caso. Em março passado um soldado que servia na UPP da Rocinha e ajudou a desmentir as patranhas foi assassinado. Estava lotado na Coordenadoria de Inteligência da PM.
"Erros acontecem", mas, no caso de Amarildo, o seu assassinato foi apenas o mais doloroso. É nos acobertamentos, tolerados pela cadeia hierárquica, que mora o padrão.
07 de junho de 2015
Elio Gaspari
Parecia uma simples constatação, mas embutia uma empulhação. Um dos três menores, precisamente aquele que a polícia capturara em apenas 72 horas numa operação aparentemente exemplar, seria inocente do crime de que o acusaram. Seis testemunhas estão dispostas a depor mostrando que ele estava em outro lugar na hora do crime.
Se isso fosse pouco, outro menor, confesso, apresentara-se à polícia inocentando-o.
O adolescente tem mais de uma dezena de anotações criminais, nenhuma delas por lesões corporais.
É negro, favelado e infrator. Portanto, seria capaz de tudo. Pezão transformou uma solução -a detenção, mais tarde, de pelo menos um criminoso confesso- num problema: a tentativa de justificar uma acusação contra um inocente.
Como disse o próprio governador "pode ter havido engano, erros acontecem". Foi aí que a sorte lhe faltou. No mesmo dia o Superior Tribunal de Justiça autorizara a quebra do seu sigilo telefônico para que se investigue a procedência de denúncia do "amigo Paulinho", que o colocou na frigideira dos 40 políticos envolvidos na Operação Lava Jato.
Segundo o ex-diretor da Petrobras, na campanha eleitoral de 2010, quando "Pezão" elegeu-se vice-governador na chapa de Sérgio Cabral, cinco empreiteiras teriam despejado R$ 30 milhões no caixa dois dos candidatos. O governador, como o menor, repele a acusação.
Na métrica que Pezão usou em relação ao jovem preso, "pode ter havido engano, erros acontecem". Se a polícia do Rio já tivesse reconhecido o erro, tudo bem, mas isso ainda não havia sido feito. Resta outro ponto: o menor "tem anotações criminais".
Pezão também. Em 2013 foi condenado a pagar uma multa de R$ 14 mil por improbidade administrativa na compra de uma ambulância quando era prefeito de Piraí. Decisão de primeira instância; só pode ser considerada definitiva depois que o recurso do réu for apreciado.
Muita gente acredita que um menor infrator é capaz de tudo. Também há muita gente que, sem esperar pelo devido processo judicial, já condenou os 40 políticos que entraram na lista do procurador-geral Rodrigo Janot.
Quando se viu arrolado na investigação, o próprio Pezão, com bons motivos, queixou-se dessa conduta irracional: "Fui julgado e condenado".
Ajuste
Gente que entende de números começou a temer que a contração do PIB neste ano chegue a 2%. Seria a pior marca desde a contração de 4,4% de 1990.
Isso sem qualquer garantia de que 2016 venha a ser muito melhor.
Pedaladas
Se a doutora Dilma for pedalar na orla da lagoa Rodrigo de Freitas com sua bicicleta importada da grife Specialized (R$ 2.350), no mínimo ficará sem o brinquedo.
A doutora defende a proteção à industria brasileira, mas pedala bicicleta americana e durante a campanha eleitoral foi fotografada calçando sapatos Louis Vuitton.
Marca histórica
A greve dos professores de escolas públicas de São Paulo conseguiu duas marcas históricas. Superou o recorde de duração, batendo os 81 dias (os alunos que se danem) e teve professor apanhando.
Pela primeira vez, não foi a polícia quem bateu. Podem ter sido seguranças do carro de som ou grevistas.
Boa notícia
Se a Justiça americana propuser um bom acordo a José Maria Marin, é provável que ele faça negócio.
Bosta fresca
O Ministério Público continua com um problema: Paulo Roberto Costa diz que encaminhou a Alberto Youssef dois pleitos, de Antonio Palocci e Edison Lobão, pedindo dinheiro para as campanhas de Dilma Rousseff e Roseana Sarney. Youssef diz que nunca tratou desse assunto e ofereceu-se para uma acareação.
Tanto o "amigo Paulinho" como Youssef perdem os benefícios da colaboração com a Viúva se tiverem mentido em seus depoimentos.
Os procuradores ainda não anunciaram que farão a acareação. O que foi chamado de "bosta seca" virará bosta fresca.
Os "erros" na farsa do caso de Amarildo
O governador Pezão defende a redução da maioridade penal. Pode ter razão, mas poucas coisas seriam piores do que a imposição da menoridade intelectual aos cidadãos brasileiros.
No caso do menor da Lagoa, a polícia do Rio culpou-o e declarou o caso "encerrado". Deverá reabri-lo, porque "erros acontecem".
A menoridade intelectual dos adultos fica estabelecida quando o que pareceu uma investigação exemplar pode não ter passado de um fiasco, ou mas mais que isso.
Nesses casos, a teoria segundo a qual "erros acontecem" torna-se um biombo atrás do qual há um padrão que alimenta a insegurança pública.
Há dois anos, quando o pedreiro Amarildo desapareceu na Rocinha, coisas estranhas aconteceram.
Estavam cegas as câmeras que poderiam ter registrado a entrada e a saída do cidadão do contêiner da Unidade de Polícia Pacificadora para onde foi levado por PMs. (A repórter Vera Araújo mostrou que, entre os dias 23 e 25 de maio passado, seis câmeras tiveram seus lacres rompidos em três batalhões da PM. Em Olaria, foi destruído o disco que conserva as imagens. Como os sapos de Guimarães Rosa, as câmeras não enguiçam por boniteza, mas por precisão.)
Quando o sumiço de Amarildo se tornou uma questão nacional, surgiu a história, vinda de um policial, segundo a qual ele teria sido morto por traficantes e jogado num caminhão de lixo. Era mentira, mas, se colasse, o caso estaria encerrado.
Depois apareceram testemunhas informando que um traficante ("Catatau") matara o pedreiro. Não era só mentira, era obstrução da Justiça. O comandante da UPP da Rocinha, major Edson Santos, subornara as testemunhas com R$ 1.350. Depois de ter contado a história do suborno, uma dessas testemunhas, de nome Lucia Helena, desapareceu, como Amarildo.
A empulhação durou meses e foi desfeita com a ajuda de policiais militares que colaboraram com as investigações.
Quinze PMs respondem a processo pelo caso. Em março passado um soldado que servia na UPP da Rocinha e ajudou a desmentir as patranhas foi assassinado. Estava lotado na Coordenadoria de Inteligência da PM.
"Erros acontecem", mas, no caso de Amarildo, o seu assassinato foi apenas o mais doloroso. É nos acobertamentos, tolerados pela cadeia hierárquica, que mora o padrão.
07 de junho de 2015
Elio Gaspari
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