"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A COVARDIA DE CHICO: QUANDO NÃO RESTAR MAIS NENHUM ARGUMENTO, ATAQUE A GLOBO

A covardia de Chico Buarque: quando não restar mais nenhum argumento, ataque a Globo. Os idiotas costumam zurrar de satisfação!

Este post tratará da incrível covardia intelectual de Chico Buarque e demonstrará o truque vigarista a que recorre para defender um ponto de vista autoritário, estúpido. Mas, antes, é preciso fazer algumas considerações.
 
Chico não é tema novo neste blog. Por ocasião do Prêmio Jabuti, que ele costumava ganhar por inércia — não escrevia o melhor romance, mas o melhor livro… —, a coisa pegou fogo. Sei o quanto me custou o embate.
Os “amigos de Chico”, que formam uma verdadeira legião, poderosa como os demônios, estão em toda parte e tentaram me esmagar. Mas, como diria Lula, tenho o couro duro (ele, na verdade, falou “casco”; cada um na sua, né?).
A coisa, no entanto, era de tal sorte ridícula que o Prêmio Jabuti mudou, conforme, diga-se, eu defendia. Agora, o “melhor livro” tem de ser escolhido entre os melhores de cada categoria. O debate não era literário. Nada tinha a ver com a qualidade do escritor Chico Buarque, embora eu considere sofrível a prosa do bom letrista. Um dos que saíram em sua defesa foi Caetano Veloso, num texto em que me chamou de “Ronaldo Azevedo”. Respondi. Agora, os dois estão juntos numa nova empreitada: em defesa da censura prévia.
 
Sim, Caetano é aquele senhor que se fantasiou de black bloc e posou para uma foto. Em texto, chegou a dizer que eles “fazem parte” — preferiu omitir o complemento nominal, no seu estilo “cogitus interruptus”. Andamos batendo boca. Ele lá no Globo. Eu aqui. De novo, não se cuidava da qualidade do seu trabalho. Gosto de várias músicas de Caetano. Com o tempo, tornou-se um grande cantor.
O talento para isso e aquilo não torna os artistas imunes à crítica quando decidem dar opinião fora da sua especialidade. A opinião estúpida sobre isso e aquilo, igualmente, não compromete a qualidade de sua obra. Não acho Chico um péssimo romancista porque ele se diz de esquerda. Não gosto é daquela dita “prosa poética”, mas esse particular não tem importância agora.
 
Não pretendo usar a questão da censura para demonstrar que eu estava certo nos embates que mantive com ambos no passado. A defesa que a dupla passou a fazer da censura expõe, no entanto, a bolha de alienação da realidade e, sim!, de autoritarismo em que viviam. Ai de quem, pouco importava o tema, se atrevesse a contestá-los. Como dois aiatolás do pensamento, expediam as suas fatwas — especialmente Caetano, que é mais histriônico, mas, à sua maneira, intelectualmente mais honesto. Chico costuma arrumar alguns braços que dão porradas em seu lugar. É mais sorrateiro, como constatei no caso do Prêmio Jabuti.
 
O adversário de qualquer um deles, pobrezinho!, quase sempre estava fadado ao ridículo. Ou lhe pespegavam a pecha de ressentido e invejoso ou, como aconteceu comigo, de “reacionário” e “direitista”. Logo, se alguém é uma dessas duas coisas, ou as duas, como pode estar certo? Ainda que sustente que dois mais dois são quatro, deve haver algo de suspeito nisso. Afinal, se a matemática, para a direita e para a esquerda, segue sendo a mesma, resta no ar a suspeita da trapaça, não é mesmo?
 
Nesse episódio lamentável da defesa que passaram a fazer da censura, há, sim, aspectos positivos.
Em primeiro lugar, essas estrelas colaboraram para dar ao caso uma visibilidade que, de outro modo, talvez não tivesse — em parte, devemos ser gratos à espantosa inteligência de Paula Lavigne e à elegância com que argumenta.
 
Em segundo lugar, consolida-se uma verdade, na contramão de uma estupidez que sempre me incomodou no país: nossos artistas não devem ser tomados como nossos filósofos; menos ainda como nossos guias morais. Devemos amá-los, detestá-los ou ignorá-los por aquilo que produzem.
 
Em terceiro lugar, sólidas reputações do chamado “progressismo” deixaram finalmente claro que mundo têm em mente e qual seu horizonte de uma sociedade livre. Tudo isso, creio, pode ser didático. Em quarto lugar, e agora falo de um ambiente que conheço mais de perto, noto que caiu a ficha, como se diz, de muitos jornalistas, que integravam a turma do gargarejo dessas celebridades-intelectuais. É bem verdade que já existem por aí candidatos a ocupar, no futuro, o lugar dos aiatolás atuais. Wagner Moura será, um dia, como Chico Khomeini e Caetano Khamenei. Se o ator diz que o PSOL é legal, a despeito do desastre que essa gente produz na educação da cidade do Rio, os socialistas da Zona do Sul, com vista para o mar, não ousam contestar. Se preciso, ajoelham-se diante da figura do deputado estadual Marcelo Freixo, o que vê o caos passar na janela e dá uma de Carolina, como se seu partido não fosse um dos promotores da desordem.
 
Muito bem. Começo a voltar da digressão que fiz. Chico Buarque escreveu um artigo no Globo em que faz a defesa escancarada da censura, expondo experiências pessoais que, segundo se entende, devem ser tomadas como argumentos.
Chega a ser constrangedor. Não há ali uma só ideia que possa ao menos ser combatida porque não há ideia nenhuma. O texto vai se desenvolvendo em torno do nada. Aí lhe bateu uma iluminação: “Por que não atacar a Globo no jornal O Globo?”. Além de mostrar a sua suposta independência, desperta a solidariedade dos estúpidos, num momento em que os defensores da censura estão perdendo a batalha.
 
Escreve ele:

“Nos anos 70 a TV Globo me proibiu. Foi além da Censura, proibiu por conta própria imagens minhas e qualquer menção ao meu nome. Amanhã a TV Globo pode querer me homenagear. Buscará nos arquivos as minhas imagens mais bonitas. Escolherá as melhores cantoras para cantar minhas músicas. Vai precisar da minha autorização. Se eu não der, serei eu o censor.”
 
Retomo
  
No mundo inteiro, inexiste uma emissora do tamanho e da importância relativa da Globo que esteja tão à esquerda, qualquer que seja o tema. Trata-se, obviamente, da esquerda aggiornata, que deixou o socialismo pra lá. Nem a China se preocupa mais com isso, certo? Cuida-se hoje é da chamada esfera de valores. A emissora fez uma cobertura absolutamente simpática aos movimentos de rua; adere, sem recusar o proselitismo, a todas as causas das minorias (nas novelas, programas de entretenimento e jornalismo) e trata com franca hostilidade opiniões consideradas “conservadoras” ou “reacionárias”. Suas novelas esbarram no mau gosto do didatismo à moda realismo socialista — mas, reitero, com esse viés inclusivo. Ou não se viu até merchandising pró-aborto e contra a internação de viciados na novela das 21h? Para arremate, não custa lembrar que as Organizações Globo tornaram público um mea-culpa pelo apoio dado à ditadura militar.
 
Cadê a Globo “reacionária”? Ocorre que esse fantasma precisa existir para que os pterodáctilos tenham uma causa. Se não for para controlar a Globo, “controlar a mídia” por quê e para quê? Aliás, desconfio que, sob o comando petista, ela seria um tantinho mais, como direi?, conservadora. Ocorre que atacar a emissora é o último refúgio de quem já não tem mais argumento.
 
Desculpas a peso de ouro

Se é verdade que houve o tal banimento de Chico da Globo na década de 70 (não pesquisei para saber se a emissora se redimiu disso também), cumpre observar, então, que, antes de pedir desculpas pelo apoio dado à ditadura, a empresa pediu desculpas ao próprio Chico. E na forma de um contrato que, à época, se dizia milionário. Refiro-me ao programa “Chico & Caetano”, que foi ao ar entre e 25 de abril a 26 de dezembro de 1986, com roteiro do sempre excelente Nelson Motta.
 
Chico Buarque poderia ter dito um sonoro “não” ali, não é mesmo? Afinal de contas, tecnicamente, o Brasil ainda era uma ditadura — a mesma ditadura, mas já esculhambada, por cujo apoio a Globo se penitenciou depois. Mas ora, ora… Ao “esquerdista” Chico pareceu, certamente, inteligente e útil ter um programa no horário nobre da emissora. Os vídeos estão no Youtube. Abaixo, segue o do primeiro, a que vocês poderão assistir mais tarde se quiserem.
 

 
Caetano canta, a partir dos 6min35s, uma de suas mais belas canções: “Milagres do povo”. Há lá coisas como:
“Quem é ateu e viu milagres como eu
Sabe que os deuses sem Deus
Não cessam de brotar, nem cansam de esperar
(…)
E o povo negro entendeu que o grande vencedor
Se ergue além da dor
(…)”
Há Nietzsche e Fernando Pessoa misturados aí. Como há Shakespeare diluído em “Pedaço de mim”, de Chico, como me alertou meu amigo Carlos Marchi. Querem ver (não está no vídeo acima)?
 
 
Chico
“Leva o vulto teu
que a saudade é o revés de um parto,
a saudade é arrumar o quarto
do filho que já morreu.”
 
Shakespere

“Grief fills the room up of my absent child,
Lies in his bed, walks up and down with me,
Puts on his pretty looks, repeats his words,
Remembers me of all his gracious parts,
Stuffs out his vacant garments with his form.”
Ou
“Dor enche o quarto de meu filho ausente,
deita em sua cama, anda a meu lado,
sua graça assume, sua fala repete,
me faz lembrar todos os seus encantos,
preenche as roupas ocas com sua forma.”
 
Que grande e notável pensador se saiu este rapaz! Com a censura ainda em funcionamento, aceitou um programa na Globo e deixou para trás as suas mágoas. Aos comunistas amigos, deve ter deixado claro que, como é mesmo?, não “era pelos 20 centavos”, mas em nome da causa.
Em 2013, com o Brasil vivendo, a despeito das suas convicções, é bem verdade, uma democracia plena (ele gosta é do regime cubano), este senhor vem brandir o fantasma de uma Globo que já não existe para defender um procedimento, a censura, que era uma das marcas justamente daquele regime de exceção contra o qual ele criou algumas metáforas.
 
Chico & Caetano poderiam ter continuado a, deixem-me ver como escrever, verter Pessoa, Nietzsche e Shakespeare também para quem sabe assoviar. Em vez disso, resolveram defender a censura virtuosa. Há de pesar em suas respectivas biografias. 
 
17 de outubro de 2013
Reinaldo Azevedo - Veja
 

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