"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 3 de março de 2014

DESCASO E INCOMPETÊNCIA DÃO NISTO


Bem avisou Darcy Ribeiro, 30 anos atrás: melhor gastar com escolas que com penitenciárias. Disse ainda, em entrevista para a TV Cultura, que o Brasil se arrependeria se não o ouvisse. Não é só Brasília que está entregue aos bandidos. É o Brasil inteiro. Isso já estava previsto, há muitos anos atrás.

Governos incompetentes, crianças fora da escola, crescendo ignorantes e mal-alimentadas, sem capacidade para nada, a não ser se reunir com os moleques e inventar maldades. Quando são presas, vão para cadeia fétida, são tratados como bois no pasto e vão se deteriorando, alimentando os monstros internos, odiando a sociedade.

Quando o Darcy era vice-governador do Rio, pediu ao Lelé projeto de cadeia pré-fabricada. O projeto era maravilhoso. Cada quarto para quatro detentos, com quatro camas e banheiro decente, roupa de cama, etc. Refeitório limpo, amplo. Posto de saúde, pátio para exercícios físicos, salas de aula, locais para oficinas onde seriam confeccionados móveis para escolas, roupas para médicos, sapatos, roupas de cama para os hospitais, uniformes. Os detentos estudariam e aprenderiam ofícios para, recuperada a liberdade, exercerem profissão decente.

Com as escolas de tempo integral que o Darcy criou, as crianças teriam encaminhamento digno e hoje estaríamos mais tranquilos, com menor quantidade de bandidos nas ruas. Infelizmente, ele não foi imitado nos outros estados, como pretendia, e os governos que vieram depois, no Rio, fecharam as escolas. Recentemente, li reportagem sobre o Complexo Penitenciário de Ribeirão das Neves, em Minas, nos moldes do projeto do Lelé e fiquei contente que alguém tenha começado o processo. Antes tarde do que nunca.

Foi trabalho de parceria público-privada, em que se encontram internados 672 detentos. Não sei a razão de os milionários brasileiros não tomarem a iniciativa de fazer o que os governos não fazem, para o seu próprio bem e o de suas famílias. Porque, num futuro bem próximo, ninguém vai poder chegar à janela de casa sem ser molestado por monstros que a incompetência, o descaso e o desamor dos governos e da sociedade fizeram nascer.

Mas o tempo que já perdemos, o descaso e a incompetência dos vários governos causaram estragos irrecuperáveis. Não existe uma pessoa sensível que não se comova e se revolte quando assiste, na televisão, ao tratamento que os hospitais dão aos doentes pobres. Fico imaginando os filhos e os netos desses pobres coitados. Os médicos idealistas deixaram de existir.

Os professores deixaram de ser competentes e eficientes. Os ordenados que lhes são pagos são tão baixos que ninguém mais quer ser professor. E ainda têm que suportar a má educação dos estudantes que perderam a compostura nas salas de aula. A educação, no Brasil, está mais do que lastimável.

As televisões informam, diariamente, a fortuna que é roubada dos cofres públicos, cinicamente, até por juízes, como foi o caso de São Paulo. E fico pensando na decepção dos jovens que escolheram estudar direito e tomam conhecimento de absurdo dessa dimensão. Os doentes mentais estão sendo jogados em masmorras, sem a devida assistência médica. É lastimável que tenham chegado a esse absurdo.

Os idosos, quase todos abandonados pelas famílias, vivem em casas de caridade, dependendo de esmolas e da boa vontade de pessoas generosas para se alimentarem razoavelmente. Nem sei se haverá alguém com capacidade de consertar a bagunça que se instalou. Já nem falo na decadência moral dos políticos. Foi-se o tempo em que os idealistas se candidatavam, com o desejo de ajudar o povo na busca de caminho decente para um país fisicamente belo e farto, com terras férteis, rios abundantes e clima ameno. Hoje essa qualidade de gente é minoria. Os gananciosos, egoístas, injustos e irresponsáveis assumiram a direção do nosso destinos - em arriscada jornada.
03 de março de 2014
Vera Brant, Correio Braziliense

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