"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

POR QUE UM GRUPO DE PAÍSES ÁRABES QUER ACABAR COM A REDE DE TV AL-JAZEERA?


Transmissão de jornal televisivo
Esta é a redação da TV Al-Jazeera em Doha, no Qatar
Desde o início de junho o Qatar está isolado de seus vizinhos no Oriente Médio como parte de um pacote de sanções comerciais e diplomáticas impostas contra o país. O governo local é acusado de patrocinar grupos terroristas com a finalidade de gerar instabilidade política na região. Para voltar à normalidade, os vizinhos enviaram uma lista ao governo qatari com 13 demandas, que incluíam a redução das relações com o Irã — um aliado do Qatar e rival da Arábia Saudita — e a retirada de tropas turcas de seu território. Uma das demandas chamou a atenção: os vizinhos pediam o fechamento da rede de notícias Al-Jazeera, controlada pelo governo qatari.
A proposta de fechar a TV foi feita no dia 22 de junho e o Qatar tinha dez dias para responder. O prazo foi estendido por mais 48 horas, e ainda assim não houve acordo.
GRAVIDADE DA SITUAÇÃO – Sameh Shoukry, ministro de relações exteriores do Egito, disse que o governo qatari “não entendeu a seriedade e gravidade da situação”, enviando uma contraproposta “em geral negativa e sem conteúdo”. O bloqueio ao Qatar continua, assim como a Al-Jazeera segue funcionando.
Desde o seu surgimento, em novembro de 1996, a rede de notícias é alvo de críticas e mal estar entre os vizinhos do Qatar. Boa parte de seu staff foi formada por jornalistas da rede inglesa BBC, expulsa da Arábia Saudita por praticar um jornalismo investigativo que incomodava o governo. Os repórteres recém- desempregados encontraram na rede qatari uma chance de recomeçar, levando consigo um padrão de jornalismo mundialmente reconhecido, mas feito na língua árabe. Os regimes de vários países da região, como o saudita e o egípcio, não são exatamente democráticos. Contam com um alto controle sobre a informação que chega à sua população. A Al-Jazeera, contudo, promoveu uma espécie de quebra nesse modelo.
CRÍTICAS AO PODER – O canal introduziu o sinal de TV via satélite, que ignora as fronteiras políticas e chega a telespectadores de toda a região árabe. Pela primeira vez, a audiência de países como Arábia Saudita e Emirados Árabes passou a ter acesso a um conteúdo crítico a figuras de poder.
Na Arábia Saudita, por exemplo, uma pesquisa de 2004 mostrou que 89% das casas possuíam aparelhos com recepção de sinal de satélite. Mais que isso, naquele ano a audiência da Al-Jazeera já era cinco vezes maior do que a da rede Al-Hurra, que contava com investimento americano.
Seu crescimento entre países do Ocidente se deu sobretudo pela cobertura de episódios como o bombardeio do Iraque pelos EUA e pelo Reino Unido em 1998, mas principalmente pela invasão do Afeganistão pelos EUA em 2001 — quando foi por algum tempo a única rede de TV in loco — e pela Primavera Árabe, em 2011.
PRIMAVERA ÁRABE – A relação desgastada no Oriente Médio se acentuou no início da década de 2010, com os protestos da Primavera Árabe. O movimento que pedia a queda de regimes autoritários na região — e que conseguiu ter êxito em alguns casos, como no Egito e na Líbia — abriu espaço para disputas locais de poder. Grupos rivais entraram na briga, em geral apoiados por potências externas. Qatar e Arábia Saudita se viram em pólos opostos nessas disputas.  No Egito, por exemplo, o governo qatari apoia a Irmandade Muçulmana, enquanto os sauditas consideram o grupo como uma célula terrorista.
Mas além de disputar influência sobre os governos pós-Primavera Árabe, o Qatar é acusado de ser o grande fomentador dos protestos exatamente por meio das atividades da Al-Jazeera. Desde então, a rede é tida como a principal ferramenta política do Qatar para desestabilizar regimes rivais na região.
PELA LIBERDADE – O  “New York Times” escreveu em 2011 que a “Al-Jazeera foi amplamente acusada de ajudar a criar a revolta na Tunísia com suas reportagens galvanizadoras”, mesmo tendo “vans e escritórios atacados e queimados” por grupos pró-Ocidente.
“A noção de que há uma luta em comum no mundo Árabe [contra governos totalitários] é algo que a Al-Jazeera ajudou a criar. Ela não causou esses eventos [da Primavera Árabe], mas é quase impossível imaginar tudo isso acontecendo sem a Al-Jazeera”, disse Mary Lynch, professora de Estudos do Oriente Médio na Universidade George Washington, nos EUA, em entrevista ao “New York Times”.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O Nexo Jornal é um excelente site, que publica importantes reportagens e artigos. A TV Al- Jazeera é um fio de esperança de democratização do mundo árabe, está sendo boicotada e a imprensa ocidental não dá o apoio que seria de se esperar. No mundo árabe, as TVs são estatais. O mundo árabe precisa se libertar e progredir. Não adianta que os países sejam ricos, sem que haja distribuição da riqueza. Se a Al-Jazeera sair do ar, os protestos vão incendiar as ruas. Depois da Primavera Árabe, veremos o Inferno Árabe, pois lá não há inverno. (C.N.)

10 de julho de 2017
Rafael Iandoli
Nexo Jornal

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