A sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF) teve uma importância explícita para a democracia brasileira, a partir do posicionamento do decano, ministro Celso de Mello, que, a propósito dos embates ocorridos semana passada entre o presidente Joaquim Barbosa e o ministro Ricardo Lewandowski, preferiu deixar de lado eventuais divergências pessoais entre ministros para falar da responsabilidade da instituição, que tem “um papel de imenso relevo, (...) um espaço de grande liberdade”, além de lembrar que “o STF pode ser julgado pela nação e pelos cidadãos da República”.
A sessão teve, além disso, uma importância fundamental para a decisão final que se avizinha, sinalizada pelos dois novos ministros, Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, que marcaram posições a favor de uma celeridade da revisão dos embargos de declaração, sem a intenção de rever decisões já tomadas pela simples razão de serem novos olhares no processo.
Mais de uma vez Barroso disse que se disporia a rever as decisões se a maioria do plenário assim o decidisse, deixando claro que não será ele quem definirá uma revisão do que foi decidido até agora. Mesmo que tenha feito a ressalva de que não se referia à Ação Penal 470, foi importante a sua declaração de que “temos que terminar com a prática de que o devido processo legal é aquele que não termina”, abordando o tema das ações protelatórias.
O presidente do STF, Joaquim Barbosa, aproveitou para retomar o tema que o levou a se confrontar com Lewandowski. Ele, que já afirmara antes que como presidente tinha “que zelar pelo bom andamento dos trabalhos, o que inclui a defesa da transparência e da celeridade da Corte”, aproveitou a deixa para criticar mais uma vez nosso processo jurídico, que permite protelações em cima de protelações, chamando-o de “patético” e “cacofônico”. “Todas as minhas ações estão dentro dessa visão”, salientou Barbosa, que ao final da sessão teve todos os seus votos apoiados pela ampla maioria do plenário do STF.
A questão fundamental da admissibilidade dos embargos infringentes, que deve entrar em discussão talvez na primeira semana de setembro, é que definirá se o processo será reaberto em dois de seus aspectos cruciais, a formação de quadrilha e a lavagem de dinheiro. São temas que envolvem os núcleos político e publicitário do esquema do mensalão e uma revisão de penas pode tirar do regime fechado políticos como o ex-ministro José Dirceu.
O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, disse-me ao final da sessão que está refletindo muito sobre a questão da admissibilidade dos embargos infringentes, “não obstante já tenha me pronunciado no autos desse mesmo processo logo no início do julgamento em função de uma questão preliminar que foi então suscitada”.
Ele lembra que as normas regimentais do Supremo com força de lei “foram recebidas pela nova ordem constitucional com autoridade de lei”, pois assim o permitia a Constituição anterior à de 1988.
Mas depois da Constituição de 1988, o tribunal perdeu “esse poder de legislar em sede regimental”, que passou a ser uma exclusividade do Congresso, que em 1990 aprovou a legislação que trata do processo nos tribunais superiores e não se refere aos embargos infringentes. “A questão deve ser analisada nos seus contextos”, ressalta Celso de Mello.
Ele diz que a questão a ser respondia é: “Houve ou não a revogação tácita da norma regimental que prevê os embargos infringentes, pelo fato de o novo diploma legislativo, a lei 8038 de 1990, haver disciplinado por inteiro a ordem ritual das ações penais originárias tanto do Supremo quanto do STJ?”.
Segundo Celso de Mello, “todos os ministros do tribunal estão na verdade refletindo muito seriamente sobre essa questão, estamos todos reflexivos, por que é um tema realmente delicado”.
22 de agosto de 2013
Merval Pereira, O Globo
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