Disparada do dólar agrava risco de inflação e ameaça bandeira dos juros baixos; condução da economia torna-se ainda mais difícil
Por dever de ofício, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou na semana passada que não têm fundamento as análises pessimistas a respeito do crescimento da economia brasileira.
Não se exclui, é claro, que o ministro de fato acredite no que diz. Ele tem razão, por exemplo, ao lembrar que a inflação está em queda --ao menos por ora-- e ao depositar alguma esperança nas licitações de obras de infraestrutura, neste segundo semestre.
A realidade, porém, se mostra mais complexa --a começar pelo câmbio. Apesar das intervenções do Banco Central, o dólar disparou nas últimas semanas e, ontem, fechou o dia acima de R$ 2,40.
Verdade que a valorização da moeda americana é um fenômeno global. Mas sua intensidade no Brasil tem sido maior que a média.
Uma das consequências para o país é o agravamento do risco inflacionário. Com o dólar mais caro, aumentam os custos das empresas que utilizam insumos importados, e repasses ao consumidor tendem a ser inevitáveis. Estima-se que, com a atual cotação, a inflação possa subir de 6,27% (acumulada em 12 meses) para até 7%.
A desvalorização do real também impõe prejuízos bilionários à Petrobras --a estatal importa combustíveis e os revende a um preço inferior, sob controle do governo. A empresa clama por um reajuste para não inviabilizar planos de investimento, mas cada 10% de aumento na gasolina eleva o IPCA em meio ponto percentual.
Há também o represamento das tarifas de transporte e energia. A falta de planejamento do governo desorganizou a área elétrica. Esgotaram-se os recursos de fundos setoriais e será inevitável um repasse ao consumidor.
Fica claro que o trabalho de combate à inflação do BC não é facilitado pelo governo. Não por acaso, os juros no mercado só fazem subir, a despeito do crescimento pífio da economia e da grande probabilidade de alta no desemprego.
O mercado financeiro já projeta juros de 10% ao final deste ano e acima de 12% a longo prazo. Começa a desbotar outra das sonhadas bandeiras do governo --a dos juros baixos. Questiona-se, assim, se o crescimento de 2014 será mesmo maior que o deste ano.
O acúmulo de decisões voluntaristas e inconsistentes cobra sua fatura. O ambiente externo mais adverso é apenas o estopim.
Ainda não chega a ser o caso de falar em crise, pois há margem de manobra --do lado fiscal, por exemplo, há o que fazer para restaurar um semblante de seriedade.
Não se pode ignorar, contudo, que certas crises demoram a chegar, mas atingem com mais força aqueles que não se preparam para seus efeitos. E o governo Dilma Rousseff não parece ter-se dado conta de que as dificuldades se avolumam.
20 de agosto de 2013
Editorial da Folha
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