Num período de apenas três semanas entre si, dois eventos terão buscado chamar a atenção da elite econômico-financeira baseada em Nova York. No último dia 9, Jack Ma, fundador do Alibaba, grupo de empresas de transações on-line e atualmente o homem mais rico da China, atraiu centenas de pessoas para conhecerem sua visão não apenas dos negócios de sua companhia, mas também de como o futuro da tecnologia e do comércio internacional impactarão EUA, China –enfim, o mundo.
No próximo dia 29, Dilma Rousseff vai a Nova York no intuito de seduzir essa mesma audiência, composta pelos estratos superiores de bancos de investimento, fundos de private equity, seguradoras, agências de classificação de risco etc. Isso se dá no contexto da visita presidencial aos EUA –Dilma estará com Obama no dia seguinte.
O palco para que Dilma transmita sua mensagem será um evento intitulado “Infraestrutura Brasil”. E, nesse quadro de atração de capitais, a ida a Nova York é muito mais importante que o encontro em Washington.
SUCESSO DE JACK MA
O evento com Jack Ma representou um estrondoso sucesso. Realizou-se sob o guarda-chuva institucional do Economic Club of New York, entidade mais que centenária e que garantiu ao empreendedor chinês grande visibilidade.
Foram inúmeras referências nas redes sociais. Entusiasmadas colunas em ícones como “Financial Times”, “The Wall Street Journal” e “The New York Times”. Destaques nos relatórios semanais de diferentes instituições financeiras. Repercussões que apontam para os feitos de um capitalismo de risco e superação do qual por vezes os próprios norte-americanos se esquecem.
Há vários elementos na apresentação de Jack Ma que poderiam servir de parâmetro ao que Dilma pretende apresentar no final do mês. É possível assistir à fala do empreendedor chinês na internet.
De saída, é impressionante como nessas ocasiões de convencimento da elite econômica é importante ser um bom orador. Assim é Jack Ma, um grande vendedor de si próprio, da companhia que fundou e da China que vem por aí.
EM 17 MINUTOS
O líder do Alibaba, empresa que realizou o maior IPO da história e que ao fim deste ano tem tudo para ser maior do que o Walmart em valor de mercado, não utilizou uma única lâmina de power point para apoiar seus argumentos. Apesar de ter à frente algumas notas preparadas de antemão, em ocasião alguma socorreu-se delas. Falou do coração –em inglês– e num total de apenas 17 minutos.
Nas apresentações que fez no exterior, e como promete ser no dia 29, Dilma em geral lê um texto longo, preparado previamente e ao fim de uma manhã de seminário. A essa altura, os presentes já foram bombardeados por apresentações de power point. Tais intervenções enfadonhas costumam ser feitas por ministros ou funcionários do governo que falam em português e assim delegam aos soporíferos tradutores toda a linguagem do convencimento.
Foi assim num evento da US Chamber em Washington em 2012, num seminário do Goldman Sachs em NY em 2013 ou em Davos no ano passado. Todas ,ocasiões desperdiçadas por Dilma para uma melhor apreciação das oportunidades que o Brasil apresenta como destino de investimentos.
POUCOS CHINESES
Outra grande vantagem que a equipe de Jack Ma arquitetou para sua recente apresentação em NY foi a orientação de seu discurso a uma plateia que, efetivamente, ele buscava atingir. Mais de mil pessoas se acotovelaram no salão principal do Waldorf Astoria (tradicional hotel, agora de propriedade chinesa), e entre elas havia poucos chineses.
Todos os principais colunistas da mídia econômica global, como Gillian Tett, do “Financial Times”, haviam sido convidados com insistência previamente. No próprio dia do evento, “The Wall Street Journal” publicou um artigo de opinião de Jack Ma.
A excitação com sua fala foi tamanha que o Quartz (site sobre negócios globais) publicou matéria com o título “Será que Jack Ma está concorrendo à Presidência dos EUA?” De fato, o fundador do Alibaba modulou suas palavras de modo a encantar agentes econômicos e mídia especializada e, no limite, a opinião pública americana.
Nos eventos organizados pelo governo brasileiro no exterior, a grande maioria dos presentes é formada por brasileiros, sejam eles potenciais investidores e parceiros, sejam jornalistas ou as enormes delegações oficiais. O foco das apresentações é muito voltado para o público interno (no Brasil) e orientado a como as coisas vão repercutir em audiências brasileiras.
PERSEVERANÇA E HUMILDADE
Mas talvez a mais valiosa dica que se pode extrair da apresentação de Jack Ma –e que melhoraria imensamente o impacto da fala de Dilma– é a combinação entre perseverança e humildade.
O público americano –e a elite política e de negócios baseada nos EUA– adora exemplos de gente, empresas e países que conseguem “dar a volta por cima”. O próprio Bill Clinton, com sua carreira de (muitos) altos e (poucos) baixos, já foi apelidado de “The Comeback Kid”.
Jack Ma contou à elite americana que não sabia o que eram os EUA. Tinha uma ideia do que era a internet e de seu potencial, mas nos primeiros anos de operação de sua empresa equivocou-se redondamente. Abandonou suas convicções iniciais e conseguiu construir esse gigante que é o Alibaba.
Ele tem plena convicção de que apenas 2% das operações de sua empresa se dão fora da China. Sabe que, de agora em diante, vai precisar cada vez mais dos EUA, seja na condição de fonte de fornecimento de produtos, seja como mercado-destino.
POSTURAS VENDEDORAS
O Brasil também deveria valer-se muito mais do mercado importador americano e de robustos capitais para programas de concessões e expansão da infraestrutura. Isso, no entanto, demanda posturas mais “vendedoras”, e não o oficialismo de apresentações estatais. Wall Street não é o Conselho do Mercado Comum do Mercosul.
Dilma poderia dar uma grande contribuição à superação da atual desconfiança e do desalento quanto aos rumos do Brasil. Para tanto, é preciso ir além de discursos prefabricados ou intermináveis power points.
Seria importante que, em termos de política econômica e visão de mundo, a chefe de governo pronunciasse um solene “erramos”. Este seria um ótimo ponto de partida para uma reconciliação produtiva entre o Brasil e seus potenciais parceiros.
22 de junho de 2015
Marcos Troyjo
Folha
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