"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 25 de agosto de 2013

"A QUEDA DO REAL"

 
Não há uma corrida do real, mas um retorno ao dólar, com preservação do valor do euro e da moeda chinesa

Desde 3 de maio, há um processo de ajustamento na cotação de diversas moedas de economias emergentes ou fortemente dependentes da exportação de commodities. O câmbio ante o dólar americano de países tão diferentes como Austrália, Brasil, Índia e Turquia desvalorizou-se, respectivamente, entre 3 de maio e quarta-feira passada, em 13%, 22%, 19% e 10%.
 
Dado que as moedas da União Europeia, do Reino Unido e da China não se desvalorizaram ante a americana, há depreciação das moedas de pouco menos de metade da economia mundial em relação a EUA, Europa e China. Este último grupo representa, segundo o dado do FMI para 2011, 54% do produto mundial.
 
O fator que detonou e explica o movimento das diversas moedas foi a elevação da taxa de juros paga pelos títulos longos emitidos pelo Tesouro americano. Em 3 de maio, a taxa dos títulos de dez anos fechou 0,11% acima da cotação do dia anterior, que fora de 1,63% ao ano. Desde então, a partir dessa mínima no dia 2 de maio, a taxa subiu até 2,88% na quinta-feira passada.
 
A correlação simples entre a taxa de câmbio do real (ante o dólar) e a taxa de juros paga pelos títulos de dez anos do Tesouro americano foi, desde 3 de maio, de 97%. Historicamente, a correlação é de 34%. Ou seja, há nos últimos meses uma associação muito maior entre a cotação de nossa moeda e os juros de longo prazo nos EUA do que normalmente.
 
O fato que justifica a elevação da taxa de juros longa na maior economia é a aproximação do momento no qual a política monetária americana será normalizada. Desde a eclosão da crise das hipotecas americanas, em setembro de 2008, a taxa básica de juros fixada pelo banco central americano está em zero. Dado que a taxa longa é a composição das taxas curtas, a perspectiva da aproximação do momento de normalização da política monetária eleva a taxa longa imediatamente.
 
A normalização das condições monetárias passou a ser uma realidade em maio, quando tivemos duas ótimas notícias sobre a economia americana. Como já tive oportunidade de tratar neste espaço, os Estados Unidos estão atravessando bastante bem o "abismo fiscal", isto é, o conjunto de medidas que entraram em vigor em janeiro e em março e que elevou a receita pública, descontada do gasto, em aproximadamente dois pontos percentuais do PIB americano.
 
Ou seja, provavelmente a economia americana crescerá, em 2013, 1,5% em termos reais, simultaneamente a uma redução do deficit do setor público da ordem de 2,5 pontos percentuais do produto. Já se projeta para 2014 deficit de aproximadamente 4% do PIB.
 
A boa notícia é que o custo, em termos de crescimento, para obter o ajuste das contas públicas tem sido muito favorável para a economia americana, particularmente em comparação com a experiência recente dos países europeus.
 
Esse conjunto de boas notícias foi suficiente para o mercado antecipar (com relação ao que imaginava) o momento de elevação dos juros curtos americanos, o que teve impacto sobre os juros longos. Essa avaliação do mercado foi corroborada em 22 de maio, quando Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA), em um pronunciamento ao Congresso, mencionou a possibilidade de iniciar o processo de redução das compras de ativos.
 
Do que vimos até agora podemos depreender algumas conclusões. Primeiro, a passagem no Brasil da desvalorização aos preços domésticos, e destes para a inflação, será menor que no episódio de 2002, quando houve forte corrida do real em razão do risco político percebido.
 
Hoje não há uma corrida do real, mas sim um retorno à moeda americana, com preservação do valor do euro e da moeda chinesa. Parte do ajustamento de preços será pela redução do preço de diversos bens quando expressos em dólares.
 
A segunda conclusão é que, se houver ao longo do segundo semestre uma frustração maior em relação ao desempenho da economia americana, que jogue para adiante o momento de elevação da taxa básica de juros nos EUA, o câmbio no Brasil deve voltar um pouco.
 
Resta entender melhor as especificidades locais do fenômeno. Por que motivo a desvalorização foi de 20% para nós e de 7% para a moeda peruana, por exemplo. Fica para uma futura coluna, se eu conseguir entender melhor o fenômeno.

25 de agosto de 2013

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