Os militares da ativa são proibidos de se manifestar politicamente, mas tudo tem limites e eles sempre dão um jeito de fazê-lo, em defesa dos interesses nacionais. Desde o ano passado eles estão criticando o governo abertamente. Até agora nenhum deles foi punido, e é importante que eles tenham o direito de desabafar, desde que continuem preservando suas limitações constitucionais e respeitando as regras democráticas, que precisam ser mantidas a qualquer custo.
As críticas abertas começaram no final do ano passado, depois da reeleição de Dilma Rousseff, quando dois oficiais generais surpreenderam os mais de 200 participantes da Convenção da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (Adesg), realizada no Clube Naval, em Brasília.
O major-brigadeiro do Ar Carlos Eurico Peclat, foi um deles. Criticou duramente a incompetência do governo. “Podemos dobrar a produção agrícola, mas não há como escoar. Quem está estudando isso?”, indagou, afirmando que os Estados Unidos têm como política de Estado defender os interesses do povo, mas no Brasil isso não está acontecendo, porque falta planejamento a nosso governo.
O major-brigadeiro fez também um duro relato sobre a situação de abandono dos índios. Disse que a Aeronáutica os contrata para trabalhar nas obras dos aeroportos da Amazônia, mas isso pouco adianta. “Quando o serviço termina, eles não têm o que fazer, ninguém os ampara”, lamentou, acrescentando: “O índio quer se integrar à sociedade brasileira, mas o Estado não aparece. Só aparece em época de eleição”, desabafou Peclat.
NÃO HÁ PROGRAMA DE GOVERNO
Na Convenção da Adesg, outro oficial da ativa, general de brigada Lauro Pires, também criticou a falta de um programa de governo. E não poupou a atuação do Ibama, por atrasar a concessão de licenciamentos de projetos vitais ao país. “Leis não faltam. O que falta é bom senso”, frisou.
Em seguida, passou a dar exemplos de falta de decisão administrativa. Criticou o governo do Distrito Federal, dizendo não ser admissível que Brasília ainda não faça coleta seletiva de lixo. Citou uma proposta do Exército ao governo do DF, para instalação de uma usina de reciclagem de material de construção, que seria rentável, dizendo que há dois anos aguardava alguma resposta das autoridades de Brasília.
Criticou os termos da concessão da Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima, dizendo que houve um retrocesso no Estado, que tinha um grau de dependência do governo federal de apenas 37% de suas necessidades ,e agora subiu para 85%.
Defendeu, então, o controle das organizações não-governamentais. “Há 340 mil ONGs no Brasil, das quais 120 mil na Amazônia, e o interesse maior é a biodiversidade. O Hemisfério Norte tem apenas entre 80 e 90 da biodiversidade, mas controla a quase totalidade das patentes sobre as riquezas ambientais do Hemisfério Sul”, lamentou.
FALA O COMANDANTE
O próprio comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, tem dado declarações de caráter. Recentemente, fez questão de dizer que não há possibilidade de intervenção militar, que é uma iniciativa prevista na Constituição. Na semana passada, ele subiu o tom e disse ver risco de as dificuldades atuais virarem uma “crise social” que afete a estabilidade do país, o que, segundo ele, diria respeito às Forças Armadas. “Estamos vivendo situação extremamente difícil, crítica, uma crise de natureza política, econômica, ética, muito séria e com preocupação que, se ela prosseguir, poderá se transformar numa crise social com efeitos negativos sobre a estabilidade”, afirmou.
O militar prosseguiu: “E aí, nesse contexto, nós nos preocupamos, porque passa a nos dizer respeito diretamente”.
Villas Bôas deu as declarações em inédita videoconferência para 2.000 oficiais temporários da reserva, os R2, que se prepararam durante o serviço militar, mas não seguiram carreira. A palestra foi transmitida para oito comandos pelo país e seus principais trechos circulam na internet.
POLÍTICOS SEM PREPARO
Agora vem o general Antonio Hamilton Martins Mourão, que comanda o Exército na Região Sul, fazer críticas à classe política em uma palestra recente. Disse que a eventual substituição da presidente da República não altera de fato o “status quo”, porque a maioria dos políticos de hoje parecem privados de atributos intelectuais próprios e de ideologias, enquanto dominam a técnica de apresentar grandes ilusões que levam os eleitores a achar que aquelas são as reais necessidades da sociedade”, segundo o colunista Tulio Milman, do jornal Zero Hora, em conferência no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva de Porto Alegre.
Foram divulgadas teve acesso a fotografias que mostram Mourão realizando uma apresentação em slides. Em um deles, o general afirma que mudar é preciso: “Neste momento de crise, toda consciência autônoma, livre e de bons costumes precisa despertar para a luta patriótica, contribuindo para o retorno da autoestima nacional, do orgulho de ser brasileiro e da esperança no futuro”, afirma o texto.
SUBSTITUIÇÃO DE DILMA
O general Mourão defendeu a tese de que “a mera substituição da PR [presidente da República] não trará uma mudança significativa no ‘status quo'”, acrescentando em seguida que “a vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção”. O texto do slide é concluído com a seguinte frase: “É nosso dever esclarecer a opinião pública, notadamente a juventude”.
Bem, quando os oficiais-generais estão só falando, é até bom, porque é preciso saber o que eles pensam, e isso serve para dar um certo freio de arrumação, como se diz atualmente. O problema é quando os militares estão tramando e armando… Nossa sorte é que na atual geração não surgiu nenhum Golbery do Coutto e Silva, caso contrário o país já estaria de cabeça para baixo.
23 de outubro de 2015
Carlos Newton
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