Nossa democracia, com apenas 29 anos, terá o privilégio nas próximas semanas de reencontrar-se com dois de seus marcos históricos: o golpe militar que derrubou o presidente João Goulart, iniciado em 31 de março de 1964, e o formidável movimento popular para restabelecer a normalidade política, o “Diretas Já”, lançado em janeiro de 1984 e cuja apoteose deu-se em 16 de abril, no comício do Vale do Anhangabaú, São Paulo, considerado o maior de nossa história, com a participação de quase 2 milhões de manifestantes.
As duas penosas décadas desfilarão praticamente juntas, recapituladas e compactadas num oportuníssimo showroom político entre o fim de março e meados de abril. Serão possivelmente atualizadas com passeatas, “rolezinhos”, “rolezões” e outras modas e manias atiçadas pelas insatisfações e o início da controversa Copa do Mundo em junho-julho.
Estudada, debatida, exercitada, testada, a democracia é obra em construção – aberta, incompleta, interminável, imperfeita, porém a melhor já inventada para regular as relações entre cidadãos.
Enquanto não chega a temporada de releituras e revisões, devemos examinar com atenção e cautela os desdobramentos da agenda política com o olhar e a disposição de estudantes em aulas práticas. Tudo à nossa volta tem a ver com a proteção e/ou o aperfeiçoamento do processo democrático. Somos todos herdeiros de Alexis de Tocqueville (1805-1859), jurista e sociólogo francês deslumbrado com o cotidiano do processo democrático na América do Norte.
Nosso noticiário cotidiano converteu-se numa espécie de guia prático de um transcendental tratado sobre democracia. A decisão do TSE de impedir o Ministério Público de investigar infrações eleitorais, o esforço de partidos para manter doações de empresas para o financiamento de candidaturas, a formação de coligações com o único fim de aumentar o tempo de exposição na tevê, o esforço para acabar com o voto obrigatório, a incontrolável multiplicação de partidos, a resistência de repartições públicas em adotar o estatuto da transparência informativa e a desobediência de magistrados às decisões do CNJ são alguns dos tópicos de uma extensa pauta de inspiração autoritária que corre impunemente nas cortes, legislativos, antessalas, gabinetes e corredores de governantes sem que soem os indispensáveis alarmes.
A crença de que a continuidade do calendário eleitoral e a posse dos eleitos são suficientes para garantir o pedigree democrático do Estado produz equívocos trágicos: a Rússia parece uma democracia – é uma caricatura –, o recente plebiscito egípcio sugere uma legítima consulta popular – é uma farsa. A oligarquia Sarney já dura 48 anos: tem 19 anos mais que a nossa democracia e os seus mecanismos de alternância no poder. O golpe preventivo aplicado pelo general Henrique Lott em novembro de 1955 garantiu a posse de JK, mas abriu caminho para quarteladas “bem intencionadas”.
O Estado de Direito, intangível, intocável, não pode conviver com transgressões, mesmo microscópicas, ou inofensivas ambiguidades. Logo descobriremos os porquês.
As duas penosas décadas desfilarão praticamente juntas, recapituladas e compactadas num oportuníssimo showroom político entre o fim de março e meados de abril. Serão possivelmente atualizadas com passeatas, “rolezinhos”, “rolezões” e outras modas e manias atiçadas pelas insatisfações e o início da controversa Copa do Mundo em junho-julho.
Estudada, debatida, exercitada, testada, a democracia é obra em construção – aberta, incompleta, interminável, imperfeita, porém a melhor já inventada para regular as relações entre cidadãos.
Enquanto não chega a temporada de releituras e revisões, devemos examinar com atenção e cautela os desdobramentos da agenda política com o olhar e a disposição de estudantes em aulas práticas. Tudo à nossa volta tem a ver com a proteção e/ou o aperfeiçoamento do processo democrático. Somos todos herdeiros de Alexis de Tocqueville (1805-1859), jurista e sociólogo francês deslumbrado com o cotidiano do processo democrático na América do Norte.
Nosso noticiário cotidiano converteu-se numa espécie de guia prático de um transcendental tratado sobre democracia. A decisão do TSE de impedir o Ministério Público de investigar infrações eleitorais, o esforço de partidos para manter doações de empresas para o financiamento de candidaturas, a formação de coligações com o único fim de aumentar o tempo de exposição na tevê, o esforço para acabar com o voto obrigatório, a incontrolável multiplicação de partidos, a resistência de repartições públicas em adotar o estatuto da transparência informativa e a desobediência de magistrados às decisões do CNJ são alguns dos tópicos de uma extensa pauta de inspiração autoritária que corre impunemente nas cortes, legislativos, antessalas, gabinetes e corredores de governantes sem que soem os indispensáveis alarmes.
A crença de que a continuidade do calendário eleitoral e a posse dos eleitos são suficientes para garantir o pedigree democrático do Estado produz equívocos trágicos: a Rússia parece uma democracia – é uma caricatura –, o recente plebiscito egípcio sugere uma legítima consulta popular – é uma farsa. A oligarquia Sarney já dura 48 anos: tem 19 anos mais que a nossa democracia e os seus mecanismos de alternância no poder. O golpe preventivo aplicado pelo general Henrique Lott em novembro de 1955 garantiu a posse de JK, mas abriu caminho para quarteladas “bem intencionadas”.
O Estado de Direito, intangível, intocável, não pode conviver com transgressões, mesmo microscópicas, ou inofensivas ambiguidades. Logo descobriremos os porquês.
18 de janeiro de 2014
Alberto Dines, Gazeta do Povo, PR
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