Vivemos um tempo de subversão de valores. A cultura da transgressão vem assumindo, no Brasil, proporções alarmantes. O verbo transgredir é conjugado em todos os tempos. Ser transgressor passou a ter, em muitos círculos, auréola de respeitabilidade.
02 de julho de 2014
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.
Na sua raiz está a motivação econômica, agravada com a formação histórica de ser o País herdeiro de uma estrutura patrimonialista, onde o Estado é detentor de grandes riquezas. No setor público, a relação incestuosa entre empresas, governos e partidos políticos responde por recorrentes transgressões que vem se tornando fato normal da vida nacional.
Ser amigo de quem estiver no governo é a filosofia do capitalismo tupiniquim conectado com o poder. A competitividade é desprezada, a gestão empresarial é relativizada, o objetivo é fortalecer o incesto econômico. O Estado, pela conivência dos governantes, é capturado pelos interesses dos grandes grupos econômicos. O que leva a sabedoria popular raciocinar com grande lógica: a pessoa jurídica (a empresa) não vota, mas elege a pessoa física (o candidato).
Os custos das eleições gerais de 2010, de acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em relação às doações das grandes empresas dos três candidatos presidenciais Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva, atingiu o montante de R$ 266.236.997,83. Para as eleições de 2014, os partidos competitivos PT, PSDB e PSB, com os seus candidatos Dilma, Aécio e Eduardo, projetam arrecadação junto a grandes grupos e empreiteiras, valores da ordem de R$ 500 milhões. Somando-se às disputas estaduais e a eleição de parlamentares, pode-se estimar um custo total acima de 1 bilhão de reais.
Em 2010, na lista dos maiores doadores, como pessoas jurídicas, a Construtora Camargo Corrêa doou R$ 103,2 milhões; a Construtora Andrade Gutierrez, R$ 63,3 milhões; o Frigorífico JBS S/A, R$ 63,1 milhões; a Construtora Queiroz Galvão, R$ 49,3 milhões; a Construtora OAS, R$ 44 milhões, integram a seleção dos 20 maiores doadores, de acordo com o TSE. Demonstrando que as empresas lançam a maior parcela das despesas eleitorais no Brasil. O Instituto Kellogg já demonstrou que de cada um real doado a candidatos, as empresas obtém R$ 8,50 em contratos públicos. Equivale a 850%, um retorno fantástico.
Os partidos políticos, não obstante receberem milhões de reais do Fundo Partidário e gozarem de isenção fiscal para a transmissão do chamado, equivocadamente, horário eleitoral gratuito, passaram ultimamente a contar com fantásticos recursos a título de doação de grandes empresas. Por coincidência, os doadores são organizações que tem negócios na escala de milhões com o setor público. Em 2013, o montante de dinheiro doado aos partidos, fora do momento eleitoral, é extravagante. O PT recebeu R$ 79,8 milhões; PSDB, R$ 20,4 milhões; PMDB, R$ 17,7 milhões; e PSB, R$ 8,3 milhões. A fonte é o TSE. Os demais, de acordo com o seu tamanho e prestígio;
As principais empresas doadoras: ao PT, Camargo Corrêa, R$ 12,3 milhões; OAS, R$ 7,1 milhões; Queiroz Galvão, R$ 7 milhões; Odebrecht, R$ 6 milhões; Triunfo, R$ 5 milhões; Frigorífico JBS, R$ 8 milhões; ao PSDB, Queiroz Galvão, R$ 8,8 milhões; AOS, 3,8 milhões; Camargo Corrêa, R$ 3 milhões. Ao PMDB, Odebrecht, R$ 11 milhões; Spal, R$ 1 milhão; Andrade Gutierrez, R$ 500 mil reais; Carioca, R$ 300 mil reais; e, PSB, OAS, R$ 1,6 milhões; Triunfo, R$ 1,5 milhões; Andrade Gutierrez, R$ 1 milhão; Odebrecht, R$ 500 mil reais; Galvão, R$ 700 mil reais.
Ao invés de doação o nome certo deveria ser outro: investimento com retorno certo. No passado, as doações eram feitas nos momentos das disputas eleitorais, agora não. Partidos políticos passaram a ser captadores de recursos, em ato moralmente condenável. Pode ser legal à luz da legislação, mas eticamente é imoral. Mais que isso: indecente.
02 de julho de 2014
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