Viagens da presidente, para inaugurações comezinhas em diversos cantos do país, inscrevem-se na lógica eleitoral já utilizada por Lula
Por que não apostar no que dá certo? O governo Lula foi marcado pelas constantes viagens do presidente, a pretexto de inaugurações de obras e eventos nos mais diversos pontos do país.
O clima de permanente campanha eleitoral, alimentado por discursos ainda mais ziguezagueantes que seus deslocamentos, ajudou a manter a popularidade de Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo durante seus tempos de menor fausto.
Advertida, talvez, pelo brusco declínio de popularidade que se seguiu às manifestações de junho, a presidente Dilma Rousseff intensifica sua agenda de inaugurações pelo país. De 1º de janeiro a 15 de outubro deste ano, foram 51 dias de viagem, contra 36 no mesmo período de 2012 e 43 em 2011.
A praxe de comparecer a eventos festivos compõe a rotina de qualquer governante. A nota consternadora se faz sentir, contudo, tão logo surgem especificados os motivos oficiais de cada ocasião.
Fortaleza, Ceará, 3 de abril: "cerimônia de entrega de máquinas retroescavadeiras e motoniveladoras", informa o site da Presidência. João Pessoa, Paraíba, 4 de março: "cerimônia de entrega de 22 máquinas retroescavadeiras". Cascavel, Paraná, 4 de fevereiro: "cerimônia de entrega de 29 máquinas retroescavadeiras".
A pontualidade do Planalto nesse tipo de distribuição é impressionante. A menos que se trate de algum tipo de código para despistar os órgãos de espionagem americanos, tanta prioridade concedida ao maquinário de tração pesada parece denunciar a falta de coisa mais significativa a oferecer.
Um presidente brasileiro já declarou, no passado, que governar é construir estradas. Outros políticos dizem que o importante não é dar o peixe, mas ensinar a pescar.
Juntem-se os dois lemas e provavelmente se concluiria que governar não é mais construir estradas, mas dar motoniveladoras para que, nos municípios, cada qual encontre o seu próprio rumo.
A Presidência não se restringe, cabe reconhecer, ao interesse por tais equipamentos. O programa Minha Casa Minha Vida oferece ocasião para muitas outras solenidades --ainda que nem sempre à altura de uma das maiores economias do mundo, muito menos proporcionais à extensão das carências da população atendida.
Em Campinas, São Paulo, em 29 de agosto, a presidente esteve na entrega de 520 unidades habitacionais do programa. Anteontem, em Vitória da Conquista, Bahia, foram mais 1.740 casas.
A Copa do Mundo haverá de propiciar, sem dúvida, momentos mais grandiosos --enquanto investimentos realmente importantes em infraestrutura marcam passo há vários anos.
Mas o importante para Dilma Rousseff, agora, é o palanque: nenhuma obra se constrói tão rapidamente, em terreno já aplainado por seu antecessor.
17 de outubro de 2013
Editorial da Folha
Nenhum comentário:
Postar um comentário