Os economistas ainda têm dúvidas sobre o ritmo de saída da economia brasileira da "Grande Recessão", mas algumas boas notícias surgem no horizonte.
Há um consenso quanto ao fato de que o pior já passou. Um bom número de economistas aposta numa recuperação gradual.
Existe, porém, uma certeza: a retomada só vai se materializar se o Congresso Nacional aprovar as reformas fiscais propostas pelo governo.
Nos últimos meses, a economia melhorou principalmente por causa do aumento da confiança de empresários e consumidores, motivado pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. O analista Marcos Casarin, da Oxford Economics, atesta que empresários e gestores de recursos não estão mais no "modo crise", mas, sim, no "modo recuperação". Mas, observa: há limites para uma recuperação baseada apenas na confiança.
A confiança se ampara não apenas na debacle de Dilma, mas no fato de o governo Temer ter nomeado uma equipe econômica com histórico de competência, liderada por Henrique Meirelles e comprometida com os ajustes que o Brasil precisa fazer. Ademais, Temer montou um ministério que, se não é de coalizão (esta, de fato, não existe), é ao menos uma frente, com representantes de mais de uma dezena de partidos, para votar medidas difíceis que corrijam os desequilíbrios criados pelas gestões do PT desde 2009.
Esse primeiro impulso de confiança teve impacto positivo nos dois principais preços da economia - a taxa de câmbio apreciou, ajudando a reduzir a pressão sobre os preços de bens e serviços, e os juros de longo prazo caíram - e também na bolsa de valores. Os primeiros resultados desse movimento estão aí - a inflação caiu e o Banco Central (BC) prepara o início de um ciclo de afrouxamento monetário, algo que não se vê desde 2012.
Os primeiros sinais de que o país está saindo do pesadelo dos últimos três anos, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,1% em 2014, encolheu 3,8% em 2015 e deve recuar mais 3,14% em 2016, segundo mediana das expectativas do boletim Focus, encorajam analistas como Mário Mesquita, ex-diretor de Política Econômica do BC e hoje economista-chefe do Itaú Unibanco, a acreditarem que o Brasil pode ter um crescimento razoável nos próximos dois anos.
O roteiro da recuperação projetado por Mesquita e sua equipe no Itaú, prevendo alta do PIB de 2% em 2017 e 4% em 2018, é mais ou menos o seguinte:
1. depois de dois anos de recessão, a economia brasileira dá sinais de estabilização. A recuperação será gradual e, num primeiro momento, impulsionada por um ciclo de estoques;
2. a sustentação da recuperação vai depender adiante de uma reaceleração mais ampla demanda;
3. a desalavancagem das empresas (a diminuição da dívida líquida frente ao lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), os juros mais baixos e a recuperação dos preços das commodities permitirão a elevação dos investimentos;
4. em 2018, o consumo das família voltará a crescer, impulsionado por uma melhora no mercado de trabalho e pelo crédito mais barato.
O economista-chefe do Itaú faz duas ressalvas: esse cenário, visto como razoavelmente otimista em meio às incertezas que ainda rondam o cenário político e econômico do país, só será possível se o governo conseguir avançar na agenda fiscal encaminhada ao Congresso - isto significa aprovar a PEC que impõe um teto ao gasto primário do setor público por 20 anos -; a recuperação projetada é cíclica, isto é, não será decorrente de um aumento do PIB potencial.
A recuperação do investimento é uma variável-chave para se apostar na retomada mais forte porque esse item, diz Mesquita, é o que explica a maior parte da contração ocorrida nos últimos anos. A Formação Bruta de Capital Fixo, que reflete os investimentos das empresas em máquinas e equipamentos e na construção civil, recuou 4,5% em 2014, 14,1% em 2015 e deve cair mais 7,8% neste ano, de acordo com estimativa do Itaú. Desde o terceiro trimestre de 2013, quando atingiu o ápice, caiu 26%.
O investimento, argumenta Mesquita, é determinado pela combinação de fatores externos (preços das commodities) e domésticos (juros e alavancagem das empresas). A alta alavancagem das companhias teria sido o principal componente do recuo dos investimentos nos últimos anos. A equipe do Itaú estima que 1 ponto percentual a mais de alavancagem diminui o investimento como proporção do PIB em 0,6 ponto percentual.
No biênio 2014-2015, a alavancagem teria contribuído com 8 pontos percentuais na contração de 24% do investimento no período. Os juros altos e o recuo dos preços das commodities teriam impactado negativamente o investimento em 6 e 5 pontos percentuais, respectivamente. Por que acreditar que, agora, as condições serão revertidas?
Primeiro, porque os juros vão cair. Mesquita, que comandou a principal diretoria do BC por quatro anos, tornando-se um dos maiores conhecedores do regime de metas para inflação e tendo sido cotado inclusive para presidir a instituição no governo Temer, acredita que o BC cortará a taxa básica de juros (Selic) em 0,75 ponto percentual ainda em 2016, baixando-a para 13,5% ao ano. O afrouxamento deve prosseguir em 2017, o que vai favorecer a expansão da demanda no ano seguinte. Além disso, Mesquita acredita que os preços das commodities, que tiveram razoável melhora neste ano, vão se sustentar nos próximos anos, o que também deve ajudar os investimentos.
A redução das dívidas das empresas está sendo favorecida pela recente apreciação da taxa de câmbio. O corte esperado dos juros também ajudará nesse processo. Já as margens de lucro das firmas tendem a ser impulsionadas pelo corte de custos de produção - estes tendem a diminuir graças à elevada capacidade ociosa e também ao desemprego, que deve continuar alto nos próximos dois anos. Os dois fatores ajudarão a diminuir a alavancagem, abrindo espaço para a retomada dos investimentos.
Mesquita e sua equipe esperam que o consumo das famílias, que encolheu 4% no ano passado e em 2016 deve contrair mais 4,2%, retornando ao patamar de 2011, só voltará a ter vigor em 2018. Isso porque a recuperação do mercado de trabalho leva mais tempo para ocorrer. A tendência, porém, é que os juros mais baixos e a recuperação do emprego (graças ao investimento) favoreçam o consumo.
29 de setembro de 2016
Cristiano Romero, Valor Econômico
Nos últimos meses, a economia melhorou principalmente por causa do aumento da confiança de empresários e consumidores, motivado pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. O analista Marcos Casarin, da Oxford Economics, atesta que empresários e gestores de recursos não estão mais no "modo crise", mas, sim, no "modo recuperação". Mas, observa: há limites para uma recuperação baseada apenas na confiança.
A confiança se ampara não apenas na debacle de Dilma, mas no fato de o governo Temer ter nomeado uma equipe econômica com histórico de competência, liderada por Henrique Meirelles e comprometida com os ajustes que o Brasil precisa fazer. Ademais, Temer montou um ministério que, se não é de coalizão (esta, de fato, não existe), é ao menos uma frente, com representantes de mais de uma dezena de partidos, para votar medidas difíceis que corrijam os desequilíbrios criados pelas gestões do PT desde 2009.
Esse primeiro impulso de confiança teve impacto positivo nos dois principais preços da economia - a taxa de câmbio apreciou, ajudando a reduzir a pressão sobre os preços de bens e serviços, e os juros de longo prazo caíram - e também na bolsa de valores. Os primeiros resultados desse movimento estão aí - a inflação caiu e o Banco Central (BC) prepara o início de um ciclo de afrouxamento monetário, algo que não se vê desde 2012.
Os primeiros sinais de que o país está saindo do pesadelo dos últimos três anos, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,1% em 2014, encolheu 3,8% em 2015 e deve recuar mais 3,14% em 2016, segundo mediana das expectativas do boletim Focus, encorajam analistas como Mário Mesquita, ex-diretor de Política Econômica do BC e hoje economista-chefe do Itaú Unibanco, a acreditarem que o Brasil pode ter um crescimento razoável nos próximos dois anos.
O roteiro da recuperação projetado por Mesquita e sua equipe no Itaú, prevendo alta do PIB de 2% em 2017 e 4% em 2018, é mais ou menos o seguinte:
1. depois de dois anos de recessão, a economia brasileira dá sinais de estabilização. A recuperação será gradual e, num primeiro momento, impulsionada por um ciclo de estoques;
2. a sustentação da recuperação vai depender adiante de uma reaceleração mais ampla demanda;
3. a desalavancagem das empresas (a diminuição da dívida líquida frente ao lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), os juros mais baixos e a recuperação dos preços das commodities permitirão a elevação dos investimentos;
4. em 2018, o consumo das família voltará a crescer, impulsionado por uma melhora no mercado de trabalho e pelo crédito mais barato.
O economista-chefe do Itaú faz duas ressalvas: esse cenário, visto como razoavelmente otimista em meio às incertezas que ainda rondam o cenário político e econômico do país, só será possível se o governo conseguir avançar na agenda fiscal encaminhada ao Congresso - isto significa aprovar a PEC que impõe um teto ao gasto primário do setor público por 20 anos -; a recuperação projetada é cíclica, isto é, não será decorrente de um aumento do PIB potencial.
A recuperação do investimento é uma variável-chave para se apostar na retomada mais forte porque esse item, diz Mesquita, é o que explica a maior parte da contração ocorrida nos últimos anos. A Formação Bruta de Capital Fixo, que reflete os investimentos das empresas em máquinas e equipamentos e na construção civil, recuou 4,5% em 2014, 14,1% em 2015 e deve cair mais 7,8% neste ano, de acordo com estimativa do Itaú. Desde o terceiro trimestre de 2013, quando atingiu o ápice, caiu 26%.
O investimento, argumenta Mesquita, é determinado pela combinação de fatores externos (preços das commodities) e domésticos (juros e alavancagem das empresas). A alta alavancagem das companhias teria sido o principal componente do recuo dos investimentos nos últimos anos. A equipe do Itaú estima que 1 ponto percentual a mais de alavancagem diminui o investimento como proporção do PIB em 0,6 ponto percentual.
No biênio 2014-2015, a alavancagem teria contribuído com 8 pontos percentuais na contração de 24% do investimento no período. Os juros altos e o recuo dos preços das commodities teriam impactado negativamente o investimento em 6 e 5 pontos percentuais, respectivamente. Por que acreditar que, agora, as condições serão revertidas?
Primeiro, porque os juros vão cair. Mesquita, que comandou a principal diretoria do BC por quatro anos, tornando-se um dos maiores conhecedores do regime de metas para inflação e tendo sido cotado inclusive para presidir a instituição no governo Temer, acredita que o BC cortará a taxa básica de juros (Selic) em 0,75 ponto percentual ainda em 2016, baixando-a para 13,5% ao ano. O afrouxamento deve prosseguir em 2017, o que vai favorecer a expansão da demanda no ano seguinte. Além disso, Mesquita acredita que os preços das commodities, que tiveram razoável melhora neste ano, vão se sustentar nos próximos anos, o que também deve ajudar os investimentos.
A redução das dívidas das empresas está sendo favorecida pela recente apreciação da taxa de câmbio. O corte esperado dos juros também ajudará nesse processo. Já as margens de lucro das firmas tendem a ser impulsionadas pelo corte de custos de produção - estes tendem a diminuir graças à elevada capacidade ociosa e também ao desemprego, que deve continuar alto nos próximos dois anos. Os dois fatores ajudarão a diminuir a alavancagem, abrindo espaço para a retomada dos investimentos.
Mesquita e sua equipe esperam que o consumo das famílias, que encolheu 4% no ano passado e em 2016 deve contrair mais 4,2%, retornando ao patamar de 2011, só voltará a ter vigor em 2018. Isso porque a recuperação do mercado de trabalho leva mais tempo para ocorrer. A tendência, porém, é que os juros mais baixos e a recuperação do emprego (graças ao investimento) favoreçam o consumo.
29 de setembro de 2016
Cristiano Romero, Valor Econômico
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