Resolvi desabafar antes que comece oficialmente a campanha eleitoral. Quando lembro que neste ano escolheremos presidente, governadores e deputados, sinto um imenso desânimo. Podem me chamar de alienado, de inconsciente, do que for. Só me pergunto:
- Para quê?
Juro! Conseguir com que eu me desinteressasse de política foi um longo processo, levado a cabo por nossos representantes. Sou um filho da década de 1960, como, aliás, nossa presidente. Foram anos marcantes no que se referia ao sonho por um mundo melhor. Mesmo sem saber como, uma grande parcela da juventude, a que eu pertencia, queria, sim, chegar ao poder, mudar o mundo. A própria presidente Dilma era uma revolucionária. Há muita discussão sobre os métodos da esquerda nos anos 1960 e 1970. Mas não vamos anular seu inegável desejo de mudar as estruturas do país. Mesmo que o melhor para mim não seja exatamente o melhor para você... mas isso é outra discussão. Estou falando, apenas, de sonhos.
Muitos amigos meus foram presos, por pertencerem à luta armada. Um dos meus maiores amigos até hoje é Flávio Tavares, o jornalista que foi trocado por um embaixador sequestrado, com quem morei no México. Nunca fui radical. Mas cheguei a fazer teatro popular, na periferia paulistana. Aprendi também a dar aulas pelo método Paulo Freire. Eu também tinha ideais, traduzidos pela política. Hoje, nem gosto muito da palavra idealismo. Costumo brincar, embora não seja exatamente uma piada:
- Mostre-me um idealista e te apontarei um fascista.
Idealistas são sempre encarados de maneira romântica:
- Ah, que lindo, ele tem um ideal! – dizem, enquanto o sujeito perfura alguns abdomes do exército contrário.
O problema do idealista é que ele constrói, em sua cabeça, um mundo para si próprio, para mim e para você. Quem disse que quero viver nesse mundo? (A não ser os que têm um ideal particular, para a própria vida, e isso é com eles.)
Não vou falar de partidos ou candidatos. Já tive sonhos. Hoje, alguns que simbolizavam meus sonhos cumprem pena por corrupção. Fica difícil continuar acreditando. Bem fez meu amigo Flávio, que se retirou em Búzios e não quis concorrer a cargo algum.
Vêm as eleições, as promessas, e, depois, elas não são minimamente concretizadas. Na área da educação, por exemplo. Estudei num colégio público em Marília e tive uma formação maravilhosa. Mais tarde, fiz o Colégio de Aplicação, também do governo. Se, durante o governo militar, havia escolas públicas de excelência, por que isso não acontece mais, já que temos intelectuais capacitados no poder?
Nas últimas eleições, eu acabara de vir do Japão e estava entusiasmadíssimo com o trem-bala. Era uma promessa de campanha. Nem foi licitado. Preparo-me para assistir à propaganda dos candidatos, com a certeza de que as promessas são vãs. Posso estar errado, ser reacionário. Mas é o que sinto: para que me dedicar a algo tão inútil quanto ouvir políticos em campanhas?
Mesmo porque meus sonhos não estão nesses discursos. Nenhum que me reste ainda, pelo menos. Há muito tempo, os políticos deixaram de representar partidos com linhas de pensamento e atuação específicas. Todo mundo sabe disso, é até bobagem repetir. Não são porta-vozes de ideologias. Mas de pesquisas. Hoje é assim: boa parte dos candidatos não diz como pensa que deve atuar. Diz o que as pesquisas aconselham.
Como autor de novela, estou acostumado a lidar com pesquisas. Sei que elas são mais um estímulo à criação do que a palavra final. Não foi à toa que as manifestações recentes surpreenderam o país. Não apareceram na pesquisa. Existe o que se chama "a voz surda das ruas", o verdadeiro sentimento popular. Muitas vezes não expresso diretamente numa pesquisa, existe de forma subjetiva e pode, sim, explodir.
Os programas dos partidos, o cabelo dos candidatos, a roupa são decididas em pesquisas – não é à toa que, em debates, aparecem muitas gravatas vermelhas. São raríssimos os que provocam alguma torcida.
Um grande grupo de amigos já optou pelo voto nulo. Não proponho abrir mão do direito de votar. Diante das promessas que virão, já sinto uma enorme preguiça. Ninguém sonha com um país melhor, só em vencer a eleição? Quem, afinal, me representa?
No dia certo, votarei. Vou escolher, sim, meus candidatos, porque pode vencer alguém pior. Mas irei sem a menor vontade. Meu voto deixou de ser uma esperança.
- Para quê?
Juro! Conseguir com que eu me desinteressasse de política foi um longo processo, levado a cabo por nossos representantes. Sou um filho da década de 1960, como, aliás, nossa presidente. Foram anos marcantes no que se referia ao sonho por um mundo melhor. Mesmo sem saber como, uma grande parcela da juventude, a que eu pertencia, queria, sim, chegar ao poder, mudar o mundo. A própria presidente Dilma era uma revolucionária. Há muita discussão sobre os métodos da esquerda nos anos 1960 e 1970. Mas não vamos anular seu inegável desejo de mudar as estruturas do país. Mesmo que o melhor para mim não seja exatamente o melhor para você... mas isso é outra discussão. Estou falando, apenas, de sonhos.
Muitos amigos meus foram presos, por pertencerem à luta armada. Um dos meus maiores amigos até hoje é Flávio Tavares, o jornalista que foi trocado por um embaixador sequestrado, com quem morei no México. Nunca fui radical. Mas cheguei a fazer teatro popular, na periferia paulistana. Aprendi também a dar aulas pelo método Paulo Freire. Eu também tinha ideais, traduzidos pela política. Hoje, nem gosto muito da palavra idealismo. Costumo brincar, embora não seja exatamente uma piada:
- Mostre-me um idealista e te apontarei um fascista.
Idealistas são sempre encarados de maneira romântica:
- Ah, que lindo, ele tem um ideal! – dizem, enquanto o sujeito perfura alguns abdomes do exército contrário.
O problema do idealista é que ele constrói, em sua cabeça, um mundo para si próprio, para mim e para você. Quem disse que quero viver nesse mundo? (A não ser os que têm um ideal particular, para a própria vida, e isso é com eles.)
Não vou falar de partidos ou candidatos. Já tive sonhos. Hoje, alguns que simbolizavam meus sonhos cumprem pena por corrupção. Fica difícil continuar acreditando. Bem fez meu amigo Flávio, que se retirou em Búzios e não quis concorrer a cargo algum.
Vêm as eleições, as promessas, e, depois, elas não são minimamente concretizadas. Na área da educação, por exemplo. Estudei num colégio público em Marília e tive uma formação maravilhosa. Mais tarde, fiz o Colégio de Aplicação, também do governo. Se, durante o governo militar, havia escolas públicas de excelência, por que isso não acontece mais, já que temos intelectuais capacitados no poder?
Nas últimas eleições, eu acabara de vir do Japão e estava entusiasmadíssimo com o trem-bala. Era uma promessa de campanha. Nem foi licitado. Preparo-me para assistir à propaganda dos candidatos, com a certeza de que as promessas são vãs. Posso estar errado, ser reacionário. Mas é o que sinto: para que me dedicar a algo tão inútil quanto ouvir políticos em campanhas?
Mesmo porque meus sonhos não estão nesses discursos. Nenhum que me reste ainda, pelo menos. Há muito tempo, os políticos deixaram de representar partidos com linhas de pensamento e atuação específicas. Todo mundo sabe disso, é até bobagem repetir. Não são porta-vozes de ideologias. Mas de pesquisas. Hoje é assim: boa parte dos candidatos não diz como pensa que deve atuar. Diz o que as pesquisas aconselham.
Como autor de novela, estou acostumado a lidar com pesquisas. Sei que elas são mais um estímulo à criação do que a palavra final. Não foi à toa que as manifestações recentes surpreenderam o país. Não apareceram na pesquisa. Existe o que se chama "a voz surda das ruas", o verdadeiro sentimento popular. Muitas vezes não expresso diretamente numa pesquisa, existe de forma subjetiva e pode, sim, explodir.
Os programas dos partidos, o cabelo dos candidatos, a roupa são decididas em pesquisas – não é à toa que, em debates, aparecem muitas gravatas vermelhas. São raríssimos os que provocam alguma torcida.
Um grande grupo de amigos já optou pelo voto nulo. Não proponho abrir mão do direito de votar. Diante das promessas que virão, já sinto uma enorme preguiça. Ninguém sonha com um país melhor, só em vencer a eleição? Quem, afinal, me representa?
No dia certo, votarei. Vou escolher, sim, meus candidatos, porque pode vencer alguém pior. Mas irei sem a menor vontade. Meu voto deixou de ser uma esperança.
18 de fevereiro de 2014
Walcir Carrasco, Revista Época
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