A trama em torno da negociação das dívidas e da crise fiscal dos Estados vai-se tornando cada vez mais complexa.
O novo capítulo começou com a ameaça de governadores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste de decretar estado de calamidade pública caso não consigam do governo federal até R$ 14 bilhões, entre dinheiro novo e autorizações para novos empréstimos.
A demanda decorre da insatisfação com o desfecho da renegociação de dívidas realizada em junho. Pelo acordo, o prazo dos débitos foi estendido em 20 anos. A União deixará de receber R$ 50 bilhões nesse período, valor que será incorporado aos vencimentos mais adiante.
O desconto beneficiou os Estados mais endividados, especialmente no Sudeste. Daí a pressão.
Verdade que o próprio governo Michel Temer (PMDB) deu espaço a esse tipo de iniciativa quando aceitou tratativas individualizadas, como no caso do Rio de Janeiro.
Decretos de calamidade, contudo, terão pouca serventia para aliviar a penúria nos serviços públicos se não resultarem em recursos —e os governadores sabem que, na atual conjuntura, dificilmente conseguirão dinheiro federal.
O levante, assim, tem um componente de autoproteção: trata-se de reduzir riscos de sanções legais a gestores que não consigam manter pagamentos em dia.
O imbróglio, seja como for, pode adquirir caráter pedagógico. Há muito o país precisa encarar com seriedade a raiz dos problemas financeiros estaduais: a prodigalidade nos anos de bonança.
Não é por outra razão que a folha de pagamentos, cuja expansão desenfreada se permitiu alegremente, consome mais de 80% das receitas em vários Estados (se contabilizados todos os itens).
Por trás do inchaço estão insistentes lobbies corporativos, escorados na estabilidade quase incondicional de emprego —o que, diga-se, conduz à ineficiência.
A dívida sem dúvida é assunto grave, mas consome uma fração do que é gasto com folha e inativos.
Não se pode, por outro lado, fechar os olhos nessa situação crítica. A queda das receitas resultante da recessão agrava a indigência dos cofres públicos e afeta sobretudo a população carente, que depende de serviços gratuitos. Aliviar o caixa estadual com a ajuda da União parece inescapável.
A negociação, porém, precisa ser estratégica, com exigência de contrapartidas que permitam almejar melhorias estruturais.
Entre elas reformas que limitem o crescimento da folha e possibilitem investimentos, além da conclusão de acordos que ponham fim à guerra fiscal —o que simplificará o ICMS e trará ganhos de produtividade para o setor privado.
19 de setembro de 2016
Editorial Folha de SP
O novo capítulo começou com a ameaça de governadores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste de decretar estado de calamidade pública caso não consigam do governo federal até R$ 14 bilhões, entre dinheiro novo e autorizações para novos empréstimos.
A demanda decorre da insatisfação com o desfecho da renegociação de dívidas realizada em junho. Pelo acordo, o prazo dos débitos foi estendido em 20 anos. A União deixará de receber R$ 50 bilhões nesse período, valor que será incorporado aos vencimentos mais adiante.
O desconto beneficiou os Estados mais endividados, especialmente no Sudeste. Daí a pressão.
Verdade que o próprio governo Michel Temer (PMDB) deu espaço a esse tipo de iniciativa quando aceitou tratativas individualizadas, como no caso do Rio de Janeiro.
Decretos de calamidade, contudo, terão pouca serventia para aliviar a penúria nos serviços públicos se não resultarem em recursos —e os governadores sabem que, na atual conjuntura, dificilmente conseguirão dinheiro federal.
O levante, assim, tem um componente de autoproteção: trata-se de reduzir riscos de sanções legais a gestores que não consigam manter pagamentos em dia.
O imbróglio, seja como for, pode adquirir caráter pedagógico. Há muito o país precisa encarar com seriedade a raiz dos problemas financeiros estaduais: a prodigalidade nos anos de bonança.
Não é por outra razão que a folha de pagamentos, cuja expansão desenfreada se permitiu alegremente, consome mais de 80% das receitas em vários Estados (se contabilizados todos os itens).
Por trás do inchaço estão insistentes lobbies corporativos, escorados na estabilidade quase incondicional de emprego —o que, diga-se, conduz à ineficiência.
A dívida sem dúvida é assunto grave, mas consome uma fração do que é gasto com folha e inativos.
Não se pode, por outro lado, fechar os olhos nessa situação crítica. A queda das receitas resultante da recessão agrava a indigência dos cofres públicos e afeta sobretudo a população carente, que depende de serviços gratuitos. Aliviar o caixa estadual com a ajuda da União parece inescapável.
A negociação, porém, precisa ser estratégica, com exigência de contrapartidas que permitam almejar melhorias estruturais.
Entre elas reformas que limitem o crescimento da folha e possibilitem investimentos, além da conclusão de acordos que ponham fim à guerra fiscal —o que simplificará o ICMS e trará ganhos de produtividade para o setor privado.
19 de setembro de 2016
Editorial Folha de SP
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