Nota do Editor
O grande Theodore Dalrymple certa vez disse o seguinte:
Em meus estudos sobre as sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito das propagandas feitas pelo regime não era persuadir ou convencer os cidadãos, nem tampouco informar; o propósito era humilhar. Consequentemente, quanto menos a propaganda correspondesse à realidade, melhor.
Quando as pessoas são obrigadas a permanecer em silêncio ao mesmo tempo em que lhe contam as mais óbvias mentiras; ou, pior ainda, quando elas são forçadas a repetir elas próprias essas mentiras, perdem todo o senso de honestidade.
Consentir com mentiras óbvias faz com que você, de certa forma, se torne também uma pessoa perversa. Qualquer resistência é erodida, e acaba sendo totalmente destruída. Uma sociedade formada por mentirosos emasculados é fácil de ser controlada.
Se você examinar o fenômeno do politicamente correto, verá que ele possui o mesmo efeito. Intencionalmente.
O fato é que a realidade já desmoralizou as idéias econômicas da esquerda há muito tempo (e essa desmoralização pode ser acompanhada em tempo real na Venezuela). A esquerda sabe que essa é uma batalha que ela não tem como vencer. E os esquerdistas mais espertos já perceberam isso há um bom tempo. O que fizeram? Mudaram de estratégia e encamparam uma batalha que eles realmente podem vencer: o controle da linguagem e a conquista da mente.
E eles podem vencer essa batalha porque não têm nenhuma inibição para fazer tudo aquilo que julgam necessário para vencer: mentir, manipular, trapacear, ser abertamente incoerente — nada disso está abaixo deles.
E eles são pacientes. Eles podem perder seguidas batalhas, ano após ano. No entanto, enquanto as coisas estiverem caminhando para o rumo que desejam, não importa quão lentamente, eles sabem que estão vencendo.
O artigo abaixo foi extraído de um livro escrito ainda na década de 1950. Nele, Mises analisa os primórdios deste fenômeno.
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Os socialistas criaram uma revolução semântica capaz de converter o significado dos termos em seu exato oposto.
No vocabulário desta "Novilíngua" — para utilizar um termo criado por George Orwell —, há, por exemplo, a expressão "o princípio do partido". Etimologicamente, 'partido' é derivado do substantivo 'parte'. Mas, na novilíngua, 'parte' passou a significar seu antônimo, 'o todo'. Para os socialistas, 'parte' e 'todo' são sinônimos.
Consequentemente, quando eles se referem ao "princípio do partido", eles não estão se referindo a um partido específico ou a uma parte específica. Eles estão se referindo a toda a sociedade sob seu comando. Trata-se da supressão de toda e qualquer oposição.
Igualmente, 'liberdade' implica o direito de se poder escolher entre consentimento e divergência. Porém, na novilíngua, 'liberdade' significa a obrigatoriedade de consentir incondicionalmente com os ditames socialistas. Significa também a estrita proibição de qualquer discordância.
Essa inversão da conotação tradicional das palavras não representa apenas uma peculiaridade inocente da linguagem socialista. Ao contrário, ela é extremamente necessária para a manutenção desse regime. A ordem social gerada pela abolição da propriedade privada abole toda a autonomia e independência dos indivíduos, desta maneira sujeitando-os às ordens arbitrárias dos planejadores centrais. Consequentemente, tamanha tirania e humilhação jamais teria o apoio das massas caso não fosse camuflada por um linguajar mais sedutor.
Os socialistas jamais conseguiriam conquistar corações e mentes caso declarassem explicitamente que seu objetivo final é rebaixar todos os indivíduos à servidão. Por isso, por motivos de imagem e propaganda, os socialistas optaram pela falsa retórica de que defendem o socialismo junto com a liberdade, uma postura flagrantemente contraditória.
Já nos círculos de debate interno entre eles, a retórica é diferente. Ali, os iniciados não dissimulam suas intenções em relação à liberdade. Para eles, a liberdade, no passado, de fato representou uma característica positiva da sociedade burguesa, pois lhes forneceu a oportunidade de inventar e colocar em prática seus próprios esquemas. Porém, tão logo o socialismo triunfou, não mais havia espaço para — ou mesmo necessidade de — idéias e pensamentos livres e discordantes. Muito menos havia necessidade de se tolerar iniciativas autônomas da parte dos indivíduos.
Uma vez implantado o socialismo, qualquer mudança representaria uma intolerável perturbação no perfeito estado alcançado pela humanidade, que agora vive sob as bênçãos do socialismo. Sob tais condições paradisíacas, seria loucura tolerar qualquer discordância.
Para os socialistas, a liberdade é um preconceito burguês. O cidadão comum não possui idéias próprias; ele não escreve livros, não promove heresias, e não inventa novos métodos de produção. Ele simplesmente desfruta a vida. Ele não dá valor aos intelectuais que apenas "querem o seu bem" e que ganham a vida fomentando a discórdia e a luta de classes.
Ao longo de sua carreira, Marx jamais confiou no povo e jamais acreditou que este pudesse espontaneamente exigir alterações no "arranjo burguês" e implantar o arranjo que Marx defendia. Os trabalhadores nunca foram entusiastas do socialismo. Eles apoiavam o movimento sindical cuja luta por maiores salários Marx desprezava como inútil. Eles pediam por todas aquelas medidas de interferência do governo nas empresas, medidas essas que Marx rotulava como tolices pequeno-burguesas. Eles se opunham ao progresso tecnológico — nos primórdios, destruindo as novas máquinas; mais tarde, utilizando os sindicatos para, por meio da coerção, forçar o empregador a contratar mais operários do que o necessário.
O sindicalismo — a apropriação das empresas pelos trabalhadores que nela trabalham — é um programa que os trabalhadores desenvolveram espontaneamente. Já o socialismo foi trazido para as massas por intelectuais de procedência burguesa. Jantando e tomando vinhos conjuntamente nas luxuosas mansões londrinas e nas mansões rurais da "sociedade" vitoriana, damas e cavalheiros com trajes elegantes planejavam esquemas para converter o proletariado britânico ao credo socialista.
Como a revolução não veio espontaneamente, teve de ser imposta "pelo bem do povo".
Ao mesmo tempo em que dizem defender a liberdade, os socialistas defendem abertamente que a redução da liberdade e a submissão a seus ditames é um preço a ser pago pela obtenção de mais prosperidade. Em sua novilíngua, "não vale a pena" ter liberdade se ela gera pobreza. Sacrificar a liberdade com o intuito de "trazer riqueza para as massas" é plenamente justificável, dizem eles.
Para os poucos e rebeldes individualistas que quiserem a liberdade de se recusar a aceitar os ditames socialistas, o destino será o mesmo dos camponeses ucranianos que morreram esfaimados por Stalin.
As populações que aceitaram a promessa de trocar um pouco de liberdade por um pouco mais de prosperidade ficaram sem ambas.
09 de setembro de 2016
Instituto Ludwig von Mises
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