Um deputado condenado pela Justiça, cumprindo pena em regime fechado, que continua deputado porque foi absolvido pelos demais deputados, é tudo o que o povo precisa para odiar a política.
Encarcerado desde o dia 28 de junho em um presídio do Distrito Federal após ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal, Natan Donadon (ex-PMDB-RO) teve seu mandato de deputado federal preservado na noite de ontem. Em votação secreta, o plenário da Câmara registrou 233 votos pela cassação (24 a menos do que o mínimo necessário), contra 131 pela absolvição e 41 abstenções.
O resultado mostra que pode haver resistência da Casa que terá de decidir sobre o mandato de quatro deputados condenados no mensalão.
Condenado a mais de 13 anos de prisão pelo desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia por meio de contratos de publicidade fraudulentos, Donadon foi expulso do PMDB e, egresso do baixo clero na Câmara, estava isolado politicamente.
Aliados entendem que a presença dele em plenário para se defender -- ele conseguiu autorização para sair do presídio --, e o discurso de 40 minutos, emotivo, falando da família, que estava presente, e das agruras na prisão sensibilizou parte dos pares.
A ausência de 108 deputados no dia que geralmente há o maior quórum também beneficiou Donadon. Ele, que demorou alguns segundos para entender o resultado, se ajoelhou no chão, no fundo do plenário, e reagiu com um grito de "não acredito!".
Preocupado com a repercussão na imagem da Câmara, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deixou o painel de votação aberto por 2h30, como forma de aumentar o máximo possível o quórum.
Apesar da absolvição, numa solução de emergência encontrada durante o processo de votação diante da estagnação do quórum, Alves determinou a suspensão do mandato de Donadon, pelo fato de ele estar preso, e a convocação imediata do suplente, o ex-ministro Amir Lando (PMDB-RO).
O advogado de Donadon, Gilson Stefanes, disse que a decisão é ilegal e que irá recorrer. O deputado deseja recuperar o direito de receber o salário de R$ 26,7 mil.
Até a tarde de ontem, líderes das bancadas governistas e de oposição apostavam na cassação. Os discursos na sessão foram unânimes em favor da perda do mandato.
Vários fatores contribuíram para a reviravolta: insatisfação de deputados com o STF, corporativismo, apoio da bancada religiosa -- Donadon é evangélico -- e de parlamentares da ala governista que não querem que os deputados envolvidos no mensalão percam seus mandatos.
Os três deputados em exercício condenados no mensalão --João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) --não votaram. José Genoino (PT-SP) está licenciado.
Primeiro deputado-presidiário desde a volta do país à democracia, em 1985, Donadon reafirmou em seu discurso ser inocente, reclamou das condições carcerárias, incluindo a comida, e disse que não é "ladrão". "Não fiz pagamentos ilegais, não desviei um centavo, pelo amor de Deus, façam justiça senhores deputados!", disse o deputado, em tom inflamado. "Não sou ladrão, nunca roubei nada, é uma acusação injusta!".
Donadon relatou ter sido algemado com as mãos nas costas no camburão que o conduziu.
Ele entrou no plenário de terno, gravata, broche de identificação dos deputados, e chorou ao abraçar a mulher e os dois filhos. Foi cumprimentado por colegas, inclusive pelo presidente da Casa.
A pena aplicada pelo STF deve deixar o deputado em regime fechado até pelo menos setembro de 2015.
(Folha de São Paulo)
29 de agosto de 2013
in coroneLeaks
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