Dilma e Lula passam a ser suspeitos de tramoias contra a Justiça, em inquérito no STF, e patrocinam algo de que não se tem notícia na República
A força-tarefa criada para investigar o petrolão e desdobramentos, a LavaJato, enumera suas ações em etapas. Também se pode decompor esta enorme operação do MP e da Polícia Federal, em conexão com a Justiça paranaense, em uma infinidade de enredos, com diversos personagens da política, do sindicalismo, do universo de estatais, do mundo dos negócios.
Um desses enredos mais sugestivos ganhou na terça-feira um complemento relevante, com o anúncio do ministro do Supremo Teori Zavascki, responsável na Corte por processos de acusados pela Lava-Jato com direito a foro privilegiado, de que aceitara o pedido de abertura de inquérito para investigar, entre outros, a presidente afastada, Dilma Rousseff, e o expresidente Lula, acusados de tentar obstruir a Justiça em investigações coordenadas de Curitiba. Há mais ilustres arrolados no processo: o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Falcão; o ministro da Corte Marcelo Navarro; o ex-senador Delcídio Amaral, os ex-ministros José Eduardo Cardozo, defensor de Dilma no impeachment; e Aloizio Mercadante. Por envolver dois presidentes, já não seria mesmo um inquérito qualquer.
Na sua ponta inicial, está Delcídio, cuja colaboração premiada feita à Lava-Jato mancha a imagem de Dilma — tão protegida por ela —, ao citá-la nas engrenagens que se moveram em Brasília para prejudicar a Lava-Jato e livrar empreiteiros companheiros no STJ.
Daí a inclusão no processo de ministros da Corte, um deles, Marcelo Navarro, acusado pelo então senador de aceitar proposta de Dilma de trocar a indicação ao STJ por voto favorável a pedidos de habeas corpus de empreiteiros encarcerados.
O ex-senador é, ainda, protagonista de manobras com a participação de Lula para a compra do silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, maneira de também prejudicar o trabalho da Lava-Jato.
Mesmo que o ministro Teori tenha desqualificado como prova o grampo em que Dilma e Lula conversam sobre a nomeação do ex-presidente na Casa Civil, o MP considera que outros elementos nessa história permitem que haja investigações acerca da manobra para blindar Lula contra o risco de prisão decretada pelo juiz Sérgio Moro, colocando-o num cargo sob a proteção do foro especial.
Entre as incontáveis histórias desabonadoras, de que fazem parte autoridades sem pudor, levantadas pela Lava-Jato, estas são emblemáticas, porque envolvem dois presidentes, um senador, um candidato a ser nomeado ministro do STJ a qualquer custo e o presidente da própria Corte.
Uma trama de alto escalão que perpassa os três poderes. Exemplo bem lapidado de como, nestes últimos anos, além de se assaltar empresas públicas como a Petrobras, manobrava-se sem limites para intervir no Judiciário, a fim de soltar empreiteiros companheiros detidos em Curitiba.
Este inquérito, dentro do conjunto da obra da Lava-Jato, tem a especial característica de desvendar tramoias articuladas, sem o mínimo respeito à independência constitucional da Justiça e do Legislativo.
Algo nunca visto relatado com tantos detalhes. Sabia-se que existia, mas não se imaginava que uma conspiração como esta chegaria a constar de um inquérito.
19 de agosto de 2016
Editorial O Globo
A força-tarefa criada para investigar o petrolão e desdobramentos, a LavaJato, enumera suas ações em etapas. Também se pode decompor esta enorme operação do MP e da Polícia Federal, em conexão com a Justiça paranaense, em uma infinidade de enredos, com diversos personagens da política, do sindicalismo, do universo de estatais, do mundo dos negócios.
Um desses enredos mais sugestivos ganhou na terça-feira um complemento relevante, com o anúncio do ministro do Supremo Teori Zavascki, responsável na Corte por processos de acusados pela Lava-Jato com direito a foro privilegiado, de que aceitara o pedido de abertura de inquérito para investigar, entre outros, a presidente afastada, Dilma Rousseff, e o expresidente Lula, acusados de tentar obstruir a Justiça em investigações coordenadas de Curitiba. Há mais ilustres arrolados no processo: o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Falcão; o ministro da Corte Marcelo Navarro; o ex-senador Delcídio Amaral, os ex-ministros José Eduardo Cardozo, defensor de Dilma no impeachment; e Aloizio Mercadante. Por envolver dois presidentes, já não seria mesmo um inquérito qualquer.
Na sua ponta inicial, está Delcídio, cuja colaboração premiada feita à Lava-Jato mancha a imagem de Dilma — tão protegida por ela —, ao citá-la nas engrenagens que se moveram em Brasília para prejudicar a Lava-Jato e livrar empreiteiros companheiros no STJ.
Daí a inclusão no processo de ministros da Corte, um deles, Marcelo Navarro, acusado pelo então senador de aceitar proposta de Dilma de trocar a indicação ao STJ por voto favorável a pedidos de habeas corpus de empreiteiros encarcerados.
O ex-senador é, ainda, protagonista de manobras com a participação de Lula para a compra do silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, maneira de também prejudicar o trabalho da Lava-Jato.
Mesmo que o ministro Teori tenha desqualificado como prova o grampo em que Dilma e Lula conversam sobre a nomeação do ex-presidente na Casa Civil, o MP considera que outros elementos nessa história permitem que haja investigações acerca da manobra para blindar Lula contra o risco de prisão decretada pelo juiz Sérgio Moro, colocando-o num cargo sob a proteção do foro especial.
Entre as incontáveis histórias desabonadoras, de que fazem parte autoridades sem pudor, levantadas pela Lava-Jato, estas são emblemáticas, porque envolvem dois presidentes, um senador, um candidato a ser nomeado ministro do STJ a qualquer custo e o presidente da própria Corte.
Uma trama de alto escalão que perpassa os três poderes. Exemplo bem lapidado de como, nestes últimos anos, além de se assaltar empresas públicas como a Petrobras, manobrava-se sem limites para intervir no Judiciário, a fim de soltar empreiteiros companheiros detidos em Curitiba.
Este inquérito, dentro do conjunto da obra da Lava-Jato, tem a especial característica de desvendar tramoias articuladas, sem o mínimo respeito à independência constitucional da Justiça e do Legislativo.
Algo nunca visto relatado com tantos detalhes. Sabia-se que existia, mas não se imaginava que uma conspiração como esta chegaria a constar de um inquérito.
19 de agosto de 2016
Editorial O Globo
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