Os "rolezinhos" tornaram-se o assunto deste verão. Os encontros de um número expressivo de jovens em shoppings de São Paulo são considerados por muitos como uma espécie de continuação das manifestações de desencanto e indignação de junho passado.
Há, de fato, aspectos em comum. Como as passeatas a céu aberto contra a péssima gestão do Estado brasileiro, os "rolezinhos" reúnem participantes que marcam o encontro previamente pelas redes sociais.
Em ambos, grupos oportunistas de vários matizes ideológicos procuram pegar carona na notoriedade desses movimentos.
No caso dos "rolezinhos", comerciantes e frequentadores dos shoppings e, depois, a sociedade foram pegos de surpresa. Pois, assim como as manifestações de inverno, a moda do verão surgiu inesperadamente e se tornou o tema predominante das últimas semanas.
Mas há diferenças que não podem ser desprezadas. O rastilho de pólvora das manifestações foi o aumento do preço do transporte urbano e, depois, o movimento ganhou corpo com outras reclamações difusas. Não há, no caso atual, um discurso unificado de reivindicações. Não há sequer uma reivindicação expressamente declarada.
Recentemente, jovens marcaram um "rolê" em Itaquera a pretexto de diversão. Houve reação dos proprietários de shoppings e das autoridades. Isso acendeu o debate com vezos políticos e ideológicos.
Muitos a favor, muitos contra. A sensação que fica é que apoiar os "rolês" é de esquerda e condená-los é de direita. Isso é ridículo, pois interdita o debate, não traz solução.
Aliás, é o que vem ocorrendo em diversas frentes: o debate morre, reduzido a ideologia de almanaque ou a meras disputas entre quem é o "bonzinho" e quem é o "mauzinho".
Não faz sentido ideologizar ou politizar os "rolezinhos". Ser ou não ser politicamente correto não é nem deve ser a questão. O que temos de defender é a integridade física das pessoas que frequentam locais públicos ou privados de uso coletivo.
Também não se pode deixar de lado evidências como o fato de que grupos de mil jovens ou mais (independentemente da classe social, credo ou bairro) em espaços inadequados podem provocar se não depredações e agressões, como já ocorreu, sustos, correrias e atropelos.
A sociedade demanda códigos e padrões de comportamento para que os direitos de todos sejam assegurados. Da mesma forma que não se deve andar de skate em hospitais nem conversar durante um espetáculo, não é aceitável superlotar casas de eventos para não se repetirem tragédias como a da boate Kiss. Em recintos fechados, não é razoável dar margem a tumultos que ponham em risco a segurança das pessoas.
A liberdade de marcar encontros pela internet é uma novidade que demanda cuidados. Uma chamada pode reunir 20 ou 20 mil pessoas. Como controlar uma multidão sem um mínimo de planejamento e organização? Em São Paulo, qualquer evento que reúna determinada quantidade de pessoas, por lei, exige ação da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), do Corpo de Bombeiros, do Samu (Serviço Atendimento Médico de Urgência) e da Polícia Militar.
Eventos sem as medidas de cautela necessárias podem provocar desastres. Como esvaziar um shopping lotado em caso de incêndio? Em caso de tumulto, como evitar acidentes com pessoas mais velhas ou com alguma deficiência? Como proteger as crianças? Como prevenção, é preciso, com bom senso, coibir aglomerações e correrias em qualquer local sem a estrutura necessária.
Ou seja: seu "rolezinho" termina onde começa o do outro, pois a liberdade de cada cidadão é delimitada pela dos demais.
18 de janeiro de 2014
Andréa Matarazzo, Folha de SP
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