O Tempo noticiou há poucos dias que dois terços dos brasileiros que formam a chamada “geração Y” (entre 25 e 35 anos) prefeririam abrir o próprio negócio a seguir uma carreira profissional. Ouso afirmar que as palavras que mais rondam as mentes desses jovens, atualmente, são “empreendedorismo” e “startup”. Doce ilusão da juventude!
A ideia de capacitar-se para futura inserção em alguma organização funcionalmente hierárquica parece cada vez mais distante dessa moçada. Também, pudera: a crise fiscal do Estado aponta para o enxugamento do número de servidores públicos; e, na iniciativa privada, o imperativo do aumento de produtividade faz com que as empresas incrementem investimentos em capital fixo (notadamente, automação), em detrimento de inversões em capital variável, ou seja, em mão de obra.
Novos estudos evidenciam a vultosa dimensão da crise estrutural de empregabilidade das futuras gerações. Um relatório de Carl Frey e Michael Osborne – dois professores da Universidade de Oxford –, publicado em 2016, sobre as chances de automatização em 702 profissões nos próximos anos, apresenta conclusões estarrecedoras. A título de ilustração, as chances de a inteligência artificial substituir um juiz de direito chegariam a 40%. E dane-se quem for mandado para um presídio por um replicante ou “terminator” de última geração! Tarefas levadas a efeito por jornalistas ou médicos também não tardariam a ser executadas por robôs. E ainda: de acordo com uma pesquisa feita na Austrália, intitulada “The New Work Order”, 60% dos jovens daquele país que estão em vias de entrar no mercado de trabalho escolheram profissões que, no período dos próximos dez a 15 anos, serão “radicalmente afetadas pela automação”. Entrementes, a Foxconn, a famosa montadora chinesa dos gadgets da Apple e da Samsung (conhecida pelo elevado número de funcionários que se suicidam), resolveu, neste ano, reduzir o número de seus empregados de 110 mil para 50 mil.
Mas não se iludam os que apostam no empreendedorismo, especialmente na área digital, como válvula de escape para tão dramática situação. O “The Wall Street Journal”, em matéria veiculada no dia 13 de outubro do ano passado, ao revelar o número pífio de contratações nas empresas consideradas, na atualidade, o “cutting-edge” do setor (entre elas o Facebook e o Google), mostrou, também, que o número de startups de tecnologia, nos EUA, parou de crescer: 64 mil em 1992, 113 mil em 2001. Esse número caiu para 79 mil em 2011 e não se recuperou mais. E vale lembrar para iniciantes que não é bom se meter em briga de cachorro grande. Alguém ainda se lembra do que aconteceu com o Netscape?
Desculpem-me se não pinto o porvir em cores róseas; antevejo um nada admirável mundo novo. E o mais incrível é que um barbudo chamado Karl Marx já previa tudo isso em suas anotações conhecidas como “Grundrisse”, escritas em meados do século XIX. Sorry, jovens empreendedores, mas o horizonte que já desponta no neocapitalismo não é dourado: em vez dos sonhos, believe it or not, barbárie à vista
18 de janeiro de 2017
Sandra Starling
Artigo publicado originalmente no jornal O Tempo.
A ideia de capacitar-se para futura inserção em alguma organização funcionalmente hierárquica parece cada vez mais distante dessa moçada. Também, pudera: a crise fiscal do Estado aponta para o enxugamento do número de servidores públicos; e, na iniciativa privada, o imperativo do aumento de produtividade faz com que as empresas incrementem investimentos em capital fixo (notadamente, automação), em detrimento de inversões em capital variável, ou seja, em mão de obra.
Novos estudos evidenciam a vultosa dimensão da crise estrutural de empregabilidade das futuras gerações. Um relatório de Carl Frey e Michael Osborne – dois professores da Universidade de Oxford –, publicado em 2016, sobre as chances de automatização em 702 profissões nos próximos anos, apresenta conclusões estarrecedoras. A título de ilustração, as chances de a inteligência artificial substituir um juiz de direito chegariam a 40%. E dane-se quem for mandado para um presídio por um replicante ou “terminator” de última geração! Tarefas levadas a efeito por jornalistas ou médicos também não tardariam a ser executadas por robôs. E ainda: de acordo com uma pesquisa feita na Austrália, intitulada “The New Work Order”, 60% dos jovens daquele país que estão em vias de entrar no mercado de trabalho escolheram profissões que, no período dos próximos dez a 15 anos, serão “radicalmente afetadas pela automação”. Entrementes, a Foxconn, a famosa montadora chinesa dos gadgets da Apple e da Samsung (conhecida pelo elevado número de funcionários que se suicidam), resolveu, neste ano, reduzir o número de seus empregados de 110 mil para 50 mil.
Mas não se iludam os que apostam no empreendedorismo, especialmente na área digital, como válvula de escape para tão dramática situação. O “The Wall Street Journal”, em matéria veiculada no dia 13 de outubro do ano passado, ao revelar o número pífio de contratações nas empresas consideradas, na atualidade, o “cutting-edge” do setor (entre elas o Facebook e o Google), mostrou, também, que o número de startups de tecnologia, nos EUA, parou de crescer: 64 mil em 1992, 113 mil em 2001. Esse número caiu para 79 mil em 2011 e não se recuperou mais. E vale lembrar para iniciantes que não é bom se meter em briga de cachorro grande. Alguém ainda se lembra do que aconteceu com o Netscape?
Desculpem-me se não pinto o porvir em cores róseas; antevejo um nada admirável mundo novo. E o mais incrível é que um barbudo chamado Karl Marx já previa tudo isso em suas anotações conhecidas como “Grundrisse”, escritas em meados do século XIX. Sorry, jovens empreendedores, mas o horizonte que já desponta no neocapitalismo não é dourado: em vez dos sonhos, believe it or not, barbárie à vista
18 de janeiro de 2017
Sandra Starling
Artigo publicado originalmente no jornal O Tempo.
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