Os graves problemas verificados nos planos de saúde - de gestão temerária a desvio de recursos - colocam em risco a cobertura de 2,7 milhões de servidores públicos. Essa categoria de trabalhadores é atendida por 34 operadoras. Muitas registram rombos constantes no caixa e dívidas com fornecedores, apesar do subsídio anual de R$ 3 bilhões pagos pelo governo
Sob investigação da ANS e com patrimônio negativo, operadoras correm risco de deixar beneficiários na mão.
Pelo menos 2,7 milhões de servidores públicos que pagam pesadas mensalidades a 34 planos de saúde específicos da categoria podem ficar sem atendimento. Afetados pela má gestão e envoltos em suspeitas de desvio de recursos e de superfaturamento de contratos, os convênios vêm registrando rombos constantes de caixa, acumulam faturas gigantescas com fornecedores e prestadores de serviços e, em vários casos, estão com patrimônio negativo.
Ou seja, se fossem encerrados hoje, não teriam recursos suficientes para honrar todos os compromissos — apesar de receberem, regiamente, subsídios do governo. A ineficiência dos planos de saúde custa aos cofres públicos cerca de R$ 3 bilhões ao ano.
Os dados são alarmantes, reconhece a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que já interveio em pelo menos três das operadoras que atendem o funcionalismo público: a Fundação de Seguridade Social (Geap), o Serviço Social das Estradas de Ferro (Sesef) e a Fundação Assistencial dos Servidores do Incra (Fassincra). Juntas, atendem 614 mil pessoas, que já sofrem diante do forte encolhimento da rede credenciada e das constantes recusas de médicos e laboratórios.
A Fundação Assistencial dos Servidores do Ministério da Fazenda (Assefaz), com 94 mil associados e deficit de R$ 37 milhões em 2012 pode engrossar o grupo. A entidade está sob fiscalização do Ministério Público Federal.
Na Geap, os desmandos são tão grandes que, mesmo ostentando uma das maiores carteiras de clientes no país, quase 600 mil associados, o patrimônio líquido positivo de mais de R$ 29 milhões ficou negativo em R$ 56,8 milhões apenas de 2011 a 2012. Isso significa dizer que as perdas, no período, foram de pelo menos R$ 86 milhões. Não à toa, o plano está sob intervenção direta da ANS e da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), responsável pela fiscalização do fundo de pensão administrado pela entidade.
Se a Geap ainda indica a possibilidade de recuperação, no Sesef e na Fassincra, a ANS se deu por vencida, tamanhas as dificuldades encontradas. Para tentar garantir o atendimento dos clientes do Serviço Social das Estradas de Ferro, a agência reguladora permitiu que migrassem para outra operadora. No caso do plano dos empregados do Incra, a alienação da carteira já foi decretada. No ano passado, o Sesef e a Fassincra computaram saldos negativos de R$ 56,6 milhões e R$ 35,5 milhões, respectivamente.
Casa arrombada
Apesar de a ANS estar agindo para garantir o mínimo de transtornos aos servidores e aos familiares, os especialistas alertam para a demora do órgão regulador em agir. “Infelizmente, a agência só chega quando a casa está arrombada”, assinala um funcionário do Ministério do Planejamento, que acompanha o assunto de perto. O caso mais emblemático para ilustrar esse atraso é o da Geap.
A ANS só entrou na fundação em março deste ano, quando as dívidas passaram de R$ 260 milhões e davam sinais de total descontrole. No Sesef, em 2011, o buraco já estava em R$ 45 milhões e, na Fassincra, no mesmo ano, o patrimônio havia sido reduzido a R$ 2 milhões, quase nada para um convênio com tantas responsabilidades.
A ANS alega que está fazendo a sua parte. Tanto que, recentemente, proibiu a Geap e a Assefaz de comercializarem planos de saúde, até que resolvam seus problemas e recuperem a capacidade de garantir atendimento à clientela conforme manda a lei. O problema é que as fundações, junto de outras empresas do setor, recorreram à Justiça para se livrarem das punições. E somente na semana passada a agência conseguiu liminar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para manter as sanções aos planos que desrespeitam os consumidores.
Sem argumentos consistentes para justificarem uma deterioração tão rápida da situação patrimonial, Geap, Fassincra e Sesef jogam a culpa pelas mazelas na longevidade dos conveniados. As operadoras alegam que o crescimento do número de idosos nas carteiras, consequência do aumento da expectativa de vida da população, provoca desequilíbrios nas finanças, tendo em vista que os beneficiários se utilizam mais dos serviços.
Essa é, no entender do setor, a razão de um levantamento da ANS mostrar que 40% dos planos existentes no país hoje estão inscritos na Dívida Ativa da União e quase 180 convênios estarem em liquidação extrajudicial ou em processo de direção fiscal.
Autogestão
No caso dos sistemas fechados a servidores públicos, acrescentam as operadoras, a situação é agravada pelo fato de os planos abrangerem todos os aposentados dos órgãos e empresas vinculados a eles. Essa modalidade é denominada autogestão, ou seja, um convênio coordenado pelo departamento de recursos humanos de uma pessoa jurídica — empresa privada ou órgão público.
Como a reposição do funcionalismo está menor, o número de ativos que contribuem não é suficiente para bancar os gastos com aposentados, pensionistas e os grupos familiares. Em média, calcula a Unidas, associação de planos de saúde de autogestão, os idosos representam, 22% da carteira dos planos.
R$ 3 bilhõesMontante em subsídios anuais concedidos pelo governo federal ao setor
BÁRBARA NASCIMENTO Correio Braziliense
Sob investigação da ANS e com patrimônio negativo, operadoras correm risco de deixar beneficiários na mão.
Pelo menos 2,7 milhões de servidores públicos que pagam pesadas mensalidades a 34 planos de saúde específicos da categoria podem ficar sem atendimento. Afetados pela má gestão e envoltos em suspeitas de desvio de recursos e de superfaturamento de contratos, os convênios vêm registrando rombos constantes de caixa, acumulam faturas gigantescas com fornecedores e prestadores de serviços e, em vários casos, estão com patrimônio negativo.
Ou seja, se fossem encerrados hoje, não teriam recursos suficientes para honrar todos os compromissos — apesar de receberem, regiamente, subsídios do governo. A ineficiência dos planos de saúde custa aos cofres públicos cerca de R$ 3 bilhões ao ano.
Os dados são alarmantes, reconhece a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que já interveio em pelo menos três das operadoras que atendem o funcionalismo público: a Fundação de Seguridade Social (Geap), o Serviço Social das Estradas de Ferro (Sesef) e a Fundação Assistencial dos Servidores do Incra (Fassincra). Juntas, atendem 614 mil pessoas, que já sofrem diante do forte encolhimento da rede credenciada e das constantes recusas de médicos e laboratórios.
A Fundação Assistencial dos Servidores do Ministério da Fazenda (Assefaz), com 94 mil associados e deficit de R$ 37 milhões em 2012 pode engrossar o grupo. A entidade está sob fiscalização do Ministério Público Federal.
Na Geap, os desmandos são tão grandes que, mesmo ostentando uma das maiores carteiras de clientes no país, quase 600 mil associados, o patrimônio líquido positivo de mais de R$ 29 milhões ficou negativo em R$ 56,8 milhões apenas de 2011 a 2012. Isso significa dizer que as perdas, no período, foram de pelo menos R$ 86 milhões. Não à toa, o plano está sob intervenção direta da ANS e da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), responsável pela fiscalização do fundo de pensão administrado pela entidade.
Se a Geap ainda indica a possibilidade de recuperação, no Sesef e na Fassincra, a ANS se deu por vencida, tamanhas as dificuldades encontradas. Para tentar garantir o atendimento dos clientes do Serviço Social das Estradas de Ferro, a agência reguladora permitiu que migrassem para outra operadora. No caso do plano dos empregados do Incra, a alienação da carteira já foi decretada. No ano passado, o Sesef e a Fassincra computaram saldos negativos de R$ 56,6 milhões e R$ 35,5 milhões, respectivamente.
Casa arrombada
Apesar de a ANS estar agindo para garantir o mínimo de transtornos aos servidores e aos familiares, os especialistas alertam para a demora do órgão regulador em agir. “Infelizmente, a agência só chega quando a casa está arrombada”, assinala um funcionário do Ministério do Planejamento, que acompanha o assunto de perto. O caso mais emblemático para ilustrar esse atraso é o da Geap.
A ANS só entrou na fundação em março deste ano, quando as dívidas passaram de R$ 260 milhões e davam sinais de total descontrole. No Sesef, em 2011, o buraco já estava em R$ 45 milhões e, na Fassincra, no mesmo ano, o patrimônio havia sido reduzido a R$ 2 milhões, quase nada para um convênio com tantas responsabilidades.
A ANS alega que está fazendo a sua parte. Tanto que, recentemente, proibiu a Geap e a Assefaz de comercializarem planos de saúde, até que resolvam seus problemas e recuperem a capacidade de garantir atendimento à clientela conforme manda a lei. O problema é que as fundações, junto de outras empresas do setor, recorreram à Justiça para se livrarem das punições. E somente na semana passada a agência conseguiu liminar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para manter as sanções aos planos que desrespeitam os consumidores.
Sem argumentos consistentes para justificarem uma deterioração tão rápida da situação patrimonial, Geap, Fassincra e Sesef jogam a culpa pelas mazelas na longevidade dos conveniados. As operadoras alegam que o crescimento do número de idosos nas carteiras, consequência do aumento da expectativa de vida da população, provoca desequilíbrios nas finanças, tendo em vista que os beneficiários se utilizam mais dos serviços.
Essa é, no entender do setor, a razão de um levantamento da ANS mostrar que 40% dos planos existentes no país hoje estão inscritos na Dívida Ativa da União e quase 180 convênios estarem em liquidação extrajudicial ou em processo de direção fiscal.
Autogestão
No caso dos sistemas fechados a servidores públicos, acrescentam as operadoras, a situação é agravada pelo fato de os planos abrangerem todos os aposentados dos órgãos e empresas vinculados a eles. Essa modalidade é denominada autogestão, ou seja, um convênio coordenado pelo departamento de recursos humanos de uma pessoa jurídica — empresa privada ou órgão público.
Como a reposição do funcionalismo está menor, o número de ativos que contribuem não é suficiente para bancar os gastos com aposentados, pensionistas e os grupos familiares. Em média, calcula a Unidas, associação de planos de saúde de autogestão, os idosos representam, 22% da carteira dos planos.
R$ 3 bilhõesMontante em subsídios anuais concedidos pelo governo federal ao setor
BÁRBARA NASCIMENTO Correio Braziliense
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