Prêmio Fake News da Semana: os russos do Buzzfeed |
A imprensa insiste na tese de um "dossiê" que estaria atrapalhando a vida de Donald Trump. Nunca comenta que sua fonte é... o Buzzfeed.
No ano em que a imprensa errou tanto que precisou cunhar a desculpa de que “notícias falsas” (fake news) teriam causado a vitória de Donald Trump que a mídia mundial em uníssono não previu, e como nós previmos, criamos o Prêmio Fake News Semanal para denunciar as verdadeiras notícias falsas (sic) que a grande mídia divulga, crendo que são pequenos sites de boatos que fazem alguma diferença em eleições presidenciais, e não o seu péssimo jornalismo.
O primeiro Prêmio Fake News Semanal vai para a notícia mais divulgada desesperadamente na última semana: a de que russos teriam um dossiê com informações comprometedoras contra Donald Trump.
Não há uma única mísera fonte confiável sobre o assunto (a fonte primária do caso é o Buzzfeed!), mas, por aquelas coincidências da vida que apenas a grande e velha mídia é capaz de nos propiciar, justamente porque tal narrativa se encaixa pari passu à desculpa do Partido Democrata, de Barack Obama e de Hillary Clinton para perder as eleições, está sendo tratada como o novo “escândalo” de Donald Trump antes mesmo de tomar posse – enquanto até a imprensa americana não gastou mais do que uns dois dias tentando vender a tese, que já se revelou a maior furada.
O noticiário fake
O festival de manchetes organizadamente homogêneas para dar a impressão de um extremo trabalho de pesquisa no que é mero copy/paste de jornalistas se citando em círculo, na autofagia jornalística denunciada por Rolf Kuntz, pode ser vista nas matérias de capa de quase todas as revistas semanais desta semana, assim como nas manchetes sensacionalistas de inúmeros veículos de mídia.
A ex-revista Veja chama o caso de O bunga-bunga de Donald Trump. O Diário do C. do Mundo, concordando completamente com a Veja, solta: Perversão sexual e ciberataques: o dossiê da Rússia sobre Trump. O R7 da Record estampa: Dossiê vazado diz que Trump contratou prostitutas e teve conduta “pervertida” em Moscou. O UOL, repercutindo manchete do New York Times, curiosamente admitindo que está verbalizando demais em cima do que não faz sentido e não tem provas, atira às fauces da sociedade a manchete: Como um dossiê com dados não confirmados gerou crise para Trump. A Istoé já preferiu estampar em sua capa o rosto de Donald Trump com um providencial “E agora?” minúsculo abaixo de seu nariz, para imitar um bigodinho de Adolf Hitler. Pelo motivo de “está todo mundo falando que ele é ruim, logo, é melhor dizer que ele é o pior”.
O Globo, comentando sobre o “espião” que vazou o documento ter fugido, diz em tom de trombeta do Apocalipse: Com medo de retaliação russa, autor de dossiê sobre Trump foge de casa, mostrando que o autor do dossiê provavelmente morava com a mãe e preferiu a casa da tia-avó. O tom de “se não há provas, não encontrarmos o autor da não-prova revela que a coisa é pior ainda” prossegue em trocentas manchetes: Ex-espião ligado a dossiê sobre Trump em paradeiro incerto, do português Jornal de Notícias (com este nome, “português” se torna redundância). Ex-agente que revelou dossiê contra Trump está escondido, do Jornal da Band. O show de ato falho Suposto autor de dossiê sobre Trump está desaparecido, do Zero Hora. A Folha preferiu o esquema “fonte quente”: Suposto autor de dossiê contra Trump, ex-espião britânico fugiu, diz mídia (a mídia, que disse que a mídia disse que a mídia disse que a mídia…).
Afinal, por que a mídia inteira parece ter encontrado um pote de ouro no fim do arco-íris e está tão animada em falar de algo que, bem, nem os Democratas, tão desesperados, parecem estar interessados em usar?
Cronologia de fatos curiosamente bizarros
No 4chan, um fórum virtual estilo “pode-tudo”, de onde surgiu também o capiloso movimento alt-right, alguém disse (jornalistas hoje utilizam como fonte “alguém disse algo na internet”) que russos possuíam informações comprometedores sobre Donald Trump. Essas informações incluiriam… bem, Donald Trump ter contratado prostitutas russas para urinarem na cama de Trump e sua esposa e assistirem desenhos animados japoneses com ele. (sério.) Do 4chan, foram parar na sua versão mais profissional, o Buzzfeed.
É possível concordar neste momento com Andrew Klavan, notando que finalmente parece que foi encontrado algum comportamento sexual que é moralmente reprovado pela esquerda.
A fonte de tal zumzumzum na internet era Christopher Steele, ex-agente do M16 britânico, uma das agências de inteligência do Reino Unido. Após se reformar, fundou a empresa privada de investigação Orbis Business Intelligence Ltd, sediada em Londres. Steele, que já trabalhou na Rússia, foi recrutado ainda durante as primárias para levantar informações sobre as possíveis questões envolvendo Donald Trump e a Rússia de Vladimir Putin. Conforme já explicamos nos episódios Putin contra o mundo e Terceira Guerra Mundial do Guten Morgen, o nosso podcast, a geopolítica americana com a Rússia foi a grande pedra de toque destas eleições.
A Record, em seu jornal, afirma que a CNN divulgou o dossiê, e que ele “foi parar até na internet”. Na verdade, a fonte primária de todo o jornalismo mundial repetindo sobre o dossiê é o… Buzzfeed, outro site em que qualquer especialista pode postar o que bem entender sem nada de substancial. Apesar da torção do jornalismo em inverter a fonte, e apesar de a CNN falar em “muitas fontes” que supostamente possui para garantir que o dossiê é legítimo, a fonte pública que “mostrou” o dossiê continuou sendo o Buzzfeed, cujo nome não esconde a que veio.
Uma questão curiosa: por que ninguém havia usado o tal dossiê durante as primárias, se aparentemente quem contratou Christopher Steele nem sequer foram os Democratas? Nem mesmo na eleição de fato, com o fogo pesado de críticas que Donald Trump recebeu mundialmente de uma imprensa que agiu como Relações Públicas de Hillary Clinton? O dossiê já deve apresentar alguns defeitos de fabricação apenas por este fato, quando o Buzzfeed tem mais interesse do que Republicanos e Democratas que gostariam de estar no lugar de Donald Trump.
Quem parece ter chegado mais perto do material e foi Rick Wilson, um conservador que odeia Donald Trump. Wilson provavelmente repassou o dossiê para John McCain, republicano próximo à linha neoconservadora que representa toda a velha política intervencionista dos Republicanos que Trump tratou de derrotar. McCain tem muitos contatos dentro da CIA, para a qual provavelmente entregou o dossiê.
A CIA, ao receber o material, mesmo ainda na gestão Obama (e a sendo a CIA uma agência que pode ser chamada de “pró-statu quo“), viu que o material era pura desinformação russa, arrolou em seu briefing para exemplificar o tipo de desinformação que circula sobre o novo presidente e o material vazou. É onde entra o 4chan e, depois de algum apuro para agradar ao público ávido por fofocaria sobre Donald Trump, o Buzzfeed, com alguma profissionalização na desinformação.
A CIA apresentou o dossiê a Obama e Trump. Não conseguiu apurar a veracidade de nada, apenas afirmou que a fonte é “fidedigna”, o que, para a verdade, significa apenas garantir que alguém realmente afirmou aquilo (no caso, Christopher Steele, que não parece disfarçar muito seu vezo em trabalhar como agente duplo).
O documento do Buzzfeed contem erros brutais, que dificilmente estariam em um documento mais “oficial”, incluindo até mesmo o nome de uma empresa russa escrito erroneamente. No próprio subtítulo do post do Buzzfeed, o site admite que o material “contém erros claros” (a última palavra, posteriormente, foi suprimida), e é de todo “sem verificação”. Esperar que alguém, mormente jornalistas, leiam algo além de manchetes antes de sair espalhando fofocas, é esperar demais nestes tempos de fakenews. Quantas manchetes, que estampam até mesmo as capas de revista dessa semana, comentam que, afinal, a fonte é apenas um dossiê postado no Buzzfeed atolado de erros?
Ben Smith, editor-chefe do Buzzfeed, defendeu a postagem do dossiê fajuto, alegando que a publicação é um “ato de transparência jornalística” em uma “era hiper partidarizada”. Não há notícias de alguém questionando o ato de Ben Smith e do Buzzfeed. Será que alguém engoliria a divulgação de um dossiê falso sobre Hillary Clinton se alguém afirmasse que é “um ato de transparência jornalística”, seja lá o que isso quer dizer?
O curioso, evidentemente, é o esforço envidado por todos os jornais, em uníssono, por dias e dias a fio, colocando como “reportagem investigativa” um cabedal de parágrafos sobre o dossiê de Trump, sobre o que a CIA diz sobre o dossiê de Trump e, o mais hilário, sobre como uma notícia sobre o dossiê de Trump postado em outro jornal falando sobre o dossiê de Trump afeta o que se acredita sobre o dossiê de Trump… sem nunca averiguar se há alguma verdade nos fatos ou informar a seu leitor que a fonte é o… Buzzfeed.
Novamente apelando-se à Teoria da Mera Coincidência, o caso só é requentado desesperadamente, mesmo sem prova nenhuma, em uníssono, quando a notícia, se fosse verdadeira, corroboraria à perfeição a tese de Obama e Hillary de que os russos teriam influenciado as eleições americanas (o que Obama de fato fez com as eleições em Israel). A imprensa, que replica sempre o que dizem New York Times e CNN, vira globalmente um órgão de propaganda do Partido Democrata americano.
Compare-se ao PizzaGate, que foi censurado no Twitter, causando o bloqueio de diversas contas que comentavam o caso, quando diversas fontes primárias, até com fotos, comprovaram que assessores de Hillary Clinton freqüentavam uma “pizzaria” de fachada onde a pedofilia rolava solta. Ou sobre os rituais satânicos, até mesmo envolvendo cadáveres, que descobriram nos e-mails de John Podesta, chefe de campanha de Hillary Clinton. Ou ainda sobre os bizarros cultos no Bohemian Grove… Ou a única fonte que merece destaque mundial é o Buzzfeed?
Nada disso será dito pela imprensa. Porque a imprensa virou uma só, no mundo todo, na era de replicar conteúdo para qualquer site minúsculo ter o mesmo conteúdo de um New York Times. Ao invés de diversidade, a “era da abundância de informação” trouxe homogeneidade global no noticiário. Quando dizem que Trump chamou a CNN e seu Buzzfeed como fonte de “fake news” na melhor entrevista à imprensa de todos os tempos, algum jornalista explica o caso, ou apenas diz que ele fez uma nova “polêmica” e “se recusou a falar com jornalistas”, até mesmo “ferindo a Primeira Emenda”?
Aclarar esse complexo novelo de informações desencontradas era a tarefa do jornalismo. Qualquer grande veículo está preocupado tão somente em disfarçar a mesma narrativa para amenizar para os Democratas, e demonizar Republicanos, sobretudo Donald Trump. Raríssimos e minúsculos veículos, como este Senso Incomum, buscam deslindar este emaranhado de informações desencontradas para esclarecer aos leitores o que acontece no mundo e por que as pessoas, de repente, en masse, todas pensam o que pensam.
E apenas esta história ainda terá desenlaces bem bizarros a serem comentados por aqui…
É por isto que esta semana mereceu ser homenageada com o primeiro Prêmio Fake News Semanal do Senso Incomum, a sempre revelar aos nossos leitores como as pessoas vivem mentiras sem saber das fontes. Afinal, na mesma semana, um boato de que o Twitter excluiria a conta de Donald Trump foi veiculado, e incontáveis veículos nacionais repetiram, tendo até de pedir desculpas pela vergonha, ou trocar o título para disfarçar.
O que, afinal, o jornalismo não fará para continuar acreditando que Donald Trump e sua postura anti-globalista é o mal encarnado?
17 de janeiro de 2017
senso incomum
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