Estava demorando, mas sabe como norte-americano é, não é mesmo? Foi inaugurado o primeiro spa para desintoxicar do vício em telas e eletrônicos ou tecnofilia. Outros já usam o termo “nomofobia” – do inglês “no mobile phobia”, que, em, português daria algo como medo de ficar sem um aparelho móvel ou, simplesmente, temor de se desconectar.
O procedimento é isolar o grupo de viciados em smartphone e outros gadgets num ambiente natural, relaxado e sem qualquer conforto, o que inclui eletricidade, obrigando pessoas a se relacionar, cooperar, trabalhar com recursos da natureza, acampados, desenvolvendo habilidades artesanais, dormindo com a escuridão, acordando com o raiar do céu. Um lugar paradisíaco, com luar, pôr do sol, cachoeiras e... sem tecnologia.
Os relatos vão de depressão severa nos primeiros dias, crises de agitação e revolta, ansiedade e insônia, até ameaças sérias de atentar contra a própria vida. Mas, passadas quatro semanas, foi surpreendente a mudança comportamental. Os tímidos e isolados foram se socializando, os viciados em trabalho reavaliando a noção de tempo e lazer, casais se formaram, opiniões radicais e intolerantes se desfaziam em conversas mais abertas e compreensivas, ou com moderação do grupo, para que a discordância não se transformasse em conflito e controvérsias fossem respeitadas. Amizades se firmaram nos desafios que exigiam o coletivo, a união, ao contrário do dia a dia individualista, egocêntrico e narcisista. Houve troca de experiências, histórias foram contadas, risos e choros, num processo empático que é aquilo que mais diferencia o ser humano de outras espécies.
Aliás, nesta semana, um vídeo de uma funcionária do McDonald’s dando sorvete na boca de um senhor com limitações de uma paralisia cerebral, de forma espontânea, por uma hora, se tornou viral, pois nos acalenta e reacende a esperança de que sejamos menos animalescos ou maquinais. O cuidado gratuito, o afeto aleatório pelo semelhante é emocionante.
Mas, voltando à desintoxicação, abrir mão de contaminar o local belíssimo com selfies neurotizantes e poluidores de sensações foi outro ponto a ser registrado. Fotografar com a memória, sentir a emoção de sons, imagens, cheiros, sabores, bem como experimentar o abraço, o carinho, o cuidado do outro consigo sem a necessidade de ser o centro das atenções, o ator principal de um teatro muito mais divino e maior, marcou os relatos posteriores dos participantes.
Redescobrir a si e ao mundo como espectador sensorial e perceptivo da natureza, da qual somos copartícipes, é inenarrável. O mundo real e natural não conflita com o virtual e artificial, e ninguém está pedindo que desinvente a roda. Multimeios, como está explícito no termo, nos é útil como instrumento que nos conduza a algo, ou seja, um meio para se levar a um fim.
Somos aqueles que tentam transformar intenção (seja um sonho, uma meta, um objetivo ou uma vontade) em ação ou realização. E assim deveria ser com a tecnologia facilitadora, simplificadora, democrática. O fim é ser feliz, compartilhar tal felicidade, é amar e ser amado, é relacionar com o outro aprendendo e ensinando. É, acima de tudo, prestar atenção no que está ao nosso lado e não se hipnotizar com telas, conectando com quem está distante e desprezando quem nos acompanha tão próximo. É de uma grosseria absurda ver uma mesa na qual amigos e familiares teclam o tempo todo, cabeça baixa, indiferentes ao calor humano. Ver um evento ao vivo e olhar na plateia espectadores conversando “sozinhos”, atentos ao seu celular enquanto o show ou espetáculo ocorre debaixo do seu nariz. É deprimente ver no almoço um grupo hiperconectado sem uma conversa entre si.
Quer ser “selfie”, então se isole num canto de mundo, mas não ocupe o lugar de quem deseja a experiência de curtir o evento, trocar conversas, vibrar, abraçar, olhar nos olhos, emocionar-se.Sim, estamos impregnados de telas, viciados e dependentes de estar conectados a tudo e todos, como se o mundo fosse acabar amanhã. Ver e ser visto, ser importante, famoso, viral, rico, manequim da expectativa alheia. Uma existência “photoshopada”, artificial e camuflada.
Esqueça o celular em casa, desconecte-se, tire férias da ansiedade eletrônica. Verá que o mundo continuará com ou sem você, o sol nascerá e se porá, e que nenhum de nós é tão importante nem tão desimportante que não surjam sentimentos humanos como saudade e amorosidade.
Existíamos antes e continuaremos existindo depois desse deslumbramento tecnológico. Relaxe...
07 de junho de 2015
Eduardo Aquino
O procedimento é isolar o grupo de viciados em smartphone e outros gadgets num ambiente natural, relaxado e sem qualquer conforto, o que inclui eletricidade, obrigando pessoas a se relacionar, cooperar, trabalhar com recursos da natureza, acampados, desenvolvendo habilidades artesanais, dormindo com a escuridão, acordando com o raiar do céu. Um lugar paradisíaco, com luar, pôr do sol, cachoeiras e... sem tecnologia.
Os relatos vão de depressão severa nos primeiros dias, crises de agitação e revolta, ansiedade e insônia, até ameaças sérias de atentar contra a própria vida. Mas, passadas quatro semanas, foi surpreendente a mudança comportamental. Os tímidos e isolados foram se socializando, os viciados em trabalho reavaliando a noção de tempo e lazer, casais se formaram, opiniões radicais e intolerantes se desfaziam em conversas mais abertas e compreensivas, ou com moderação do grupo, para que a discordância não se transformasse em conflito e controvérsias fossem respeitadas. Amizades se firmaram nos desafios que exigiam o coletivo, a união, ao contrário do dia a dia individualista, egocêntrico e narcisista. Houve troca de experiências, histórias foram contadas, risos e choros, num processo empático que é aquilo que mais diferencia o ser humano de outras espécies.
Aliás, nesta semana, um vídeo de uma funcionária do McDonald’s dando sorvete na boca de um senhor com limitações de uma paralisia cerebral, de forma espontânea, por uma hora, se tornou viral, pois nos acalenta e reacende a esperança de que sejamos menos animalescos ou maquinais. O cuidado gratuito, o afeto aleatório pelo semelhante é emocionante.
Mas, voltando à desintoxicação, abrir mão de contaminar o local belíssimo com selfies neurotizantes e poluidores de sensações foi outro ponto a ser registrado. Fotografar com a memória, sentir a emoção de sons, imagens, cheiros, sabores, bem como experimentar o abraço, o carinho, o cuidado do outro consigo sem a necessidade de ser o centro das atenções, o ator principal de um teatro muito mais divino e maior, marcou os relatos posteriores dos participantes.
Redescobrir a si e ao mundo como espectador sensorial e perceptivo da natureza, da qual somos copartícipes, é inenarrável. O mundo real e natural não conflita com o virtual e artificial, e ninguém está pedindo que desinvente a roda. Multimeios, como está explícito no termo, nos é útil como instrumento que nos conduza a algo, ou seja, um meio para se levar a um fim.
Somos aqueles que tentam transformar intenção (seja um sonho, uma meta, um objetivo ou uma vontade) em ação ou realização. E assim deveria ser com a tecnologia facilitadora, simplificadora, democrática. O fim é ser feliz, compartilhar tal felicidade, é amar e ser amado, é relacionar com o outro aprendendo e ensinando. É, acima de tudo, prestar atenção no que está ao nosso lado e não se hipnotizar com telas, conectando com quem está distante e desprezando quem nos acompanha tão próximo. É de uma grosseria absurda ver uma mesa na qual amigos e familiares teclam o tempo todo, cabeça baixa, indiferentes ao calor humano. Ver um evento ao vivo e olhar na plateia espectadores conversando “sozinhos”, atentos ao seu celular enquanto o show ou espetáculo ocorre debaixo do seu nariz. É deprimente ver no almoço um grupo hiperconectado sem uma conversa entre si.
Quer ser “selfie”, então se isole num canto de mundo, mas não ocupe o lugar de quem deseja a experiência de curtir o evento, trocar conversas, vibrar, abraçar, olhar nos olhos, emocionar-se.Sim, estamos impregnados de telas, viciados e dependentes de estar conectados a tudo e todos, como se o mundo fosse acabar amanhã. Ver e ser visto, ser importante, famoso, viral, rico, manequim da expectativa alheia. Uma existência “photoshopada”, artificial e camuflada.
Esqueça o celular em casa, desconecte-se, tire férias da ansiedade eletrônica. Verá que o mundo continuará com ou sem você, o sol nascerá e se porá, e que nenhum de nós é tão importante nem tão desimportante que não surjam sentimentos humanos como saudade e amorosidade.
Existíamos antes e continuaremos existindo depois desse deslumbramento tecnológico. Relaxe...
07 de junho de 2015
Eduardo Aquino
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