É correta a decisão do governo de baixar a reforma da fase final do ciclo básico por medida provisória, diante da grave estagnação do aprendizado em nível muito baixo
Dentro da crise mais ampla da educação básica, a degradação da sua fase final, o ensino médio, é gritante há tempos. Algo assustador, porque os avanços que têm sido alcançados na parte inicial dos estudos terminam sendo perdidos à medida que o jovem se aproxima do ciclo médio. Os resultados do último Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), referente a 2015, confirmaram este cenário e mostraram, para quem ainda tinha alguma dúvida, que o ensino médio, em estado terminal, caminha para a falência absoluta.
Pelo terceiro ano consecutivo, a nota média do ciclo foi de 3,7, muito distante das metas. A estabelecida para 2015, por exemplo, era de 4,3. Há intenso debate sobre a crise do ensino básico e, em especial, o médio. Já era mesmo hora de agir, como fez o governo ao baixar ontem medida provisória com mudanças importantes a vigorar a partir do primeiro semestre do ano que vem, mesmo que exista um projeto de lei de reforma deste ensino, desde 2013, na Câmara. Divergências haverá, mas algo foi feito, dentro de alguma lógica.
Um termômetro desta crise é a evasão de alunos. Dados oficiais indicam que há no país 1,7 milhão de jovens, entre 15 e 17 anos, fora da escola, ou 16% desta faixa etária. É razoável admitir que isso se deve bastante à inadequação da escola aos adolescentes.
Pouco existe nela que atraia o aluno, e assim a tentação de ir logo para o mercado de trabalho — amplificada pelos problemas econômicos e sociais — se torna irresistível. Ou mesmo para nada fazer, engrossar a parcela dos “nem-nem” (nem estuda, nem trabalha).
O currículo mudará de forma radical: em vez de 13 disciplinas inamovíveis a serem estudadas em três anos, haverá, assim que o currículo único ficar pronto, matérias distribuídas por cinco áreas: linguagens, matemática, ciências humanas, ciências da natureza e ensino técnico. Depois de cursar, no início do ciclo, disciplinas comuns, os jovens optarão sobre o que desejam estudar na fase restante dos três anos. Incluindo o chamado profissionalizante, algo sempre reclamado nos debates acerca de reformas educacionais.
Com isso, deseja-se dar alternativas a quem já começa a pensar em seguir uma profissão. Não deixa de ser, em alguma medida, uma volta aos conceitos do “clássico” (ciência humanas) e do “científico” (exatas) em que se dividia o ensino médio. E que funcionou a contento. Ainda na linha da flexibilização, será permitido ao aluno acumular créditos, como no ensino superior, para facilitar a retomada dos estudos caso os interrompa ou os desacelere por algum motivo. Outra arma contra a evasão.
Ainda levará algum tempo para a digestão das mudanças, mas é positiva não apenas a preocupação em quebrar a rigidez do currículo, como também o aumento da carga horária, rumo ao ensino em tempo integral (sete horas de aulas). Tudo convergindo para a meta de se ter em 2024, neste regime, 25% dos matriculados e não apenas 6% como hoje.
Não é uma reforma fácil — nenhuma é —, até porque há a questão da quantidade e qualificação dos professores. Mas terá de ser iniciada. Sem ela estará de vez comprometida a aspiração de o Brasil ser um país desenvolvido, estágio só alcançado pela elevação do nível educacional de novas gerações. E o tempo para isso está se esgotando.
23 de setembro de 2016
Editorial O Globo
Dentro da crise mais ampla da educação básica, a degradação da sua fase final, o ensino médio, é gritante há tempos. Algo assustador, porque os avanços que têm sido alcançados na parte inicial dos estudos terminam sendo perdidos à medida que o jovem se aproxima do ciclo médio. Os resultados do último Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), referente a 2015, confirmaram este cenário e mostraram, para quem ainda tinha alguma dúvida, que o ensino médio, em estado terminal, caminha para a falência absoluta.
Pelo terceiro ano consecutivo, a nota média do ciclo foi de 3,7, muito distante das metas. A estabelecida para 2015, por exemplo, era de 4,3. Há intenso debate sobre a crise do ensino básico e, em especial, o médio. Já era mesmo hora de agir, como fez o governo ao baixar ontem medida provisória com mudanças importantes a vigorar a partir do primeiro semestre do ano que vem, mesmo que exista um projeto de lei de reforma deste ensino, desde 2013, na Câmara. Divergências haverá, mas algo foi feito, dentro de alguma lógica.
Um termômetro desta crise é a evasão de alunos. Dados oficiais indicam que há no país 1,7 milhão de jovens, entre 15 e 17 anos, fora da escola, ou 16% desta faixa etária. É razoável admitir que isso se deve bastante à inadequação da escola aos adolescentes.
Pouco existe nela que atraia o aluno, e assim a tentação de ir logo para o mercado de trabalho — amplificada pelos problemas econômicos e sociais — se torna irresistível. Ou mesmo para nada fazer, engrossar a parcela dos “nem-nem” (nem estuda, nem trabalha).
O currículo mudará de forma radical: em vez de 13 disciplinas inamovíveis a serem estudadas em três anos, haverá, assim que o currículo único ficar pronto, matérias distribuídas por cinco áreas: linguagens, matemática, ciências humanas, ciências da natureza e ensino técnico. Depois de cursar, no início do ciclo, disciplinas comuns, os jovens optarão sobre o que desejam estudar na fase restante dos três anos. Incluindo o chamado profissionalizante, algo sempre reclamado nos debates acerca de reformas educacionais.
Com isso, deseja-se dar alternativas a quem já começa a pensar em seguir uma profissão. Não deixa de ser, em alguma medida, uma volta aos conceitos do “clássico” (ciência humanas) e do “científico” (exatas) em que se dividia o ensino médio. E que funcionou a contento. Ainda na linha da flexibilização, será permitido ao aluno acumular créditos, como no ensino superior, para facilitar a retomada dos estudos caso os interrompa ou os desacelere por algum motivo. Outra arma contra a evasão.
Ainda levará algum tempo para a digestão das mudanças, mas é positiva não apenas a preocupação em quebrar a rigidez do currículo, como também o aumento da carga horária, rumo ao ensino em tempo integral (sete horas de aulas). Tudo convergindo para a meta de se ter em 2024, neste regime, 25% dos matriculados e não apenas 6% como hoje.
Não é uma reforma fácil — nenhuma é —, até porque há a questão da quantidade e qualificação dos professores. Mas terá de ser iniciada. Sem ela estará de vez comprometida a aspiração de o Brasil ser um país desenvolvido, estágio só alcançado pela elevação do nível educacional de novas gerações. E o tempo para isso está se esgotando.
23 de setembro de 2016
Editorial O Globo
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