Nossos desejos são nossos votos, na urna e numa ideia fixa: uma sociedade mais educada e sadia
Confesso ter problema com a palavra “aposta”. Todos os significados dela me incomodam. O significado mais comum implica ganhar ou perder dinheiro. Ou se aposta num cavalo ou numa certeza. Quando se aposta – com um amigo ou num vício – , arrisca-se muito. Grana ou reputação. Às vezes ambas.
Prefiro os desejos às apostas. Podemos ser mais livres e delirantes ao desejar. Podemos ser utópicos. No ano de 2014, de eleição e Copa, nossos desejos são, mais do que qualquer troféu, nossos votos. Votos na urna e numa ideia fixa: uma sociedade mais educada, mais sadia, mais responsável, mais ética e menos violenta.1. Que o próximo presidente ouça a voz das ruas e, antes de investir US$ 4,5 bilhões em caças suecos, escolha suas prioridades de emergência, entre elas a Saúde, evitando que pacientes morram na fila da rua ou da cirurgia, por negligência e omissão.
2. Que o próximo presidente entenda a expressão “mobilidade urbana” e, em vez de inundar as ruas de carros particulares, invista em trens e transporte público de qualidade, com integração real entre rodoviárias, aeroportos, metrôs e ônibus. Que invista também em rodovias mais seguras, porque nossas estradas hoje são de quinta categoria.
3. Que o próximo presidente, consciente de que quase 40% das famílias brasileiras são hoje chefiadas por mulheres, invista numa política nacional de creches, em quantidade e qualidade, permitindo assim que possamos conciliar com um mínimo de tranquilidade e competência nossas funções de mãe e trabalhadora.
4. Que o próximo presidente remunere direito os professores e aumente a carga horária das escolas no Brasil, do ensino fundamental às universidades, para que crianças e adolescentes não fiquem apenas cinco horas por dia em instituições de ensino, enquanto os pais trabalham em tempo integral.
5. Que o próximo presidente ataque de frente o deficit profundo de habitação popular, poupando as famílias brasileiras de viver indignamente em barracos e favelas sem esgoto, sem segurança nem saneamento, com perigo de desmoronamento ou risco de tuberculose, junto a áreas de elite nos grandes centros urbanos ou nos rincões remotos e abandonados.
6. Que o próximo presidente tenha ética, determinação, apoio e moral suficientes para tirar a política brasileira desse pântano de corrupção e privilégios, acabando com supersalários e supermordomias num dos Congressos mais caros e menos eficientes do mundo. Que sejam punidos exemplarmente todos que tirarem proveito particular de seus cargos públicos.
7. Que o próximo presidente ajude os Estados a ter uma política consequente de segurança. Temos visto apenas iniciativas isoladas e criativas, como as UPPs no Rio. Sem uma contrapartida maciça de serviços públicos e sociais, elas acabam torpedeadas por bandidos com e sem farda. O risco é viver, cada vez mais, em cidades sem lei, onde se corre o risco de ser assaltado e morto ao andar na rua, ir à praia, pegar um ônibus, comer num restaurante, pegar dinheiro num caixa eletrônico de banco, chegar a sua garagem ou parar num engarrafamento.
8. Que o próximo presidente leve a sério o meio ambiente e o destino do lixo com campanhas de educação. E que não apenas multe, mas prenda os especuladores criminosos que destroem nossos parques, lagoas, praias e reservas.
9. Que o próximo presidente revele à população como são gastos os impostos, num país onde a arrecadação tributária bate recordes. E que os impostos sejam transformados em benefício dos contribuintes.
10. Que o próximo presidente não escamoteie os índices de inflação e não minta sobre o real estado da economia do Brasil.
Aí sim, o Brasil seria campeão em 2014.
02 de janeiro de 2014
Ruth de Aquino, Revista Época
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