A desconfiança de que o PT mantinha contas secretas no exterior, de onde retirava dinheiro para financiar suas campanhas eleitorais, inclusive as do ex- presidente Lula e da presidente Dilma, sempre esteve presente na crônica política.
Desde que o marqueteiro Duda Mendonça, em 2005, confessou que fora pago em uma conta não declarada no Caribe aberta a mando o lobista Marcos Valério, até hoje, de acordo com as investigações da Lava-Jato, esse procedimento continuou sendo usado para pagar o marqueteiro João Santana.
Isso significa que o PT atua na ilegalidade pelo menos desde a primeira eleição de Lula, em 2002, e os métodos de lavagem de dinheiro foram sendo aperfeiçoados para tentar esconder as contas secretas.
A teia de contas e bancos pelo mundo montada pela Odebrecht e, segundo as investigações, controlada pessoalmente por Marcelo Odebrecht, serviu para lavar dinheiro desviado da Petrobras para o PT, e pagou os serviços do marqueteiro do momento, assim como Marcos Valério pagou Duda Mendonça no mensalão.
A repetição de métodos criminosos já devidamente comprovados impede que a questão seja tratada pelo Tribunal Superior Eleitoral como banal, pois vários políticos já perderam seus mandatos, de prefeito e governador, devido a abusos do poder econômico muito menos evidentes e sofisticados do que o que agora está sendo desvendado sobre as campanhas da presidente Dilma Rousseff em 2010 e em 2014.
Mesmo que tentem analisar de maneira burocrática a situação posta, interpretando a lei ao pé da letra e sem contextualizar o que representa esse imenso esquema criminoso que está sendo revelado nos detalhes pela Lava-Jato, será um ônus enorme para ministros do TSE fingir que não se depararam com um escândalo sem precedentes na história política brasileira.
Em 2005, tudo era novidade para o mundo político, tanto que provocou choro e ranger de dentes entre os petistas mais sensíveis às questões éticas, que àquela altura já não eram obstáculo à ascensão meteórica do PT ao comando central do país.
Muito antes disso, a ação criminosa de que foram vítimas prefeitos petistas - Toninho, de Campinas, e Celso Daniel, de Santo André - já demonstrava que o caminho do poder petista não seria barrado por pudores de nenhuma espécie.
A consequência da descoberta de grossa corrupção na campanha eleitoral de Lula em 2002 só não teve maior repercussão por um erro estratégico do PSDB, que considerou o então presidente como carta fora do baralho na sucessão presidencial de 2006 e decidiu deixá-lo "sangrar" até o final de seu primeiro mandato.
A recuperação da economia produziu um efeito contrário e ajudou Lula a recuperar o fôlego que parecia ter perdido no início do escândalo. Adaptando-se à situação como o camaleão político que sempre foi, Lula saiu de uma posição de humildade, dizendo-se traído e pedindo desculpas na televisão, para negar até mesmo que tenha existido o mensalão.
Desta vez, não apenas a repetição, mas o aprofundamento do esquema criminoso demonstram que não se deve ter complacência com um partido político que usa de todos os artifícios criminosos possíveis para obter vantagem sobre seus adversários, desde a calúnia e a infâmia, até mesmo desviar dinheiro público para a manutenção de suas atividades político- eleitorais.
O juiz Sérgio Moro já enviou ao TSE os documentos da primeira condenação do ex- tesoureiro do PT João Vaccari, em que está provado o uso do dinheiro desviado da Petrobras para campanhas do PT. A continuidade dessa sistemática utilização de dinheiro público para o caixa de suas campanhas, seja pelo uso de caixa dois, seja pela lavagem através de doações "legais" registradas no TSE, está confirmada em várias delações que confirmam que a campanha presidencial de 2014 também foi irrigada com dinheiro desviado da Petrobras.
Se em 2005 Duda Mendonça acabou sendo absolvido pelo STF, que não viu dolo na sua ação, e safou- se pagando uma multa à Receita Federal, hoje a situação é diferente: a intenção de fraudar as leis está configurada, segundo a PF e os procuradores da Lava- Jato.
Agora, fecha-se o círculo com o esquema da Odebrecht para o marqueteiro João Santana, que pode também ter ajudado o PT em outra circunstância, igualmente criminosa: a Polícia Federal apura a suspeita de que empresas dele trouxeram de Angola para o Brasil cerca de US$ 16 milhões, em 2012, numa operação de lavagem de dinheiro para beneficiar o PT.
Não há como negar as evidências, e o mundo político já joga com a alternativa de o PMDB, diante da realidade, decidir- se pelo impeachment da presidente Dilma para evitar a cassação da chapa pelo TSE.
26 de fevereiro de 2016
Merval Pereita, O Globo
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