Em geral, define-se uma democracia pela mais simples e óbvia de suas características: a possibilidade de acesso ao poder de todos os cidadãos e cidadãs, seja qual for a cor de sua pele — e desde que não tenham dívidas a pagar com os tribunais do país.
O mesmo critério se aplica ao acesso ao mercado de trabalho, com mais uma condição lógica: a eficiência no exercício da profissão que os cidadãos escolherem. No Brasil de hoje, no entanto, números oficiais mostram que o mercado obedece a exigências que ferem essas normas. O Dieese, que estuda essa área, informa que o mercado tem exigências — obviamente informais e não confessadas — que favorecem homens e brancos, e discriminam mulheres e negros.
Segundo o IBGE, o mercado de trabalho do país viveu até agora bom momento: as taxas de desemprego têm sido as menores da história: algo em torno de 6%. Mas outros ventos têm soprado e a economia começa a viver uma fase difícil. Aumenta o número de desempregados — e, entre eles, a maioria é de negros e mulheres.
Entende-se que, quando a economia não anda muito saudável, diminua a quantidade de empregos disponíveis. E obviamente os candidatos mais qualificados consigam ser contratados antes daqueles que passaram menos tempos nas salas de aula, em todos os níveis. Mas preocupa e envergonha o fato de que candidatos com melhor formação escolar sejam homens e brancos.
Não é uma questão de preconceito contra mulheres e negros — e sim consequência natural, embora cruel, de dois problemas históricos: a escravidão e o machismo. A nação começou a existir com mulheres cuidando da cozinha e das crianças — e sempre longe na biblioteca — e negros na senzala.
Não há mais senzalas, nem sobrevive (pelo menos em tese) a ideia de que o lugar da mulher é na cozinha ou cuidando das crianças.
E é com desagradável surpresa, portanto, que descobrimos a realidade: mulheres e negros são maioria entre os cidadãos desempregados. Pior: são também maioria entre os brasileiros que buscam emprego há mais de um ano. Mesmo agora, quando está caindo a taxa geral de desemprego no país.
Diversos fatores podem ter produzido esse fenômeno. Mas não dá para negar: este paraíso da cordialidade e da boa vontade ainda não conseguiu se livrar do demônio do preconceito. É uma vergonha nacional.
20 de agosto de 2013
Luiz Garcia, O Globo
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