"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

"UMA DIPLOMACIA ESTUDANTIL"




O Itamaraty é coisa séria mas, com suas trapalhadas, o comissariado transformou-o numa usina de desastres
A doutora Dilma tem dois chanceleres, um no Planalto e outro no Itamaraty. Apesar disso, restou ao Brasil uma diplomacia trapalhona, cenográfica e inepta. A desova do senador Roger Pinto no território brasileiro transformou uma conduta inamistosa do governo da Bolívia numa estudantada brasileira. Custou o lugar ao chanceler Antonio Patriota. Ele vai para Nova York, mas o comissário Luis Inácio Adams continua advogado-geral da União. O doutor sustentou que, caso um médico cubano peça asilo territorial no Brasil, será devolvido a Cuba. Agradando o aparelho dos irmãos Castro, ofendeu a História do país e o Direito. No ano passado o Brasil meteu-se noutra estudantada, expulsou o Paraguai do Mercosul e agora corteja seu governo. É uma diplomacia de palavrório e negócios. Patriota foi um detalhe.
 
A ideia segundo a qual o encarregado de negócios do Brasil em La Paz contrabandeou o senador até a fronteira com o Brasil porque apiedou-se de seu estado emocional é pueril. Se os embaixadores começassem a ser orientados pelos seus sentimentos, seria melhor fechar a Casa. A boa norma determina que um governo dê o salvo-conduto a um asilado em algumas semanas. No exagero, alguns meses. O presidente Evo Morales não quis fazer isso. Direito dele. O ex-presidente peruano Haya de la Torre ralou cinco anos numa sala da embaixada da Colômbia em Lima. O cardeal Jozef Mindszenty, outros quinze na embaixada dos Estados Unidos (que não são signatários das convenções de asilo diplomático) na Hungria.
 
Se alguém pensou que combinou a fuga com Evo Morales, fez papel de bobo e transformou o algoz em vítima. Transferiu o vexame para o diplomata Eduardo Sabóia, deixando-o numa posição de franco-atirador. Coisa parecida, fez no mundo dos negócios, quando transferiu para o embaixador do Brasil em Cingapura uma transação meio girafa que favorecia os interesses do empresário Eike Batista.
 
A maneira como a diplomacia de Lula e da doutora lidou com o instituto do asilo revela desrespeito histórico com um mecanismo que protegeu centenas de brasileiros perseguidos por motivos políticos. Ele ampara gregos e troianos. Em 1964, brasileiros asilaram-se na embaixada boliviana. Anos depois oficiais golpistas bolivianos asilaram-se na embaixada brasileira e o governo esquerdista do general Juan José Torres deu-lhes salvo-condutos em 37 dias.
 
Carlos Lacerda asilou-se por alguns dias na embaixada de Cuba e João Goulart pediu asilo territorial ao Uruguai. Em poucos meses, o governo do marechal Castello Branco concedeu salvo-condutos a todos os asilados que estavam em embaixadas estrangeiras. Já o do general Médici, vergonhosamente, fechou as portas de sua representação em Santiago nos dias seguintes ao golpe do general Pinochet e dezenas de brasileiros foram obrigados a buscar a proteção de outras bandeiras. Contudo, nem mesmo Médici deportou estrangeiros para países onde poderiam ser constrangidos. Isso ocorreu durante a gestão do comissário Tarso Genro no Ministério da Justiça, com dois boxeadores cubanos que, posteriormente, voltaram a fugir da Ilha.
 
O direito de asilo é uma linda tradição. Não se deve avacalhá-lo.

28 de agosto de 2013
Elio Gaspari, O Globo
 

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