Para o PT e parte da esquerda, a mídia é um dos responsáveis pela queda de Dilma Rousseff. No discurso petista, os principais meios de comunicação se uniram às elites conservadoras para derrubar um governo que vinha fazendo reformas de caráter popular.
Tais proposições me parecem frágeis, mas o que pretendo hoje é discutir outra coisa: o poder da imprensa de modificar a realidade. O que subjaz à narrativa petista, afinal, é a ideia de que o governo ia razoavelmente bem, mas que essa percepção foi bloqueada por vontade da mídia.
Não há dúvida de que os meios de comunicação exercem algum tipo de influência. Caso contrário, não valeriam de nada, não seriam procurados por quem tem algo a dizer nem por anunciantes. A questão relevante aqui é se conseguem ir além de refletir o mundo real, moldando até certo ponto as percepções do público, e se tornam capazes de criar realidades ao bel-prazer de seus controladores.
Um autor caro à esquerda, Karl Marx, pensava que não. Num texto de 1842 para o "Rheinische Zeitung", afirmou que a imprensa livre é tão responsável por alterar as condições do mundo "quanto o telescópio do astrônomo é responsável pela incessante moção do Universo".
Para sustentar o contrário é preciso supor que as pessoas não passam de fantoches que fazem tudo o que a mídia lhe ordena. Ora, o que os estudos mais modernos sugerem é que somos seres bastante influenciáveis, por fatores às vezes tão improváveis quanto a música que toca ao fundo. O poder dessas interferências, porém, está longe de absoluto. Elas alteram a proporção de pessoas que responde de um jeito ou de outro aos exercícios propostos pelos pesquisadores, mas só raramente levam alguém a fazer aquilo que não quer.
Um bom marqueteiro até pode convencer alguns incautos de que titica de cachorro é uma iguaria culinária. Mas dificilmente vai ficar rico vendendo isso. O conteúdo importa.
29 de agosto de 2016
Hélio Schwartsman, Folha de SP
Tais proposições me parecem frágeis, mas o que pretendo hoje é discutir outra coisa: o poder da imprensa de modificar a realidade. O que subjaz à narrativa petista, afinal, é a ideia de que o governo ia razoavelmente bem, mas que essa percepção foi bloqueada por vontade da mídia.
Não há dúvida de que os meios de comunicação exercem algum tipo de influência. Caso contrário, não valeriam de nada, não seriam procurados por quem tem algo a dizer nem por anunciantes. A questão relevante aqui é se conseguem ir além de refletir o mundo real, moldando até certo ponto as percepções do público, e se tornam capazes de criar realidades ao bel-prazer de seus controladores.
Um autor caro à esquerda, Karl Marx, pensava que não. Num texto de 1842 para o "Rheinische Zeitung", afirmou que a imprensa livre é tão responsável por alterar as condições do mundo "quanto o telescópio do astrônomo é responsável pela incessante moção do Universo".
Para sustentar o contrário é preciso supor que as pessoas não passam de fantoches que fazem tudo o que a mídia lhe ordena. Ora, o que os estudos mais modernos sugerem é que somos seres bastante influenciáveis, por fatores às vezes tão improváveis quanto a música que toca ao fundo. O poder dessas interferências, porém, está longe de absoluto. Elas alteram a proporção de pessoas que responde de um jeito ou de outro aos exercícios propostos pelos pesquisadores, mas só raramente levam alguém a fazer aquilo que não quer.
Um bom marqueteiro até pode convencer alguns incautos de que titica de cachorro é uma iguaria culinária. Mas dificilmente vai ficar rico vendendo isso. O conteúdo importa.
29 de agosto de 2016
Hélio Schwartsman, Folha de SP
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