A petição que Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior entregaram ontem ao presidente da Câmara dos Deputados é novo e autônomo pedido de impeachment de Dilma Rousseff. Não é aditamento ao primeiro que os mesmos Bicudo e Reale Júnior entregaram antes. Poderia até ser. A lei permite aditamento a qualquer petição inicial, às denúncias, às queixas, às representações e até mesmo aos recursos. Somente quanto a estes (recursos) é que a lei exige, para que a petição recursal seja aditada, a superveniência de fato novo após sua interposição, uma vez que os recursos, uma vez interpostos, são inalteráveis por parte de quem interpôs. A isso se dá o nome de Princípio Consumativo dos Recursos. |
Este segundo pedido de impeachment de Bicudo e Reale Júnior, mesmo sem conhecer o teor de suas 64 páginas, pode-se garantir, sem sombra de dúvida, que se trata de peça irrespondível. Seja quem for o deputado-presidente, é certo que o presidente da Câmara dos Deputados vai receber a denúncia e mandar processá-la como manda a lei. Mesmo sendo o Eduardo Cunha. É quem ocupa o cargo de presidente da Câmara dos Deputados que tem o poder e a competência para receber denúncia de impeachment contra o presidente da República. Seja ele (o deputado-presidente) um santo ou um pecador. Um ficha suja, ou quase suja, ou um ficha limpa. É indiferente a reputação de quem ocupa o cargo. Está na Constituição Federal.
Eduardo Cunha vai receber esta segunda petição-denúncia de Bicudo e Reale Júnior. Se Cunha for cassado (ou renunciar) depois, o ato presidencial não é invalidado. Elege-se outro presidente e o processo de Impeachment não sofre solução de continuidade e prossegue.
LIMINARES
As liminares de dois ministros do STF contra a atuação de Eduardo Cunha não ataram as mãos nem reduziram os poderes do presidente da Câmara. Apenas impediram, contra eventual recusa do recebimento da denúncia, que fosse interposto recurso para o plenário da Câmara. Aliás, nada mais democrático e compatível com o contraditório e com o amplo direito de defesa, pró réu e pró societatis. Instituir recurso nunca é demais. Negá-lo ou deixar de criá-lo é que é prepotente e absolutista. Mas as liminares são bobagens. Deixem-nas prá lá. Não mudam nada.
Apesar delas, o presidente da Câmara continua com o poder que a Constituição a ele outorga, que é o de receber a denúncia, no caso, esta segunda petição-denúncia contra Dilma Rousseff, desta vez com a prova da prática de crime no exercício do mandato.
Em entrevistas, Bicudo e Reale Júnior, que não são dois jovens iniciantes, amadores e leigos, disseram que anexaram provas oficiais de que Dilma, em 2015, no exercício do mandato, portanto, continua praticando as chamadas “pedaladas fiscais”. E isso é crime de responsabilidade que justifica plenamente o recebimento da denúncia e culmina com a decretação do afastamento da presidente. É indefensável. Dilma cavou o próprio buraco para nele cair. Nem a defesa de Dilma poderá alegar que usou dinheiro da CEF, do Banco do Brasil, do BNDES…para dar casa e comida aos pobres. Ou seja, a chamada “nobilis causae”, que seria, a princípio, exclusão de ilicitude.
Não é. A lei de responsabilidade fiscal (LRF) não excepciona tal exclusão. Nem a hipótese da “caridade governamental” é contemplada pelo Código Penal que diz no artigo 23 “Não há crime quando o agente pratica o fato em estado de necessidade, em legítima defesa, ou no estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”.
PÚBLICO E PRIVADO
O particular pode fazer com o seu dinheiro o que bem entende. É o Direito Privado. Já com o Direito Público não é assim. Para a realização de obras públicas e programas sociais é imprescindível existir plano, receita e diretriz orçamentária previamente aprovadas pelo Congesso Nacional. Portanto, o crime da presidente não se encaixa naquelas situações de exclusão de ilicitude que o artigo 23 do Código Penal prevê.
Dilma tem seus dias contados como presidente. Recebida a denúncia, o rito é aquele previsto na lei 1079/1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. E tratando-se de lei, está acima do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, que diante dela sucumbe. Mesmo na hipótese (descartável) de Eduardo Cunha não receber a denúncia e mesmo diante das liminares-provisórias de dois ministros do STF, que impedem recurso da parte de qualquer deputado para o plenário da Câmara, ainda assim, a decisão denegatória da denúncia, que obrigatoriamente deverá ser fundamentada, desafia Mandado de Segurança para o Supremo Tribunal Federal.
Contra todas as decisões da administração pública, expedidas por qualquer poder da República e do punho de qualquer de seus agentes, sempre cabe Mandado de Segurança que, no caso em tela, pode ser impetrado por qualquer cidadão-eleitor, pessoa mais do que legitimada à impetração. Quem vota tem todo o direito de defender ou acusar o eleito. É democrático. É republicano.
23 de outubro de 2015
Jorge Béja
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